Category: Pra salvar a Comunicação

Bate papo com José Salvador Faro sobre o jornalismo – Terceira parte

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Faro,Queria dizer um pouco do que penso sobre as suas “questões”.

1- São inúmeros os campos profissionais nos quais a competição acirra uma postura a-ética (diferente de anti-ética). A idéia de um profissionalismo a qualquer custo (desprovido de indagações de natureza social ou política) é um mito da sociedade contemporânea que tem sido sistematicamente cultivado ao lado de outros: eficiência, “isenção”, sucesso etc. Tudo sem ideologia, sem política…

Ok…. entendo e compartilho com você essa opinião de profissionalismo a-ético (que entendi como SEM ÉTICA e não contra a ética)… mas, acho que isso é muito claro. A sociedade contemporânea colocou a ética como “último item da lista de prioridades” no que diz respeito às outras necessidades citadas: eficiência, “isenção”, sucesso…

A minha pergunta é… o que vale mais, ser um grande jornalista (no plano da isenção, eficiência e tudo mais…) ou um cidadão preocupado com o ser humano, com o bem estar social? É possível ser os dois na sua visão?

Isso para mim entra muito em contato com a sua última ponderação, classificando como “trabalho – ou um exercício – comunitário “purificador” … frágil e, a médio prazo, inconseqüente”…. Concordo realmente com vc, se a sua visão sobre a minha proposta gire em torno de uma “simples atividade” como outra qualquer, com a finalidade de tranqüilizar a consciência a respeito da impossibilidade de “mudar o que é posto”. Porém, não é essa a minha proposta… Acredito que só o contato com os “diferentes mundos”, as “diferentes verdades, (ou fragmentos delas) o ser humano torna-se capaz de se transformar e consequentemente, transformar o seu trabalho.

A teoria é a base do pensamento… mas o pensamento não é matéria, não é ação e, se não é “encarnado”… morre, para dar lugar a outros, num ciclo aparentemente vazio e insuficiente.

O trabalho COM as comunidades (e não NAS comunidades) é uma maneira de FORÇAR-SE a sair de si mesmo… perdendo pré-conceitos, entendendo melhor a complexidade dos seres humanos e das relações sociais. É a mudança interior que essa experiência produz, o principal escopo de uma inserção em um trabalho comunitário…e não o trabalho em si e os frutos do mesmo….

Você sabe o quanto o contato PESSOAL com outras culturas, realidades, nos transforma (enriquece) como indivíduos. Se como ser humano, isso é já de uma riqueza imensurável, acredito que, para um jornalista é um acréscimo de “capital, tão ou mais importante que o “capital intelectual”, que ao meu ver só confere “status”, mas faz pouca Política.

No jornalismo, dada a sua dimensão pública, essa postura é mais evidente e tem conseqüências de dimensões imprevistas. Mas não devemos, segundo penso, dissociar o que acontece com ele do quadro mais geral de referências culturais “pós-modernas”. Não é uma questão da “natureza humana”, como se o “egocentrismo” fosse um pecado original. Nós não podemos naturalizar o pecado porque se o fizermos, condenamos a humanidade inteira, em todas as épocas, em todos os países;

Não acredito que seja possível condenar a humanidade, pois não vejo os erros passados com maniqueísmo. O que condeno são ações que não visam uma emancipação, que tenha a Sociedade como principal beneficiada. Acredito que a ética é justamente o “termômetro”, que também só se faz útil em uma sociedade em que os cidadãos são ouvidos.

Pessoalmente, acredito na força da formação humanística. É preciso erradicar essa idéia de que o jornalismo é uma profissão “técnica” através do redimensionamento do seu papel. E isso só é possível através de duas formas: a universidade e as próprias cobranças sociais para que a mídia cumpra, no limite do possível, seu papel de esfera pública íntegra;

Acho que nisso concordamos. Só não acho que é positivo receber uma formação extremamente intelectual, se não se aprende a colocá-la na prática. (ou até se aprende, mas pouco se experimenta)

No momento, penso que o prioritário é entender a lógica, as causas, as razões da realidade. É um grande passo.

