Confederação

Mix & Remix

Hoje, 1º de agosto, os Suíços celebram a sua Festa Nacional, uma interessante recordação do pacto que, em 1291, uniu os estados (cantões) de  UriSchwyz e Unterwalden e inaugurou o processo de formação da Confederação Suíça.

Chamados em alemão de Waldstätten (que designa um lugar forasteiro, em meio a natureza), os três estados, localizados no coração daquela que seria a Confœderatio Helvetica, uniram-se para enfrentarem juntos os seus inimigos comuns. O principal deles eram os Habsbourg, uma importante família real conhecida por ter fornecido todos os imperadores do chamado Sacro Império Romano Germânico, união de territórios da Europa Central sob a autoridade do Sacro Imperador Romano.

Entretanto, para unirem-se, foi preciso encontrar um fator comum entre aqueles três estados. Acredito que a renúncia de uma parcela da própria autonomia política só foi possível, devido à vontade recíproca de não se submeterem a um rei que não era “um deles”. A exigência do respeito e do reconhecimento de quem eram, fez com que eles lutassem juntos pela própria liberdade.

O Estado de vontade

Olhando o ser humano e a maneira como ele se desenvolve em diferentes culturas, pude notar muitas particularidades, mas também inúmeras semelhanças. A similaridade que considero mais curiosa e que pude presenciar em quase todas as culturas em que estive imerso, é o desejo de unidade comunitária.

Contudo, mesmo exprimindo uma vontade comum, a unidade de uma cultura ou de uma nação torna-se um patrimônio coletivo, proporcionalmente à quantidade de pessoas que “dão voz” a esse desejo. Ou seja, quanto mais membros legitimam a sua unidade, mais ela se plasma no “DNA” dessa comunidade.

Os interesses que fundam a unidade comunitária podem ser os mais variados, mas tudo parte do raciocínio lógico que leva à uma evidente conclusão: unidos somos mais fortes e mais ricos de recursos econômicos, culturais e militares.

A República Federativa do Brasil

ConfederaçãoInfelizmente, a história da formação do Brasil, como nação, diverge muito da Suíça. Enquanto na Confœderatio Helvetica as vontades populares foram envolvendo, pouco a pouco, os diferentes (e autônomos) reinos, que se uniram para, sobretudo, garantir a segurança e a prosperidade recíproca, nas terras de onde venho a liberdade de escolha foi sufocada pelos colonizadores europeus.

No Brasil, as doze capitanias hereditárias – primeiras “unidades federativas” – não eram espaços políticos constituídos a partir de uma vivência comunitária livre, mas ambientes de repulsa dos nativos, de exploração escravocrata e, sobretudo, de empossamento de recursos naturais que eram, posteriormente, transportados para a metrópole. O principal objetivo dos conquistadores não era habitar, partilhar conhecimentos e riquezas, mas simplesmente roubar.

Por isso, para mim o Brasil nunca foi uma Federação. Faltou-lhe justamente a vontade popular (ou o sentimento comum de nação) para legitimá-la. A República Federativa do Brasil foi uma invenção imposta, como a dos estados africanos no neocolonialismo.

A Confederação Suíça pelos olhos de um brasileiro

Confederação

A Suíça abre a porta (Mix & Remix)

Justamente pelo fato de ter crescido em um país onde as vontades populares não foram (e ainda não são) respeitadas, percebo a riqueza existente na Confederação Suíça. A soberania do desejo coletivo de estar unido, respeitando as identidades originais de cada estado, contribuiu (e ainda contribui) decisivamente para que o país se desenvolvesse preservando seus valores. Hoje a Confœderatio Helvetica não tem só três, mas 26 estados, 4 línguas nacionais e uma crescente quantidade de estrangeiros de todo o mundo, que chegam diariamente no país em busca de melhores condições de vida.

O contexto atual em que o país europeu está inserido – de crise econômica, social e política no Velho Continente – tem levado a Suíça a desenvolver um sentimento perigoso de “medo do outro (ou do diferente)”, que impulsiona muito mais ao fechamento, que à abertura.

Na história da formação do Estado Suíço, a negociação das individualidades, comprometidas não só com os bônus, mas também os ônus da união, fundou um modelo de democracia que o torna hoje uma das poucas nações democraticamente sólidas. É fundamental pensar mecanismos de responsabilização socioeconômica, sociopolítica e sociocultural, para que os valores genuinamente suíços sejam preservados. Contudo, fechar-se contra os crescentes movimentos de troca cultural, econômica, intelectual e social é renegar a grande descoberta dos “pais da Confederação”: que a união, na diversidade, faz a força.