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De “Ou” para “E”: Minha jornada para a cidadania suíça

Você já segurou em suas mãos algo que representa quem você era e quem você se tornou? Quase um ano depois de celebrar meu 40º aniversário rodeado pela minha família e amigos suíços, estou aqui segurando meu certificado de naturalização Suíça—um documento que reconhece oficialmente o que meu coração já sabia: pertenço a duas pátrias.

Antes de tudo, quero deixar bem claro: sempre terei orgulho de ser brasileiro. Minha cor de pele, amor pela música, cultura, futebol e interesse genuíno pelas histórias das pessoas são lembretes constantes e alicerces de onde eu vim.

No entanto, a vida tem uma maneira linda de expandir nossa identidade em vez de substituí-la. Quando Flavia e eu começamos nossa jornada juntos, fui convidado não apenas a negociar minha existência ao lado da minha maravilhosa esposa, mas também a mergulhar em uma cultura vastamente diferente daquela que eu conhecia.

Deixar o Brasil não foi apenas fazer as malas; significou deixar de lado conquistas profissionais, conexões comunitárias e o conforto de saber exatamente quem eu era e onde pertencia.

Os primeiros anos como imigrante me desafiaram. Cada dificuldade com o idioma, cada olhar confuso para os costumes suíços e cada momento de desconexão cultural me lembravam do que eu havia deixado para trás. Frequentemente eu me questionava internamente: poderia eu realmente um dia pertencer a este lugar?

Mas eu não sabia quão generosamente a Suíça me acolheria—não instantaneamente, mas gradualmente, e com a sensibilidade respeitosa única aos suíços. Minha comunidade suíça nunca me pediu para apagar minha identidade brasileira; em vez disso, demonstraram curiosidade, sentiram-se enriquecidos pela minha cultura e gentilmente me ajudaram a fazer uma descoberta profunda: eu não precisava escolher.

A transformação fundamental não era sobre me tornar menos brasileiro para me tornar mais suíço. Era sobre expandir meu coração para abraçar ambos.

Meu 40º aniversário tornou-se um espelho inesperado. Olhando ao redor para os rostos dos amigos e familiares que haviam se tornado meu sistema de apoio suíço, percebi que havia criado raízes aqui sem nem mesmo notar. As pessoas ao meu redor agora eram meu povo, minha comunidade e minha família escolhida.

A decisão de começar o processo para a cidadania suíça surgiu dessa clareza—não porque eu precisasse de um documento para validar meu pertencimento, mas porque desejava participar plenamente no futuro desta nação que havia se tornado minha. Eu queria cumprir meu papel como cidadão, preservando o que torna a Suíça única e contribuindo para sua evolução.

Como os pais fundadores, que se uniram em 1291 para proteger suas comunidades, busquei a cidadania como um compromisso com algo maior que eu mesmo—uma promessa a esta terra e seu povo. Não se trata de lealdade dividida; trata-se de um coração expandido pelo amor.
Nunca foi sobre “ou”—sempre foi sobre “e”.

O Brasil me deu meus alicerces. A Suíça me deu meu presente e futuro. Juntos, eles moldam quem sou hoje.
Hopp Schwiiz! Vamo Brasillllll!

From Brazil to Switzerland: Redefining My Roots

If I die today, how many people would attend my funeral after a decade of living as an immigrant in Switzerland?

I know it’s a silly question, but it was an intriguing thought I had some months before deciding whether to celebrate my 40th birthday in Switzerland or not. After a decade abroad, my identity has changed in so many ways that I felt somehow “homeless,” struggling to piece together who I am.

I never imagined how therapeutic a birthday party could be in this sense. Thanks to my lovely wife, we managed to gather in the same space all the dimensions of my “new life” that I was hesitant to accept as the pillars of who I am today. I always felt loved by my Swiss family and friends, appreciated by colleagues, but when compared to the intensity of relationships I had in Brazil, it always seemed insufficient.

At 40th birthday celebration, I could see, feel, and hear the fruits of these last ten years of relationships. It changed me forever.

Visualizing all the meaningful relationships and deep connections I have in Switzerland freed me from the inner prisons of my past and brought me to an acceptance of my new self, full of richness, joy, and, most importantly, new roots.

Two weeks later, I went to Brazil with my family. 

Since moving to Switzerland on April 1, 2014, every time I returned to my home country, I tried to renew the connections externally and internally with everything and everyone I left behind. That protected my mental health, gave me the certainty of being rooted, and the serenity of feeling I had everything I needed.

This year, going back to Brazil wasn’t going back home anymore—maybe for the first time. After experiencing that special moment with my Swiss connections, I saw a whole new world I hadn’t seen before. 

Brazil then became a place to build something new with the same people I am delighted to meet. I could now share the best of who I am—a Brazilian Swiss, enriched by my integration efforts, struggles and experiences, and the joy and openness of my Brazilian heritage.

What a joy! What a wonderful and life-changing experience! I look forward to deepening it and learning how to make the best of this journey for myself and others.