Bom, Faro, admito que fiquei meio engasgado com a sua última frase, em relação a nossa grande prioridade. Dá pra entender as razões, a lógica e as causas da realidade lendo livros e discutindo em sala de aula???? Sem entrar em contato com os paradoxos sociais, sem ouvir as pessoas, entender seus dilemas (coisa que talvez faremos quando estivermos formados e empregados)???

Para mim parece uma grande ilusão… eu sou muito mais cidadão fruto desse contato com a realidade, dessas experiências com “o outro lado da cidade”, do que com o grande contingente (e contraditório) de ideologias (vazias) que a faculdade me dá.

Todos os teóricos que entrei em contato na PUC me ajudam muito a transformar a realidade em explicações formais,.mas são sempre explicações MIDIADAS (para mergulhar nas nossas discussões em aula) e, por isso, ineficientes. Não está na hora de construir uma nova TEORIA, que respeite também a importância da prática, para a adaptação da mesma às mudanças sociais?? O passado serve de Luz pra a construção do presente, mas não precisamos dar os nossos passos, tirar as nossas próprias conclusões, fruto das nossas experiências?

Perguntas … perguntas… difícil é responder todas elas né?
Grande abraço…

V@lter

Resposta:

v@alter,

Ótimos argumentos. Sugiro que a gente abra uma grande discussão sobre eles pq concordo com uns, discordo de outros, mas gostaria de poder me estender mais. E por email é difícil.

Vou encarregar vc dessa tarefa: na nossa próxima aula efetiva, isto é, dia 2 de junho, o tema será esse e é vc quem vai apresentar o problema e organizar o debate.

Abração

www.jsfaro.pro.br

Bate papo com José Salvador Faro sobre o jornalismo – Segunda parte

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Faro,

Escrevo só pra dizer que a carta publicada no meu blog teve quase 100 acessos em menos de uma semana. Percebi que realmente estão colocadas algumas questões que fazem parte de um universo amplo de perguntas “sem resposta”.Ontem, depois da aula, tive a tentação de escrever outra carta para você, mas achei que talvez devesse pensar mais, antes de dizer o que penso.

O filme (Leões e Cordeiros) me fez pensar realmente se a ética ainda move as atitudes do ser humano, do jornalista em especial, pois o ego passou a ser o principal foco que o Sistema busca alimentar, para ter em troca todo o “poder” que a posição da profissão nos confere.

Colocar o interesse público sobre o pessoal é uma opção cotidiana que começa no “jogar um papel incômodo no chão” a decidir se o que vai ser noticiado tem realmente princípios que não ferem a sociedade…

Mas como ir contra a nossa individualidade egoísta, hedonista, dentro do contexto liberal pós moderno e assim evidenciar valores fraternos e justos, se já na universidade não existe uma preocupação cidadã por parte dos jornalistas??

Fiquei pensando em materializar as minhas idéias sobre como propiciar essa tal formação “humana” para os candidatos à jornalista e concluí que só o contato (físico) com o mundo “além das perdizes” permitiria uma emancipação da visão enquadrada que encontramos nos “filhos da PUC” (ou da USP, Mackenzie… )

Acho que uma opção seria talvez uma disciplina prática em que fosse possível entrar em contato com alguma comunidade carente (de recursos financeiros, pois na maioria das vezes é só o dinheiro mesmo que falta para estes) e junto com eles, criar um jornal comunitário em que eles pudessem escrever e nós, aprendermos com eles, vivenciarmos essa experiência de “sair de nós mesmos”…

Sinceramente… eu toparia usar até minhas manhãs de sábado para realizar esse projeto… não sei os outros… mas claro, se fizesse parte das atividades do curso, sendo obrigados, todos fariam essa experiência, ao meu ver, proveitosa e inesquecível.

Você acha isso possível?

