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A mídia é mentirosa? Jornalismo e a busca da verdade

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Está lá no meu curriculum. É só entrar no Linkedin e conferir: “Jornalista profissional com mais de 8 anos de experiência”. Bom, mas o que isso significa? Esse tempo serve como atestado absoluto de credibilidade?

Não sei se já disse publicamente, mas escolhi estudar jornalismo por considerar a partilha um dos pilares da existência humana. No meu entendimento, partilhar é uma forma de comunicação interpessoal. Ela exige, indiscutivelmente, o envolvimento de dois ou mais sujeitos. O jornalismo, impulsionado pela ideia de uma comunicação “de massa”, nada mais é que uma partilha “em larga escala”. Com ele, comunicar torna-se o árduo ofício de identificar, na cotidianidade dos fatos, aspectos que nos ligam e nos fazem, em qualquer parte do planeta, iguais, “irmãos”.

Bonita essa explicação, não? Eu acho. Mais do que isso, eu acredito nesse “ideal”. Abstendo-se de promover esse encontro “ontológico”, o jornalismo não passa de um alto falante dos poderosos, que usam a mídia para promover interesses particulares.

A mídia: verdade ou mentira?

verdadeSempre me informei por meio da mídia em geral. Ultimamente tenho confiado um pouco mais em estudos de organizações internacionais, mas, no fundo, ninguém me garante que elas são 100% imparciais.

Então, para conhecer a verdade, é preciso observar os fatos com próprios olhos? Sim e não. Claro que a possibilidade de observar um fato “in loco” é uma riqueza e tanto, porém, duas pessoas que testemunham um mesmo fato podem tirar conclusões completamente antagônicas. Eu minha esposa experimentamos isso na nossa recente passagem pelo continente africano.

Mas, afinal de contas, é possível defender uma verdade “jornalística”? Existem informações absolutamente confiáveis? Difícil responder.

Acho que tudo passa pela identificação de padrões nas informações divulgadas. A imparcialidade defendida pelo jornalismo é um instrumento importante, pois tem como premissa o fato e não a sua interpretação. Porém, toda informação precisa nos levar a algum lugar. Os fatos precisam ser enriquecidos por outras informações e opiniões equilibradas que respeitem a complexidade dos mesmos.

Atenção ao equilíbrio!

Equilíbrio. Essa é a sensação que procuro experimentar ao “consumir” uma informação. Mesmo consciente de que o jornalismo, para simplificar, insiste no jogo maniqueísta.

Gosto de pensar na Verdade como um quebra-cabeças. Para chegar à ela é preciso considerar todas as vozes. Cada “peça” é fundamental para um resultado satisfatório. Contudo, para montá-lo são fundamentais a paciência, a atenção e o discernimento crítico das informações/peças que se tem em mãos. O resultado final, as sínteses, precisam, entretanto, serem universais.

minorias mudas

Minorias mudas: um produto do jornalismo unidimensional

minorias mudas

É fato: quando a mídia trata, principalmente, de acontecimentos no continente africano ou no Oriente Médio, temos uma leitura unidimensional que produz aquelas que considero minorias mudas. Calma. Vou tentar explicar abaixo.

Graças ao aprendizado da língua, agora tenho o privilégio de poder acompanhar as leituras midiáticas também em francês. Em uma delas a vice presidente da União Francesa dos Judeus pela Paz, Michèle Sibony, evidencia a produção de um discurso unilateral pela imprensa Europeia que acaba legitimando os ataques israelenses direcionados à Gaza.

A “Guerra Santa” que o “Ocidente pós 11 de setembro” tem traçado contra o islamismo coloca as diferenças religiosas como principal promotor de um conflito extremamente complexo, como é aquele entre Israel e Palestina. A necessidade maniqueísta de identificar aqueles que são, segundo o Ocidente, os “bons” – o “povo judeu” –  e os “maus” – os terroristas do Hamas –  em vez de promover um aprofundamento das verdadeiras questões, reduz as possibilidades de um real entendimento e uma plausível negociação.

