Prólogo  – 7 anos de Amor Binacional

Doar-me plenamente – corpo e espírito –  para fazer valer todos os projetos com os quais me envolvo é um dos princípios que norteiam a minha vida. O trabalho que desenvolvo precisa fazer sentido, as conversas devem ser construtivas, os relacionamentos têm de proporcionar crescimento mútuo. Afinal de contas, a passagem por esse mundo é única.

Por outro lado, também me esforço para deixar ou « fazer » espaço ao « Motor Imóvel ». As experiências que fiz até aqui me mostraram que Deus está sempre iluminando o melhor caminho. Difícil mesmo é deixar olhos e ouvidos abertos, além da força interior para percorrê-lo.

O equilíbrio entre a escolha e o comprometimento pessoal junto à Fé de que “Alguém” tinha providenciado aquele misterioso encontro foram talvez os principais fatores que levaram eu e a Flavia a começar a aventura juntos no dia 8 de fevereiro de 2010. Pessoalmente, eu não estava entrando naquele relacionamento com o temor de um possível fracasso. Sabia que, da mesma forma que faríamos de tudo para fazer valer cada momento, aquele Deus que nos uniu alguns anos antes iria nos acompanhar naquela empresa.

E deu no que deu.

Hoje, sete anos depois, me vi novamente maravilhado com tudo aquilo que temos vivido em família; me vi também perguntando se, nesse ponto da nossa aventura, amo mais ou menos a Flavia. O interessante é que me dei conta, quase de imediato, que o Amor não pode ser quantificado. O único parâmetro de sucesso é se ele continua gerando frutos.

Dessa forma, difícil não me emocionar e sentir uma gratidão de tirar o fôlego quando penso que aquele primeiro “vamos?”, sete anos atrás, nos conduziria até aqui, agora não só dois e sim três. Não imaginava que aquele primeiro sim seria o prólogo do dia mais feliz da minha vida. E foi.

abraço lula e fhc

A falta que um abraço me faz

Vivendo do outro lado do Atlântico me vejo muitas vezes com saudade de um abraço. Naquela que considero uma cultura do respeito – de gentilezas e de muros – os abraços estão limitados a parentes próximos e amizades de longa data.

Um abraço sempre foi para mim sinônimo de alegria e proximidade. Abraçando me exponho ao outro e partilho, gratuitamente, um pouco do “calor” que nos faz, todos, humanos, a despeito das diferentes proveniências e das ideias que defendemos.

O efeito da escassez de abraços me tornou mais sensível diante do ato de ver pessoas se abraçando. Por isso fiquei tocado ao ver a foto do abraço entre os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique. Lendo as notícias relacionadas ao acontecimento, entendi que o mesmo abraço de conforto oferecido por FHC em consequência do iminente falecimento da esposa de Lula, Marisa Letícia, foi também oferecido pelo petista em 2008, quando a esposa de Fernando Henrique, Ruth Cardoso, havia falecido.

Afeto, respeito, gentileza são alguns dos gestos que precisam voltar a ganhar espaço em uma sociedade do embate. A humanidade precisa triunfar, independente da oposição de ideias ou escolhas. Não que isso atenue a busca pela justiça e a luta contra a impunidade. Entretanto, o amor e a fraternidade precisam conduzir todos os nossos atos.

Sinto falta cotidianamente de abraços. Fico triste ao ver a quantidade de pessoas, mesmo as ideologicamente próximas, gastando energia contribuindo para a construção de muros, promovendo as diferenças, enfatizando o negativo e condenando o erro alheio sem uma reflexão dos próprios atos.

Temos optado diariamente pela desumanização, pela divisão, abrindo mão de buscar aquilo que nos une. É uma escolha cotidiana e individual. Porém, não nos esqueçamos de que somos todos cúmplices das consequências globais dela.

O beijo de Deus na alma

beijo de Deus

 

Alguns minutos após publicar a mensagem acima, tive meu perfil do Facebook invadido com centenas de curtidas e dezenas de mensagens de amigos de todas as partes do planeta. Fiquei espantado com as palavras de carinho até mesmo de gente que não vejo há muito tempo.

Viver pelos outros tem sido o projeto de vida da família que eu e minha esposa Flavia estamos construindo juntos. Foi esse o grande fundamento das nossas escolhas até aqui. Foi também o motivo que nos levou a casar e começar nossa vida em família no Brasil. Dois anos depois, fez com que deixássemos tudo para uma missão de três meses na Costa do Marfim e em seguida voltar para Suíça para estarmos próximos da “outra” família e para que a Flavia fizesse o mestrado dela e assim poder servir melhor a sociedade.

Através dos nossos trabalhos e em família optamos pelas pessoas. Porém, vivenciar o desenvolvimento de uma “pessoinha”, fruto do nosso amor, no ventre da minha esposa tem sido algo tão incrivelmente maluco que eu só consigo pensar em uma palavra quando tento traduzir essa experiência para as pessoas próximas: milagre.

Estou procurando me preparar para viver bem esse período. Sou do tipo de pessoa que gosta de ler, ouvir o testemunho de outros casais, para que tudo transcorra da melhor maneira possível. Contudo, a falta de certezas e também o fato de ainda não poder sentir fisicamente a presença da minha esperada filha obriga-me a confiar Naquele que sempre conduziu os nossos passos.

Uma lembrança marcante não tem saído do meu coração ultimamente. Há quase um ano, tivemos o privilégio de estar próximos de um casal de amigos-irmãos brasileiros no momento em que eles se tornaram pais. No dia seguinte ao nascimento, ainda no hospital, nos encontramos com o novo pai que, com lágrimas nos olhos, traduziu aquela experiência com a seguinte expressão: “um beijo de Deus na alma”.

Olhando para os rostos daqueles amigos tão amados e sua filha senti uma onda de felicidade indescritível. No fundo eu sabia que só entenderia tudo aquilo quando fosse a minha vez. Falta pouco, mas não vejo a hora de eu também ser beijado na alma.

 

De volta à Ásia

Mais uma viagem. Mais um país. Mais uma cultura.

No percurso em direção à Bangkok, onde eu e meus colegas de ACT Alliance de todo o mundo estávamos reunidos para o nosso encontro anual, foi difícil não sentir o coração apertar ao sobrevoarmos Iraque e Síria.

Desde que comecei a trabalhar nessa ONG que se ocupa, entre outras coisas, de responder ao clamor dos povos mais vulneráveis do nosso tempo, tenho relativizado novamente muitas coisas na minha vida. Não me basta mais a ingênua satisfação de ter uma vida equilibrada e estável, é preciso também fazer algo para aqueles quer tiveram a dignidade roubada pela guerra.

Poder doar meu tempo, energia e talentos para diminuir um pouco do sofrimento desses povos, me faz sentir – talvez egoisticamente – orgulho. Quero pertencer a um grupo de pessoas que procura fazer algo de bom para os outros, mesmo se, no fundo, quase irrelevante de tão pequeno.

11 anos depois visito novamente o continente asiático e, de novo, tragicamente, presencio meus irmão de Aceh (Indonésia) chorar mais vidas perdidas devido a uma catástrofe natural. Esse e outros acontecimentos de 2016 não têm me deixado esquecer que a vida é uma dádiva. Cabe a cada um vivê-la plenamente, não só para si mesmo, pois estamos todos de certa forma ligados uns aos outros.

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