Bom… são só idéias…. sempre…

abraço
V@LTER…

acesse o blog – http://vartzlife.wordpress.com/

RESPOSTA:

V@lter,

Pondero com vc algumas questões:

1. São inúmeros os campos profissionais nos quais a competição acirra uma postura a-ética (diferente de anti-ética). A idéia de um profissionalismo a qualquer custo (desprovido de indagações de natureza social ou política) é um mito da sociedade contemporânea que tem sido sistematicamente cultivado ao lado de outros: eficiência, “isenção”, sucesso etc. Tudo sem ideologia, sem política…
2. No jornalismo, dada a sua dimensão pública, essa postura é mais evidente e tem conseqüências de dimensões imprevistas. Mas não devemos, segundo penso, dissociar o que acontece com ele do quadro mais geral de referências culturais “pós-modernas”. Não é uma questão da “natureza humana”, como se o “egocentrismo” fosse um pecado original. Nós não podemos naturalizar o pecado porque se o fizermos, condenamos a humanidade inteira, em todas as épocas, em todos os países;
3. Pessoalmente, acredito na força da formação humanística. É preciso erradicar essa idéia de que o jornalismo é uma profissão “técnica” através do redimensionamento do seu papel. E isso só é possível através de duas formas: a universidade e as próprias cobranças sociais para que a mídia cumpra, no limite do possível, seu papel de esfera pública íntegra;
4. Também fico tentado a pôr em prática soluções espontâneas e generosas, mas tenho dúvidas sobre a eficácia delas. A idéia de uma trabalho – ou um exercício – comunitário “purificador” me parece frágil e, a médio prazo, inconseqüente. Mas também não me agrada ficar esperando que alguma epifania me diga o que fazer. No momento, penso que o prioritário é entender a lógica, as causas, as razões da realidade. É um grande passo.

Ponha essa discussão no blog e vamos ampliá-la em aula.
Bom feriado

Faro

Primeira parte: http://vartzlife.wordpress.com/2008/05/16/carta-ao-professor-faro-puc-sobre-o-jornalismo/

Bate papo com José Salvador Faro sobre o jornalismo – Primeira parte

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Caro Faro,

Acabei de chegar em casa e decidi escrever logo, antes que o meu pensamento sobre a aula se fosse com o sono difícil de suportar.

Depois do que disse a você no final da aula, achei oportuno formalizar a minha opinião, para que ela não se perdesse no emaranhado de conceitos que você vem nos dando durante o semestre.

Pois bem… quero reiterar tudo que confessei: Acredito que, como qualquer outra empresa, aquelas que atuam no universo da comunicação social (Veja, Estadão ou Folha…) não só querem, como precisam vender seu produto.

No meu ver… trabalhando já há um pouco de tempo, isso é absolutamente normal, visto que a sobrevivência financeira é uma REGRA do sistema capitalista…. o que está ERRADO e é anormal, é que essas EMPRESAS se apresentem como instituições democráticas, com interesses políticos (no sentido que você mesmo enfatizou), para vender tal produto.

Claro… não disse nada de novo… é tudo postulado e extremamente claro, acredito, para todos. Ficar discutindo esse tipo de coisa para mim não dá nenhum tipo de diretriz com escopos de mudanças (políticos) para eu que sou estudante. Não emancipa nenhuma das minhas reflexões, pois fica no tal “senso comum” que você insiste em nos fazer (beneficamente) entender.

É nesse ponto que quero discutir…. entrei na PUC porque, mais que jornalista, estava preocupado com a minha formação como cidadão… um “intelectual” sim, mas imerso na realidade social que procura ouvir todos os lados, para propor mudanças políticas… porém o que tenho visto é uma reflexão intelectual que despreza a atuação do jornalista, discutindo-se primordialmente a Mídia.

Não tenho nenhum pretexto de exigir de ninguém respostas… mas posso exigir foco… e discordo um pouco de algumas temáticas e também do modo em que as discussões são feitas, de modo com que a clareza do conceito deve sobrepor as opiniões diversas, que nem sempre são tão fundamentadas como a do Mestre.