Segundo Michèle Sibony, no que diz respeito ao conflito Israel-Palestina, a mídia ignora as vozes da minoria e, dessa forma, “rouba” a sua capacidade de apresentar e defender suas causas em uma situação de paridade. Eu diria que elas, assim, permanecem minorias mudas.

Dar forma aos fatos

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Na minha tese de “laurea magistrale” fiz um mergulho (não tão profundo, porém decidido) na comunicação como dimensão ontológica da pessoa humana. Por ser parte do nosso “ser no mundo” a comunicação também subsiste nos instrumentos que forjamos para exprimir nossa existência. Queremos comunicar com nós mesmos, com os outros e com o Transcendente, esta última, uma dimensão ignorada, quase subjugada, mas que precisa urgentemente ser redescoberta.

A partir deste estudo inicial, que me fez entender qual seria a “alma” da comunicação, passei a aplicar essa visão tridimensional do “comunicar” às diferentes análises e percepções que fiz a respeito da mídia de massa, visando entender melhor como ela se comporta ao traduzir sua leitura dos acontecimentos (ou fatos) em informação.

Informar é, acima de tudo, dar forma. Nada de novo, claro. Sobretudo no que diz respeito ao significado semântico do termo. Contudo, as “formas” que são dadas aos fatos do cotidiano, nem sempre espelham a sua universalidade.

Como, geralmente, são sempre as mesmas pessoas, as mesmas empresas de comunicação, dos mesmos países que “informam” o mundo, acabam  sendo sempre promovidas as mesmas visões, que evidenciam interesses específicos.

Dar voz as minorias mudas

“O simétrico da comunicação, na ordem dos valores, é o respeito ao outro e a confiança. Comunicar com o outro é reconhecê-lo como sujeito, portanto, estar mais ou menos obrigado a ter-lhe alguma estima”, explica Dominique Wolton e acrescenta “a comunicação obriga ao mesmo tempo à argumentação e a tolerância. (…) O essencial é esta demanda de compreensão de si e da melhora das relações com o outro.”

Simetria. Respeito ao outro. Confiança. Reconhecimento. Estima. Tolerância. Todos termos que exprimem a intrínseca relação existente entre comunicar e “o outro”.  Em uma sociedade como a nossa, em que o poder da palavra e da imagem é decisivo, quando o jornalismo perde essa capacidade relacional, multidimensional, ecoa aquele que eu chamo de “Fundamentalismo da palavra”, em que a opressão ideológica se baseia no dar voz exclusiva a um ponto de vista e silenciar “o outro”.

Para Wolton “confiança e respeito são as palavras chaves da sociedade de comunicação”. Não se pode jamais silenciar as minorias, os mais fracos. É esse o grande motor dos holocaustos.

Neste caso o jornalismo precisa ser responsabilizado. Especialmente quando, em vez de buscar a Verdade, fundada na relação entre as diferentes vozes, ele se torna uma espécie de assessoria de imprensa das ideologias de governos e governantes aproveitadores.

O desafio é grande!

Terra Santa

Devaneios sobre o absurdo na Terra Santa

Terra Santa

AP

Já há algumas semanas tenho procurado ler os horrendos acontecimentos na Terra Santa, usando os instrumentos intelectuais que adquiri ao longo do tempo.

Dia após dia os jornais do mundo inteiro vêm estampando um dos genocídios mais impunes da história recente. O governo israelense e os grupos que reivindicam a soberania palestina se digladiam há anos, em um conflito armado que disseminou o ódio entre dois povos e que tem a ignorância e a omissão irresponsável dos governos estadunidense e europeu como grande promotor.

Quais leis defendem os civis da Terra Santa?

A recente escalada da violência, segundo a UNESCO, tirou a vida de mais de 400 crianças palestinas. Não acredito que valha a pena perder tempo debatendo as causas atuais, pois elas são menores se se olha o conflito em linhas gerais. Uma premissa, porém, é fundamental considerar: os responsáveis pelas mortes de agora e das últimas décadas provavelmente não serão punidos!

