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Lugar de fala, dever de escuta

Se apoderar do lugar de fala do outro não é só injusto, mas mentiroso”

Não me lembro bem ao certo onde ouvi essa poderosa citação, mas sei que ela mexeu muito comigo. Tenho visto nos últimos anos, tanto no micro quanto no macrocosmo em que vivo, um movimento de pessoas ditas “de bem” que têm sistematicamente se apoderado do”lugar de fala”de outras pessoas.

Grupos de incidência majoritariamente brancos, de perfil sócio- econômico privilegiado têm populado as arenas globais e outros espaços de expressão política com a intenção de “defender” os direitos dos excluídos. O que pode parecer um ato benévolo, na verdade reforça a desigualdade. A ocupação do lugar de fala alheio acaba calando ainda mais a voz dos oprimidos e delega aos cidadãos privilegiados o direito de expressão que gera somente pseudo-soluções.

Uma solução que eu considero legítima para enfrentar essa questão é a promoção da educação como ferramenta de empoderamento, juntamente como ampliação dos espaços de expressão para os “sem voz”.

Em vez de usar a nossa energia para levantar bandeiras que não são genuinamente nossas, deveríamos lutar para assegurar a inclusão dos que não são ouvidos. Sem a presença deles nos espaços de debate, de reflexão, em todas as esferas da sociedade, continuaremos a viver em uma pseudo democracia, iludindo-nos ao acreditar que as nossas boas intenções são suficientes na luta contra a desigualdade.

Luto pelos professores do Brasil

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Hoje, de maneira especial, sinto uma profunda dificuldade em escrever algo de bom sobre a situação dos professores brasileiros.

Impossível, porém, não me orgulhar de ter sido alfabetizado por um membro dessa classe sofrida. Sou parte de uma pequena parcela da população que pode desfrutar dos privilégios de ser educada por uma professora “de verdade”. Crescendo, me dei conta de que a “maldição pedagógica” havia contaminado toda a minha família: primas, primos, tios e tias, muitos deles são professores, a maioria da rede Pública. Pior: acabei também me casando com uma filha de professora.

Cresci ouvindo muitos absurdos a respeito do que se passa dentro do Ensino Público, no Estado de São Paulo. Talvez por isso use, de maneira injusta, a palavra “maldição” para falar de um dos profissionais mais basilares de uma sociedade que se diz “desenvolvida”. Mas, não é preciso um olhar muito apurado para perceber que o cenário atual do professor brasileiro, justifique o emprego de “maldição”.

Acho que a festa pelo dia dos professores deveria ser levada mais a sério. Não bastam abraços dos discentes, os parabéns de diretores, secretários da educação, prefeitos, governadores e nem mesmo da “presidenta”. É preciso um olhar humano e estratégico em relação a esse profissional. Pois, o sucateamento das estruturas em que os professores trabalham e o descaso cultural que existe em relação a eles estão nos levando, como nação, para o fundo do poço.

Engana-se o “romântico” que pensa que a consciência coletiva tem crescido porque fizemos uma dezena de protestos exigindo “tudo”. Sem um projeto que coloque a educação (e seus profissionais) como um dos pilares do desenvolvimento da nação, nós não teremos nem passado, nem futuro.

O dia dos professores, até que a situação aspire uma mudança real, deveria ser lembrado com tristeza, um dia de LUTO, de reflexão, pelo que cada um de nós, cidadãos, NÃO tem exigido pela educação no Brasil.

Somos, como povo, incapazes de perceber que os valores de uma pátria têm na educação seu principal aliado. Por isso, estamos nos transformando, cada vez mais, em um país privo de Valores. Não somos o país da educação. Somos o país do futebol, das mulheres frutas, do pancadão, do PCC. E parece que está tudo bem.

