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Uma comunicação que não é só informar

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Uma das maiores descobertas teóricas que fiz durante a “concepção” da minha tese de mestrado foi a do conceito de comunicação normativa, que remete ao ideal da comunicação: informar, dialogar, compartilhar, compreender-se. O vocábulo «comunicação», em latim communicatio, é derivado de communicare e significa ação (actio) de comunicar, partilhar, por em comum.

Segundo Wolton, “de valor essencialmente humanista, a dimensão normativa enfatiza a produção de consenso e está ancorada na fraternidade, no respeito pelo outro no ambiente de diversidade cultural das sociedades modernas”.

Este tipo específico de comunicação se choca com a dimensão funcional, que, “como seu nome indica, ilustra o fato de que, nas sociedades modernas, muitas informações são simplesmente necessárias para o funcionamento das relações humanas e sociais”.

As duas dimensões, normativa e funcional, remetem aos dois sentidos do vocábulo comunicação, desenvolvidos ao longo do tempo. “O primeiro, mais antigo, significa compartilhar, comungar” e está ancorado na tradição judaico-cristã. “O segundo, usado a partir do século XVI, está ligado ao progresso técnico e remete à ideia de transmissão e difusão”.

Na verdade, o sentido moderno de comunicação, essencialmente funcional, está profundamente conectado a outro vocábulo: a informação, que, segundo Wolton, “é produzir e distribuir mensagens o mais livremente possível”. Já o sentido antigo de comunicação (normativa) implica “uma relação entre o emissor, à mensagem e o receptor”. Assim, como explica o comunicólogo francês, “comunicar não é apenas produzir informação e distribuí-la, mas também estar atento às condições em que o receptor a recebe, aceita, recusa, remodela, em função de seu horizonte cultural, político e filosófico, e como responde a ela. A comunicação é sempre um processo mais complexo que a informação, pois trata de um encontro com um retorno e, portanto, com um risco”: a “incomunicação”.

Outro aspecto importante da comunicação se relaciona aos três campos em que ela se desenvolve: técnico; econômico; social e cultural, ambos fundamentais para que a mesma possa atingir um número “massivo” de pessoas.

A comunicação moderna tem uma relação forte com o campo técnico. Mas, ele somente cria a ilusão de que, quanto maior a quantidade de informação, mais os seres humanos estarão se comunicando. Para Wolton “seis bilhões e meio de computadores não bastariam de modo algum para assegurar mais comunicação entre os homens. Quanto mais fáceis se tornam as trocas do ponto de vista técnico, mais se torna essencial e difícil satisfazer as condições culturais e sociais, para que a comunicação seja algo diferente de uma transmissão de informações”.

Por isso, o aumento massivo da informação em circulação, promovido pelo tecnicismo, cria na verdade dois problemas: “aquele das condições para satisfazer um mínimo de comunicação autêntica e o do respeito, que vai além da técnica e da economia, à diversidade cultural”.

Para concluir podemos dizer que a palavra comunicação remete a três aspectos diferentes:

1)      distinção entre as dimensões normativa e funcional,

2)      os três campos em que ela se realiza (técnico; econômico; social e cultural)

3)      a diferença entre o uso das técnicas e a comunicação em si mesma.

A comunicação é encontro no Outro

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Segundo Dominique Wolton, “a comunicação é sempre a busca de relação e do compartilhamento com o outro”. No mundo atual, “todo mundo quer comunicar e ter acessos às ferramentas mais performáticas” e é o telefone celular aquela que “melhor simboliza esta revolução da comunicação em que o outro está sempre presente”.

“Comunicar é, antes de tudo, expressar-se”, pois exprime o desejo antropológico de manifestar a própria existência. Contudo, para o comunicólogo francês, “expressar-se não basta para garantir a comunicação, pois deixa de lado a segunda condição da comunicação: saber se o outro está ouvindo e se está interessado no que eu digo”.

Dessa forma, a expressão é somente a primeira etapa da comunicação. A segunda, a construção da relação, é mais complicada, porque diz respeito ao plano pessoal, familiar, profissional, politico e cultural.

Por isso, afirma Wolton, a verdadeira revolução da comunicação “diz respeito ao levar em conta o receptor”. “A comunicação traz consigo um duplo desafio: aceitar o outro e defender sua identidade própria. No fundo, a comunicação levanta a questão da relação entre eu e o outro, entre eu e o mundo”. Mesmo a economia e às técnicas se sobressaindo, “nunca se deve perder de vista a perspectiva antropológica e ontológica da comunicação”.