Sete anos de Suíça

No dia 1 de abril de 2021 eu completei sete anos como imigrante na Suíça. O sentimento é de ter percorrido uma longa jornada com fases distintas. Foram anos de muito aprendizado, momentos dolorosos, mas que hoje me fazem nutrir um amor sincero por uma cultura bem diferente da brasileira.

Quando cheguei aqui em abril de 2014, além de trazer comigo o entusiasmo de uma recente experiência missionária no oeste africano, sentia a alegria de começar uma vida nova em Genebra: um lugar cheio de memórias incríveis com a minha agora esposa, Flavia.

Após a “lua de mel” dos primeiros seis meses, as diferenças culturais que antes eram vistas como riquezas, passaram a se tornar um peso difícil de suportar. Mesmo estando antes em Genebra, essa era a primeira vez que tinha o desafio da integração diante de mim, principalmente ligado à inserção no mercado de trabalho e ao aprendizado da língua local: o francês.  

Naquele momento, eu era constantemente questionado por me comportar de maneira diferente, ser fisicamente diferente e, em resposta, eu me esforçava ainda mais para não perder a minha identidade brasileira.

Os primeiros três anos foram o período mais difícil da minha vida na Suíça. Foi quando eu mais precisei buscar o equilíbrio entre preservar a minha identidade e estar disposto a negociá-la com a nova cultura em que estava imerso.

A dificuldade com a comida e o clima, o aprendizado de uma (ou mais) nova língua e as dinâmicas interpessoais completamente distintas foram os elementos mais difíceis de assimilar. Eles foram (e as vezes ainda são) causa de dor, frustração, ansiedade e, principalmente, solidão. 

Fazer comparações constantes com aquilo que tinha deixado para trás, tornou-se uma reação defensiva comum. A grande mudança aconteceu após esses primeiros três anos, quando voltei de férias para o Brasil.

O tempo vivendo distante fez com que eu perdesse a ligação orgânica que tinha com o meu país natal. O Brasil que conhecia tinha sofrido mudanças drásticas políticas e econômicas. Amigos e familiares viviam outras fases e muitos deles passaram a desconsiderar a minha visão do país, pelo simples fatos de não viver mais lá a tanto tempo. 

Foi então que começou o que eu chamo de “fase do vazio” em que nem somos ainda cidadãos da nossa nova pátria, nem podemos mais nos considerar cidadãos da pátria de origem.

O que pode parecer algo essencialmente ruim, na verdade foi uma janela que se abriu para um processo de integração mais profundo e livre de bloqueios interiores ligados à minha cultura original. Essa nova fase inaugurou uma dinâmica pessoal nova, menos preocupada em evidenciar diferenças e fazer comparações. 

Já há algum tempo eu comecei a nutrir um sentimento de orgulho e amor pela Suíça. Depois desse longo processo de amadurecimento interior, hoje é bem mais fácil entender as diferenças como riqueza e de assimilar os elementos da nova cultura à minha própria identidade.

É difícil saber o quanto eu estar imerso em um ambiente de aceitação e respeito contribuiu para a passagem dessas fases. O tempo é, sem dúvidas, um grande aliado.

O que posso dizer à partir da minha experiência pessoal é que muitas dessas dificuldades precisavam de um trabalho interior, bem mais do que a simples necessidade de aprovação/aceitação externa.

Sempre digo que a integração é um processo dramático, pois toca elementos constitutivos da nossa identidade. Contudo, por meio dela somos convidados a descobrir a nossa incrível capacidade de incorporar dimensões que vão muito além daquelas que nos originaram. 

É preciso querer, exige esforço, mas, sem sombra de dúvidas, vale a pena! 

Reconectar, Brasil

Voltar ao Brasil para reconectar

Eu nunca fiquei tanto tempo sem voltar ao Brasil. A culpa é da pandemia de COVID-19. Essa situação excepcional criou uma desconexão entre o “helvetismo” que cultivei como imigrante nos últimos seis anos e a brasilidade que carrego dentro de mim.

Na minha terra natal, eu sempre sou convidado a ver o mundo na perspectiva dramática do outro, muito por presenciar diariamente a miséria, a privação e o desamparo dos mais vulneráveis. Há muito tempo esses elementos não fazem mais parte do meu cotidiano.

A diferença entre realidades não só me afastou das dinâmicas constitutivas de quem eu sou, mas também me distanciou de alguns dos meus compatriotas. Para eles, sem a vivência, eu perco um componente chave para analisar a situação sócio-política brasileira. 

Daqui a exatas duas semanas, se tudo der certo, estarei de volta ao meu país. Mas dessa vez o mundo não é mais o mesmo. Estamos todos conectados pelas realidades impostas pela pandemia de COVID-19. Contudo, as feridas e o vazio que essa experiência tem causado de maneira diferente em cada um de nós precisam encontrar significado no desejo profundo de reconexão, de reencontro. Mesmo se com máscaras e distância física.

Crises são sempre oportunidades incríveis de avaliação interior. Foram nesses exercícios que eu entendi o quanto o outro é parte de mim e eu sou fruto do outro. É essa reconexão que estou indo buscar no Brasil para, quem sabe, me sentir novamente completo.

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