Prevenir a droga com a educação – Revista Cidade Nova – março 2010

Participantes do Seminário

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SOCIEDADE Durante quatro dias, profissionais de diferentes campos de atuação na área da educação e do direito puderam apresentar experiências, dificuldades e alternativas em vista da elaboração de um projeto pedagógico de resgate de valores e de uma formação integral de crianças, adolescentes e jovens

A região montanhosa de Guaratinguetá, onde está localizada a primeira das 68 Fazendas da Esperança querecuperammaisdeZmiljovensno Brasil e em diversos países do mundo, acolheu 30 profissionais ligados à educação de crianças e adolescentes para o Seminário Internacional: “Educação e prevenção ao uso de drogas e à violência”. Promovido pela Fazenda da Esperança em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e a Editora Cidade Nova, o evento que foi realizado dos dias 28 a 31 de janeiro enfrentou o tema da crise da escola como espaço de formação e consolidação dos valores humanos em vista de uma educação mais integral da pessoa e deu início à elaboração de um projeto pedagógico que vise a prevenção da droga e da violência.

“Faz 27 anos que eu trabalho na recuperação de drogados e vejo o sofrimento que acompanha cada história, cada família. Então, nasceu dentro de nós o desejo de fazer algo para que a juventude não entrasse na droga, prevenir o mais cedo possível” – explica frei Hans Stapel, presidente da Fazenda da Esperança, sobre a ideia de realizar o Seminário.

Diversidade que enriquece

Um dos primeiros desafios do Se­minário foi lidar com a diversidade de campos de atuação entre os par­ticipantes. Profissionais de todas as regiões do Brasil, coordenadores de ensino, professores de escolas públi­cas e universidades, representantes do poder público e profissionais vindos de outros países apresenta­ram seus trabalhos e experiências no campo educacional por meio de painéis, mesas-redondas, debates, mostrando uma diversidade de pro-jetos e ações realizadas no campo da educação.

“A troca de experiências é im­portantíssima porque quando nós começamos uma atividade, a nossa impressão é de que estamos sempre certos, mas só quando ouvimos a experiência do outro e as suas crí­ticas é que começamos a ver se re­almente estamos no caminho cor-reto”, afirmou Rui Paiva, servidor público municipal na área jurídica, em Belém (PA).

“No início, eu não entendia a proposta do Seminário, mas depois comecei a observar que, antes de tudo, era uma troca de experiên­cias, de conhecimentos, de capa­cidades, para que todos, a partir daquela comunhão, mesmo aque­les que não participam diretamen-te da área da educação, pudessem contribuir”, disse Richardson Ra­mos Cardoso Borges, integrante do programa Educação para a Paz, em Igarassu (PE).

Um projeto em comum

Além de discutir a educação e seu papel na prevenção ao uso de dro­gas e à violência, um dos principais objetivos do Seminário foi traçar linhas para um projeto pedagógico comum a ser oferecido à sociedade.

Diversas alternativas pontuais apresentadas já são realizadas pe­los participantes nos seus ambien­tes de trabalho: projetos concretos como o “Viver de Cara Limpa”, que foi assumido pelo governo do Es­tado de Tocantins e que envolveu muitas crianças e adolescentes da região e também ações pontuais em escolas de Jundiaí, Vargem Grande Paulista, São Paulo ou mesmo na Fazenda da Esperança.

Essas atividades de promoção do ser humano e da cultura de paz têm tido desdobramentos muito impor­tantes no campo da educação e da formação das novas gerações. Nesse sentido, a pergunta fundamental do Seminário levantada pela educado­ra, ex-secretária estadual da Educa­ção do Tocantins e ex-presidente do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Educação (Consed), Dorinha Seabra Rezende, foi “como passar de um projeto muito pontu­al e particular para uma dimensão maior, de grande escala”.

“Mais do que trabalharmos jun­tos é preciso aprender a sistemati­zar tudo isso em prol de um pro­jeto maior. Não devo ver apenas o meu projeto ligado à minha escola, à minha universidade ou à minha dificuldade”, acrescentou Samuel de Souza Neto, professor adjunto do Departamento de Educação da Unesp, explicitando ainda mais o objetivo daqueles dias de discussão e trabalho.