A resposta para a questão proposta acima é simples: a legislação internacional reconhece “legalmente” dois tipos de conflito armado: o internacional (entre duas nações internacionalmente reconhecidas) e o não internacional (entre um ou mais grupos rebeldes e um Estado soberano). O conflito Israel-Palestina não se encaixa em nenhum deles e essa situação não só admite a impunidade, mas contribui decisivamente para distanciamento do tão sonhado fim do conflito.

Reconhecimento do Estado Palestino

Terra SantaPara que seja dado um verdadeiro passo concreto rumo a paz na Terra Santa, acredito que seja imprescindível reconhecer o Estado Palestino. Contudo, infelizmente esse é um processo muito mais complexo do que aparenta. Além da multiplicidade de vozes que reivindicam o reconhecimento político palestino, sendo algumas delas moderadas, outras fundamentalistas, há interesses estratégicos e econômicos de outros países em jogo na região.

A falta de uma voz única fragmenta a causa palestina e permite que Israel justifique seus ataques impunes aos civis da Faixa de Gaza como “combate ao terrorismo” (que, até um certo ponto, é mesmo) promovido pelo Hamas.

Não vou ousar, de forma alguma, tentar dar respostas ou soluções para uma realidade muito mais complexa do que as minhas capacidades analíticas. Contudo, acredito que, enquanto não houver uma proporcionalidade entre as forças políticas, teremos dificuldades para encontrar uma solução diplomática e, dessa forma, continuaremos a ver um desesperador massacre de inocentes.

A mídia constrói ou destrói?

O que posso fazer, sem medo de errar, é analisar o papel da mídia nesse terrível conflito. Sinceramente, eu sou completamente cético a respeito da força da opinião pública na pacificação de um conflito. Sendo estratégico e lucrativo, mesmo que o mundo inteiro esteja contra, que o Papa, Gandhi, Dalai-Lama se pronunciem, um Estado não abrirá jamais mão do uso da força para conquistar seus objetivos. Isso diminui muito a força direta da mídia no que diz respeito a simples divulgação “pura” dos fatos.

Mas então o que a mídia pode fazer? A minha resposta é propor perguntas!

É notável, principalmente no universo acadêmico, que toda verdade (ou fragmento dela) nasce da pergunta certa. Nós percebemos o mundo. Vemos inúmeras situações e, a partir delas, criamos nossas teses, nossos julgamentos, que devem contudo serem verificadas e partilhadas para que tenham valor. Entretanto, uma boa tese, um bom julgamento, nasce de uma boa pergunta. É esse também o DEVER do jornalismo.

Contudo, o que tenho visto, em geral, é a tal fixação nos fatos, que só têm sentido se feita com profundidade e não de maneira fragmentada como os jornais têm feito de maneira corrente. As perguntas certas nos ajudam a pensar com profundidade. Por exemplo: Quem vende as armas para o Hamas? São os mesmos Estados que condenam publicamente conflito? Por que eles não são punidos? Por que não existe um maior esforço para unificar os grupos de interesse palestinos para então reconhecer a soberania do Estado Palestino? Pelo medo do fundamentalismo? Talvez. Ou então… Quais justificativas o governo israelense dá ao bombardear escolas da ONU? O Hamas está jogando seus mísseis a partir delas?

Tenho tantas perguntas! Só não entendo o porquê não existe uma força tarefa para propor outras e, no exercício de tentar respondê-las, nos ajudar a pensar alternativas, encontrar as verdadeiras causas e, principalmente, punir os verdadeiros culpados.

Mas, como eu disse anteriormente, existem muitos outros interesses em jogo. A vida dos civis – termo quase banalizado nos conflitos recentes – parece ser pouco relevada. Por que?

Segunda temporada de Newsroom: continuando a desvendar o telejornal

segunda temporada de Newsroom

Em setembro de 2012 eu fiz um post sobre a série televisiva “Newsroom”, uma das mais interessantes obras a respeito da vida e dos dilemas da produção telejornalística.