Além da busca da própria identidade e autonomia, a comunicação é, sobretudo, reconhecer a importância do outro, aceitando a nossa “dependência em relação a ele e a incerteza de ser compreendido por ele”.

Redescobrindo “o outro” da comunicação

Dominique-Wolton

Quando procurava um cientista da comunicação atual, capaz de sintetizar o momento histórico em que vivemos e sugerir “como” a comunicação de massa pode auxiliar no desenvolvimento da nossa sociedade, fui presenteado com as teorias de Dominique Wolton.

Pensador francês – nascido, porém, em Duala, nos Camarões -,  pai da Hermès, uma das revistas de comunicação mais importantes da atualidade, Wolton é também diretor de pesquisa no Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS).

Preocupado em analisar interdisciplinarmente a comunicação de massas, Dominique Wolton está à vanguarda do pensamento comunicacional e é um autor indispensável para estudantes e pesquisadores.

Recentemente, eu me debrucei na sua obra É preciso salvar a comunicação em que o autor resume as sua principais ideias e dá, de maneira perspicaz,  importantes chaves de leitura para que possamos entender melhor o fenômeno da comunicação de massas.

Em um contexto em que, “em menos de cem anos, foram inventados e democratizados, o telefone, o rádio a imprensa de grande público, o cinema, a televisão, o computador, as redes, transformando definitivamente as condições de troca e de relação, reduzindo as distancias e realizando a tão deseja aldeia global”, vivemos em um mundo em que “todo mundo, ou quase, vê tudo, sabe tudo sobre o mundo”.

Contudo, afirma Wolton, “pensamos de boa fé que tais mudanças trariam enfim um pouco mais de paz entre os povos, mas, infelizmente, não é porque o estranho, o outro, se tornou mais visível que a comunicação e a compreensão mútuas melhoraram”. “A aldeia global é mesmo uma realidade, mas não reduz as desigualdades, nem as tiranias, nem as violências, nem as mentiras”.

Diante dessa realidade, emerge um grande desafio: “como conciliar a realidade técnica e econômica da comunicação com sua dimensão social, cultura e politica?”. Salvar a comunicação é, para Wolton, “preservar sua dimensão humanista”.

A comunicação de massas evoluiu a partir do “desejo de ampliar incessantemente o horizonte do mundo e das relações”.  Contudo, ela nasce do ser humano onde, “não há comunicação sem o respeito ao outro, e nada é mais difícil do que reconhecer o outro como seu igual, sobretudo se não nos compreendemos”.

Nessa seção do escrevo Logo existo, vamos conhecer e aprofundar o pensamento de Wolton e descobrir que a comunicação nasce de uma tripla relação: com si mesmo, o outro e o mistério.

Comunicação: Troca cultural?

Responder a pergunta que intitula o livro de Luís Sá Martino é mergulhar na sua tese sobre o momento em que a comunicação de massa se encontra atualmente.

Para Martino, a partir da década de 90, a geração de universitários “tem dificuldade de sair da crítica ao senso comum”. Dessa forma o autor sugere um estudo da comunicação que aprenda “a encontrar referências na filosofia, sociologia, antropologia” entre outras disciplinas.

Tentando superar essas dificuldades geracionais e iniciar um estudo transdisciplinar, comecei recentemente a trilhar um percurso de estudos que busca resgatar a dimensão relacional (normativa, segundo Dominique Wolton) da comunicação, para superar o drama do “transmissionismo” que ignora o sentido ontológico de “troca” que define a “communicatio”.

A obra de Luís Sá Martino se situa dentro de duas escolas importantes do estudo da comunicação: A Escola de Frankfurt e a escola de Estudos Culturais.

Dedicando-se primeiramente aos Estudos Culturais Martino apresenta as principais características da escola e a importância que a mesma dá em identificar a comunicação de massa como prática cultural, envolvendo-se porém diretamente com as relações de poder.A escola de Estudos Culturais – que não é formalmente uma escola, mas uma corrente de estudos – tem pressupostos relacionais, buscando sobretudo revolucionar o método de investigação científica, adaptando-o a diferentes contextos e assim, abrindo-se aos diferentes receptores.