Questão de valor

Um dos temas apresentados nas diversas mesas-redondas do Semi­nário apresentou a escola e a so­ciedade como “comunidades edu­cadoras”, que têm um papel muito importante na prevenção ao uso de drogas e à violência. Esse novo mo­delo engloba um conceito de edu­cação que “trabalha também com valores, com postura, formação hu­mana”, explica Dorinha.

“É justamente o descaso em rela­ção aos valores um dos motivos que acabam gerando consequências so­ciais graves no desenvolvimento da juventude”, afirma Édina Maria de Paula, promotora da Vara da Infân­cia e Juventude de Londrina (PR). “A educação significa essa transmissão de valores. Você não tem como falar em educação sem que a transmissão desses valores seja colocada em prá­tica. Dentro do meu dia a dia, eu vejo que muito disso foi perdido pe­las famílias que acabaram terceiri-zando, delegando a educação dos fi­lhos às escolas. Assim, essas crianças não recebem valores nem em casa e nem nas escolas e quando chegam na adolescência estão despreparados para a vida. Daí para a delinquência e para a ‘drogadição’ é só um passo”, conclui Édina.

Dos fatos às palavras

Os quatro dias vividos intensa­mente pelos participantes do Se­minário serviram também como oportunidade de conhecer a reali­dade vivida na Fazenda e ver como a recuperação realizada ali pode ser apresentada como um novo modelo de pedagogia. “Eu vejo a escola como um cen­tro de formação humana, mas aqui também é um centro de formação humana. Não é uma escola nos moldes formais, mas é uma escola de vida e para a vida”, disse Samuel de Souza.

“Sempre ouço as experiências desses adolescentes no Fórum e não são muito diferentes da expe­riência que eles contaram aqui, só que há um diferencial básico: aqui elas encontraram luz, fizeram a experiência do amor de Deus e do amor do próximo, o que os ado­lescentes que eu atendo ainda não encontraram e isso faz toda a dife­rença”, contou Édina.

O Seminário contou também com participantes de outros países que apresentaram as próprias ex­periências. Alguns responsáveis de Fazendas da Esperança de diversas partes do mundo: Alemanha, Rús­sia, México e Moçambique e o peda­gogo alemão Mathias Kaps, respon­sável pelo projeto “Ser forte sem ser violento”, que desenvolve a cultura da paz em muitos países da Europa e já envolveu mais de 150 mil pesso­as – alunos, professores e espectado­res – desde o seu início, em 2006.

“Para mim foi muito importan­te participar do Seminário. Aprendi muitas coisas, principalmente com o modo com o qual as pessoas enfren­tam esses problemas aqui no Brasil. Violência e droga não são só expres­sões de falta de boas condições de vida, mas também da falta de senti­do para essa vida, seja na Europa ou na América Latina. Fiquei feliz por contribuir com a minha experiên­cia”, declarou o pedagogo alemão.

Crianças e adolescentes

“Vimos aqui na Fazenda o que é a experiência de vida, o que é o direito de viver. Cada um que sai daqui hoje sai com consciência de que deve agir diretamente na so­ciedade. Não adianta fazer só diag­nóstico, o que adianta é transfor­mar tudo isso. Os diagnósticos já são muitos, agora precisa sair dis­so para a prática”. Essa percepção de Meireivaldo Paiva, educador de Belém, exprimia outro desafio para o Seminário: definir projetos de ação concreta e conjunta no campo pedagógico.

Nos momentos conclusivos do Seminário, surgiu a necessidade de dividir o grupo em duas diferentes abordagens, uma que levasse em conta as realidades das crianças, até os 11 anos, e outra para os adoles­centes até os 17 anos. Desses grupos nasceram duas propostas concretas: o Projeto Semente e a atualização do Projeto Viver de Cara Limpa, que deverão ser aprofundadas em encontros posteriores.

