Todos os dias o supervisor da empresa de locação de automóveis Locamérica acorda para trabalhar. Morador da Penha, Zona Leste de São Paulo, o filho de baiana com paulista sustenta a casa desde os 14 anos e vive uma vida comum a tantos dos seus conterrâneos. Porém, Pedro Vaz Arantes faz parte de uma minoria crescente em uma das principais capitais do mundo: Pedro é homossexual.
Com 34 anos Pedro Vaz se considera “não completamente assumido”, pois prefere esconder sua condição no trabalho para impedir que o preconceito lhe tire sua única fonte de renda.
A descoberta da sua sexualidade ganhou seus primeiros esboços aos seis anos, quando ele afirma que surgiu um interesse particular por meninos, mas para ele é claro: “a gente não escolhe ser o que é”.
É difícil não ligar a condição sexual de alguém com os traumas e relações da infância. Em muitos casos a ausência da figura masculina é limítrofe entre uma masculinidade mais ou menos “resolvida”. Para Pedro isso não é verdade, mesmo sendo filho de uma relação em que sua mãe era amante de um homem casado, que nunca esteve próximo dele.
Porém esse processo de aceitação de si mesmo foi doloroso e cheio de conflitos. Namorando mulheres ou mesmo procurando a “salvação” por meio da igreja, Pedro não conseguiu encontrar respostas para suas diferenças particulares.
Cansado e angustiado, aos 21 anos, ele decidiu assumir para si que era gay. Alguns anos depois a mãe descobriu. “Até hoje ela suporta, mas não aceita”. Pedro Vaz explica que existem graus de homossexualidade e isso é completamente compreensível quando nos deparamos com um gay como ele. Alegre, sereno, bem resolvido, sem medo de expor suas idéias, de sonhar, mas “se pudesse escolher, não seria homossexual”.
Namorou por sete anos um seu xará, com quem estabeleceu um relacionamento difícil, ciumento, mas que lhe trouxe uma grande maturidade. “Minha mãe não acreditava no amor entre dois homens, mas se esse sentimento é possível entre um homem e uma mulher, como é concebível que ele não exista entre eu e meu namorado?”
Agora, com seu segundo namorado (também xará), sonha em ter uma vida juntos. “Eu, o Pedro e dois cachorros”. No futuro, quando a condição do homossexual for mais aceita na sociedade, almeja adotar um filho.
Com os heteros a relação é de muito respeito. Raquel e Renato são como um portal em que o homossexual encontra a possibilidade de construir um relacionamento de igual para igual. “Com eles sou visto como ser humano”.
Clodovil, Ney Matogrosso são dois exemplos de homossexuais que buscaram reconhecimento no que fazem e não no gênero sexual. Acreditando em Deus, Pedro busca força para lidar com sua condição.
O mais incrível em Pedro Vaz Arantes não é sua história, mas o como ela morre em sua aparência quase incoerente. Não tem voz, não tem trejeitos, nada daquilo que o nosso imaginário preconceituoso constrói em torno do homossexual. Pedro poderia muito bem ser aquele colega de trabalho tímido, ou companheiro da universidade, poderia ser você, ou mesmo eu.
Conhecê-lo nos faz ver a pessoa que existe por trás de uma condição. Evidencia os nossos limites e a incapacidade de ir além da cor, raça, cultura dos nossos semelhantes. Ah! E sobre cotas. Pedro é negro, mas contra. “Cotas nesse país deveriam ser dadas aos pobres”.