Já aceitei que vivo em uma sociedade racista. Como diz o Houaiss, racismo nada mais é que o “conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças, entre as etnias”. Outro significado é “doutrina ou sistema político fundado sobre o direito de uma raça (considerada pura e superior) de dominar outras”. Ou então “preconceito extremado contra indivíduos pertencentes a uma raça ou etnia diferente, geralmente considerada inferior”.
Teorias e crenças. Doutrina ou sistema político. Preconceito com o diferente. As explicações são variadas, mas acredito que faltou um elemento essencial na definição do racismo: O MEDO.
Racismo e o medo do outro
O racismo é fruto do pré-conceito em relação ao outro. Com ele, emerge a necessidade de teorizar crenças, com o objetivo de justificá-las de maneira racional (por isso as teorias, doutrinas e sistemas políticos) e assim adquirir a credibilidade que tenha status de “verdade”.
Contudo, o racismo não é fruto da razão. Permanece sempre crença. Crença de que o outro é diferente e por isso inferior, crença que o outro age diferente, por isso é inferior. Que o outro pensa diferente e por isso é inferior.
Porém, o que na verdade o contato com o outro, essencialmente diferente, causa em nós é o medo de que percebamos as nossas fraquezas, que somos nós, em muitas ocasiões, os “inferiores”. E, para não deixar que isso seja comprovado teoricamente, sabotamos qualquer pensamento que denuncie nossos limites. Atacamos para não sermos atacados! Tudo por medo.
Lição que vem da cultura africana
Na minha recente e breve passagem pelo continente africano, fiquei impressionado com a estrutura física e a capacidade de sobrevivência dos meus irmãos marfinenses, camaroneses, congoleses e etc. Os filhos do “Berço da Humanidade” não têm os instrumentos tecnológicos que nós temos para facilitar a vida e, mesmo assim prosperam, geração após geração, tornando-se indivíduos mais fortes e capazes de sobreviver às adversidades do contexto em que provêm.
Os africanos mostram o quanto somos frágeis. O quanto apoiamos-nos, como sociedade “ocidental”, em conceitos de cultura e desenvolvimento questionáveis, pois eles não nos tornam pessoas mais racionais ou física e psicologicamente estáveis. Vivendo em harmonia com a natureza, a sociedade africana (principalmente rural/tradicional) dá uma lição ao mundo do como viver bem (não necessariamente FELIZ) com pouco.
Racismo cultural e o show de Daniel Alves
O caso do racismo no futebol é um espelho do racismo cultural que borbulha no “Ocidente”, de maneira especial no Velho Continente. Por aqui, defender as diferenças é garantir a própria identidade, sem deixar que as raízes culturais morram no contato com o outro, essencialmente diferente.
No Brasil, parece que o racismo é fruto de uma ignorância estúpida, de uma cultura que se aceita “colônia cultural”, reproduzindo ideias de outros contextos e que não consegue aceitar-se, essencialmente, uma “raça de raças”. No Brasil ninguém é puramente índio, africano ou europeu.
Na Europa é diferente. O racismo é a maneira encontrada para se defender do outro: do vizinho do outro lado da fronteira e, principalmente, dos que vêm de longe. Mas a causa é sempre a mesma: medo. E as justificativas eu já acenei nos parágrafos acima. O que faltava, porém, era uma reação nova, marcante. E foi isso o que Daniel Alves, jogador brasileiro do Barcelona fez.
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Um gesto simples, mas cheio de significado. Ao ser atingido por uma banana, clara alusão (porque feita repetidas vezes aqui na Europa) a um macaco (o que, simbolicamente, o faz ser inferior) Daniel Alves simplesmente descascou e comeu a banana, desqualificando o gesto racista.
O estúpido torcedor que atirou a banana para Daniel recebeu uma lição digna de aplauso. O jogador brasileiro mostrou que é possível transformar uma agressão em algo Maior, mostrando que a fraqueza, a inferioridade, como podemos constatar, está no ator do gesto racista.