O Projeto Semente está voltado ao público infantil, dos 3 aos 11 anos, e visa prevenir o uso de dro­gas e a violência, mediante o traba­lho com valores de convivência e cidadania e da fraternidade como novo paradigma para a pedagogia. A proposta inclui atividades para-didáticas e lúdicas e envolve toda a comunidade local: escola, bairro e município, entidades civis e insti­tuições públicas.

A segunda proposta, o Projeto Viver de Cara Limpa, visa trabalhar com os públicos adolescente e juve­nil na prevenção ao uso de drogas e à violência. É um conjunto de propostas e iniciativas que se articulam no tripé “testemunhos, rela­cionamentos e atividades”. As estra­tégias para a realização do projeto são a “sensibilização” (pelos teste­munhos e relacionamentos com os jovens da Fazenda e por meio de oficinas artísticas e a “conscientiza-ção” (pelo livro-texto e atividades propostas). O projeto propõe o en­volvimento da família e de toda a comunidade local.

Desafios

Realizar projetos pedagógicos no Brasil, sobretudo com a chancela do poder público é um grande desafio já no momento de sua aprovação, mas as dificuldades em relação à continuidade dos trabalhos pare­cem ser os principais obstáculos para a construção de mudanças efe-tivas do campo da educação.

Segundo a coordenadora peda­gógica de uma escola municipal de Jundiaí (SP), Lúcia Helena Parazzi, “esse Seminário vem ao encontro das demandas sociais, mas os atores dessa pedagogia precisam antes de tudo acreditar”. “É uma proposta ousada, mas é uma proposta urgen­te, porque a sociedade tem neces­sidade de uma educação diferen­ciada, que as propostas estejam de acordo com as demandas sociais”, acrescentou ela.

Depois dos dias de trabalho do Seminário ficaram evidentes os mui­tos desafios que os educadores preci­sam enfrentar. Um desses desafios é a continuidade dos próprios projetos.

“O importante é deixar esse fogo aceso, ficarmos unidos e comunicar entre nós os passos dados, porque a grande tentação é que o individualis­mo tome conta da gente e que até fa­çamos coisas bonitas, mas sozinhos perdemos a força”, explica frei Hans sobre outro aspecto importante para o sucesso do Seminário que é o tra­balho em rede, em comunhão. •

BOX: Uma experiência marcante

“Foi uma coisa extraordinária, dias de luz, dias em que todos sentíamos que nasceu algo. Parece o início de uma pedagogia especial, algo novo.” (Frei Hans Stapel)

“Espero que nasça agora uma parceria entre a Europa e o Brasil, para nos ajudarmos e enfrentar esses problemas juntos.” (Matias Kaps)

“Uma experiência muito interessante porque abriu mais a minha cabeça no sentido da prevenção, pois trabalhamos muito com a recuperação. Ajudou-me a não me limitar e entender mais o trabalho de prevenção.” (Luciano Santos da Silva, responsável pela Fazenda da Esperança no México)

“Para mim foi possível fazer essa experiência porque todas as pessoas aqui procu­raram viver aquilo que buscávamos juntos, particularmente, na vida delas. Isso me fez lembrar uma frase de Chiara Lubich que diz: ‘Com homens novos, você pode fazer coi­sas novas’. E eu sinto que aqui saiu uma coisa nova por causa disso.” (Nelson Rosendo, presidente da Fazenda da Esperança)

“Eu saio daqui muito diferente de como cheguei. Seria difícil explicar, mas eu saio com o meu coração diferente no sentido que, às vezes, a gente acredita nas nossas po-tencialidades, isso é bom, mas a gente deixa de acreditar que por trás de tudo isso tem Deus e é Ele quem faz as coisas, basta a gente fazer a nossa parte. Eu saio daqui com muita esperança.” (Lúcia Helena Parazzi)

“Existe um autor, Mário Sérgio Cortella, que diz que nós somos a primeira geração que não cuida das próximas gerações e nesse Seminário houve um esforço dessa gera­ção para cuidar da próxima geração.” (Samuel de Souza Neto)

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