Alex sempre se considerou um garoto comum, como todos da sua cidade, exclusa a sua imensa paixão por chocolate. Todo dia ele pedia para o seu pobre pai, mestre de obras de uma construção em bairro de bacana ou para sua mãe, empregada domestica de uma mansão que ficava do lado da tal obra, um trocado para comprar o “melecolate” seu doce preferido.
Nem sempre os pais de Alex tinham dinheiro para satisfazer a sua vontade. Às 8 horas de trabalho na construção não eram o bastante para sustentar a casa e suprir caprichos de uma criança em desenvolvimento. Assim, Alex cresceu e decidiu estudar Administração para ter a sua própria revenda de “melecolate”.
Com muito esforço e trabalho honesto o jovem “chocólatra” conseguiu. Construiu um belo galpão, bolou campanhas promocionais e rapidamente começou a lucrar com a venda de chocolates.
Porém, outras empresas de doce começavam a crescer na sua cidade, logo ele percebeu que, se quisesse sobreviver, teria que investir pesado na produção de “melecolate”.
Passou alguns meses separando uma boa parte do seu lucro para comprar máquinas novas e também aumentar a quantidade de matéria prima (que lhe daria um bom desconto).
Logo a empresa reconquistou o espaço que havia. As vendas aumentaram e com elas, o lucro. Contudo, na mesma medida em que o ganho aumentava, a necessidade de reinvesti-lo se tornava primordial para a sobrevivência no mercado de doces. Tudo pirou quando, num dia de verão, chegou do exterior uma grande multinacional de doces que colocou em xeque o negócio de Alex.
O jovem empreendedor se viu sem muita saída, a não ser buscar um financiamento que injetaria mais dinheiro na sua produção. Porém esse empréstimo incutiria juros que deveriam ser pagos no final da produção. Como fazer para lucrar ainda mais para pagar esses juros?
Alex passou dias pensando e decidiu aumentar a jornada de trabalho dos seus funcionários, demitir alguns e diminuir os benefícios de outros. Momentaneamente essa foi uma solução perfeita. O lucro aumentou suficientemente para pagar os juros dos empréstimos.
Porém, na segunda vez que os empréstimos foram necessários, os juros haviam aumentado. Novamente Alex pensou em demissões, abaixar salários e aumentar a jornada de trabalho.
Lá pela quarta vez, os trabalhadores já estavam trabalhando em regime escravocrata e assim surgiu outro grave problema: a renda principal em vendas do “melecolate” era sustentada pelos próprios funcionários, que compravam o doce para vender em seus bairros. Com a diminuição dos salários esse negócio se tornou impossível.
A queda nas vendas levou a empresa de Alex a uma profunda crise. Se quisesse crescer precisava investir, para investir teria que emprestar dos bancos, para pagar os juros dos empréstimos teria que lucrar mais e para lucrar mais teria que otimizar (palavra politicamente correta para explorar) sua mão de obra. Contudo, essa otimização tinha um limite claro, não poderia passar de 24 horas, pois assim o trabalho se tornaria escravidão e sem poder de compra, os funcionários não podiam consumir o que era produzido e assim, fazer a empresa sobreviver.
Nesse impasse Alex percebeu que a lógica do crescimento capitalista tinha um parafuso solto. Para sobreviver era preciso ampliar a produção, mas isso levava diretamente a sua empresa para sua própria morte.
Cansado de buscar soluções impossíveis Alex decidiu vender seu negócio e desde então, nunca mais comeu chocolate.
Sobre a história – Base nos conceitos do Capital, de Carl Marx
Nos primórdios do pensamento econômico moderno o dinheiro (papel moeda) transformou-se em capital. Essa transformação garantiu o funcionamento da lógica capitalista em que o capital industrial usava dos seus trabalhadores para produzir mercadorias, objetivando capital acrescido de lucro.
Com o desenvolvimento dessa lógica, surgiram as instituições financeiras que, por meio do acumulo do capital, passavam a emprestar dinheiro para as indústrias assegurarem o próprio crescimento e, no final do processo, captavam esse dinheiro por meio dos juros.
Mas de onde vêm os juros? E o Lucro? Para os marxistas é justamente do trabalho não pago, vulgo “Mais -Valia”. Por meio da exploração dos trabalhadores, que aumentavam suas horas de trabalho ou mesmo com a diminuição dos salários, demissões, o empregador conseguia, com a venda da mercadoria, aumentar sua margem de lucro e repassar os juros para as instituições financeiras.
Tanto o lucro quanto os juros não podem aumentar demais porque justamente são baseados numa economia real, no trabalho de seres humanos. Quanto maior os juros, maior precisa ser o lucro e conseqüentemente, maior a exploração. Porém a jornada de trabalho tem um limite que, se acaba se transformando em trabalho escravo, prejudica ainda mais um dos motores essenciais do Capitalismo: o consumo.