Em seguida Martino se ocupa da Escola de Frankfurt evidenciando as consequências da imagem como mercadoria e o cotidiano “espetacularizado” pela comunicação de massa. Walter Beijamin, Debord, Morin, ilustram os questionamentos do autor em relação aos aspectos levantados e dão uma visão geral do problema, propositalmente não aprofundado na obra.

O último capítulo se ocupa da crise da liberdade, onde a comunicação, dentro do cenário de manipulação, serve hegemonicamente para impor uma escolha. Ela – a comunicação – transforma-se em instrumento de dominação, não de troca, que repercute também na concepção do que é real.

Um livro interessante que introduz o leitor as problemáticas correntes da comunicação, mas que, ao meu ver, se limita a perspectiva frankfurtiana, historicamente condicionada a uma visão majoritariamente critica e pouco produtiva.

Contudo, a obra consegue evidenciar a necessidade (urgente) de construir um novo modelo de comunicação, que leve em consideração o processo comunicacional como troca, que recupere o importante papel do receptor, na sua complexidade tridimensional[1].


[1] O conceito de ser humano tridimensional emergiu da tese no Instituto Universitário Sophia que buscava entender os aspectos  fundamentais do ser humano, que o identifique universalmente e singularmente. Baseado na antropologia filosófica chegou-se  concepção de homem que se relaciona consigo mesmo (intelecto), com o outro (essencialmente diferente) e com o mundo (que permite as questões fundamentais sobre a sua existência – Deus, a morte).

 

 

 

A desnecessidade de boas notícias

Nas últimas semanas, uma colega de profissão mostrou-me o portal “Só notícia boa” (www.sonoticiaboa.com.br) que tem como o objetivo “Divulgar notícias boas, positivas, que reanimem as pessoas e mostrem que o mundo tem saída sim”

O portal é uma resposta, no mínimo criativa, ao sentimento negativo que o “receptor” das notícias jornalísticas nutre em decorrência da onda negativa que invade cotidianamente os nossos noticiários.

Participando de um fórum de discussão sobre o portal perguntei a mim mesmo: Eu preciso de boas notícias para viver melhor? Sentir-me melhor? Ser uma pessoa melhor?

A resposta negativa imediata a todos esses questionamentos me fez refletir sobre a utilidade do portal, que mesmo cheio de boas intenções, pode descambar para o outro extremo do “dilema ideológico” que quer ver o mundo só de uma perspectiva positiva, esquecendo, porém, que a realidade não pode ser “formatada”, manipulada.

É evidente que o Jornalismo, na sua prática, chegou a um ponto dramático de instrumentalização negativa, aonde grande parte de seus “operadores” aparenta sequer se questionar sobre o seu significado ontológico.

O Jornalismo surgiu historicamente com objetivos libertários, como possibilidade de contraponto do poder político, mesmo que usado especialmente com esses fins. Porém, no seu próprio desenvolvimento, em modo especial na transição do século XIX para o XX, emergiu a necessidade de não deixar que ele se deixasse levar por objetivos ideológicos e comerciais, enfatizando a essência ética que orienta o jornalismo.

Desta forma nasceram os primeiros códigos de éticas, as universidades, para que o jornalismo e os jornalistas assumissem a responsabilidade de fazer com que esse “instrumento” (uma conquista da sociedade já massificada) fosse direcionado para o bem comum, o bem estar social.

Contudo, sendo essencialmente instrumento, o jornalismo poderá sempre ser usado de maneira ideológica, com fins comerciais, em vez de libertar, integrar. Não é preciso um olhar muito apurado para perceber o ponto em que ele se encontra na nossa sociedade hoje. É realmente difícil encontrar uma empresa jornalística que tenha um projeto que seja, ao menos parcialmente, voltado a priori para a sociedade.

As notícias não devem, no meu entendimento, serem boas, mas sim, BEM FEITAS, isto é, contextualizadas, aprofundadas, retomando os valores humanísticos e religiosos de uma comunidade. Notícias que nos permitem entender que os acontecimentos, por mais afastados geograficamente que sejam de nós, têm influência direta no nosso modo de viver, ver e ler a realidade, porque exprimem a essência antropológico-filosófica dos seres humanos.

Em vez de um portal com “só notícias boas” eu queria ver um movimento de profissionais e da sociedade como um todo que exigisse mais jornais de notícias bem feitas. Isto é, contextualizadas, aprofundadas, bem apuradas. Aí começaremos encontrar os problemas estruturais que permitem que jornalismo hoje seja, cada vez mais uma antítese do que é verdadeiramente comunicação.

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