O que deve-se pensar é a formação humana do jornalista, dentro de um Sistema postulado que deve ser mudado por um conjunto de escolhas pessoais e não pela conversão “horizontal” dos detentores da informação.

Lendo o TCC de uma colega sobre o Caco Barcelos… pensei muito no que ele disse…. Perguntado sobre como conseguia emplacar seus programas de caráter sempre BEM JORNALISTICOS, as vezes contrastando com o perfil Global, Caco disse que tudo partia do como apresentava suas idéias…. dizia que no início, propunha 4, 5 pautas de matéria em que quase sempre só uma era aceita… percebendo que, se quisesse ter mais espaço, mais matérias emplacando deveria se esforçar mais, começou então a propor 10, 20 pautas em que eram aceitas 5… ou 10… proporcionalmente…

Mas qual é o X da questão???… acredito que existe uma grande parcela de compromisso INDIVIDUAL que cada um necessariamente precisa ter com a ética… procurando entender que a sociedade é também os marginalizados e não somente os freqüentadores da Daslu, mas para isso o jornalista precisa ir “de encontro” com as realidades, as pessoas, sem pré conceitos… mas isso é a tal “formação cidadã” que eu vejo secundária na formação universitária.

Nas muitas experiências que pude fazer, sobretudo vivendo com pessoas de culturas diferentes, em lugares diferentes, só entendi o valor da cultura, da relatividade dos valores, quando entrei em “choque” com os meus “semelhantes” que pensavam completamente diferente de mim, mas um completamente realmente profundo.

Não é do amor ao diferente… ao menos o interesse, que podem nascer teorias que cumpram essa “objetividade” com escopos realmente políticos???

Desculpe a falta de lógica ou se estou sendo arrogante, mas hoje, em um desentendimento chato que tive com a Elígia, percebi que tantas vezes a discussão não tem um viés final político… me peguei me perguntando o quanto tenho feito pelos outros, pela minha cidade… concretamente sim… mas também o quanto tenho “encarnado” isso nos meus textos, no modo como apuro as notícias, exponho o meu “fragmento de verdade”.

As vezes as idéias estão sendo apresentadas de modo esquizofrênico… dissociada de uma reflexão individual que deveria ser pressuposto de qualquer prática jornalista…

Eu sei que talvez a nossa disciplina não seja o local para essas discussões… mas me dei conta agora, no terceiro ano, que a faculdade não nos deu esse tipo de formação… fomos entupidos de teóricos que pensaram muito, mas não sei até que ponto aquilo era fruto de uma prática pessoal… isso me faz também ver claramente que a sociedade pouco muda… vive em uma “roda viva”, porque a teoria vem cada vez mais dissociada da prática…. não estou dizendo que ela deve ser funcional, mas sim visando o desenvolvimento.

Os tais pensadores, intelectuais, discutem, pensam durante a sala… e depois vão puxar um “beque” pra relaxar e enfim sustentar o tráfico… um grande paradoxo… mais um…
Bom… chega… era mais pra compartilhar com você tantos pensamentos… e agradecer a aula, por possibilitar tudo isso…

Queria ter a capacidade de síntese para expor tudo em sala… mesmo a liberdade pra dizer tudo isso e não parecer que acho que sou o dono da verdade e que coloco meu pensamento na frente do BEM que quero cada um do meu curso… mas… infelizmente não sou assim…

Prometo que vou me esforçar mais pra ser mais participativo… por mais banal e simplória, sei que, como todos, tenho algo pra dizer, pra deixar…

Grande abraço

V@lter

Resposta:

V@lter,

Ótimas reflexões. Sempre são ótimas quando beiram o desabafo…

Mas eu acho que é mais que isso: vc põe em xeque questões fundamentais da formação universitária em geral e do jornalista em particular.

Afinal, qual o sentido da discussão sobre uma “Teoria” se a base de sua formulação (da “Teoria”) tem tantas fragilidades?

Vc daria uma ótima contribuição para a minha disciplina se botasse tudo o que escreveu na roda da turma.

Abração.

Faro

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