Há poucos dias, terminei de ver a segunda temporada de Newsroom e, novamente, me surpreendi com a capacidade do diretor Aaron Sorkin de mostrar tão bem alguns aspectos que só são possíveis de perceber “de dentro” de um jornal.

Segunda temporada de Newsroom

The-Newsroom-1a-temporada-14Na segunda temporada de Newsroom as questões importantes do jornalismo ainda são debatidas, mas com uma diferença: elas não estão mais diluídas em contextos interessantes e por natureza da profissão, variáveis.

Um (novo) protagonista da série é Jerry Dantana, ambicioso produtor sênior de Washington que recebe uma dica que pode “fazer carreiras e acabar com presidências”. A dica é que na operação Genoa, o governo americano usou Gás Sarin em civis para uma extração de soldados capturados

Na série, a investigação sobre a operação Genoa toma toda a segunda temporada e mostra como um fato polêmico precisa ser profundamente apurado, antes de ser noticiado. Mesmo assim podem ser noticiadas mentiras.

Os personagens de The Newsroom são dotados de uma inteligência sem par, de um idealismo e de um respeito profundo pelo jornalismo. Todos eles possuem uma leveza que contrasta com a gravidade daquilo com que eles lidam no dia a dia, fato que, porém, foi alvo de críticas por ser considerado um retrato hipócrita do jornalismo.

O fim de Newsroom

The-Newsroom-1a-temporada-10Mesmo com Jeff Daniels, que interpreta o âncora Will McAvoy, ganhando neste ano um Emmy de melhor ator em série dramática, a HBO anunciou, na última semana, o cancelamento da aclamada série dramática de Aaron Sorkin, após sua terceira temporada.

Acho uma pena porque a série é realmente um interessante modo de conhecer o que existe por trás das câmeras televisivas. Como profissional ligado ao mundo da comunicação de “massa” vibrei com cada capítulo da série, mesmo se, para os críticos, alguns deles não faziam muito sentido. De qualquer forma, indico muito aos interessados no jornalismo televisivo.

Vídeo do site Omelete sobre a série:

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=J6l5evItnY0#t=209]

Ideologia técnica: superá-la por uma verdadeira comunicação

Ideologia técnica

A revolução da internet, exaltada nos anos 90, promoveu a ilusão de que o “universo” virtual iria gerar um novo homem, mais informado e, por isso, consciente da dimensão global da sociedade e da ampla possibilidade de relações sociais. Tudo por meio da técnica.

Essa ideologia técnica, infelizmente, ainda não morreu. Segundo o comunicólogo francês, Dominique Wolton, ela ainda nos faz acreditar “que são os limites da técnica que impedem as mutações sociais e politicas”. Essa espécie de “esoterismo” também ajuda a confundir a comunicação, com a performance das maquinas; a abundância de informação com a intersubjetividade. Segundo Wolton, essa visão é tão “ingênua ou demagógica quanto denegrir a comunicação como processo de intercompreensão, reduzindo-a, ao mesmo tempo, a um simples processo de transmissão unilateral”.

O ser humano por trás da comunicação

Ideologia técnicaComo acenei, nos parágrafos anteriores, a comunicação não se resume a uma técnica. Não se pode negar a importância humana que existe no interior do processo comunicacional, com o risco de descartar sua ontologia relacional e de partilha.

“Expressão e interação, por mais necessárias e uteis que sejam, não são sinônimos de comunicação. Na realidade, quanto mais facilidade técnica houver, mas é preciso lançar uma reflexão especifica sobre o estatuto da recepção”, explica Wolton ressaltando a essência do outro, dentro do processo comunicacional, que vai de encontro com à ideologia técnica que se concentra na transmissão, em vez da relação.

É importante perceber que, quanto mais performático, mais eficaz for o progresso técnico, mais é preciso lembrar que transmitir informações, com rapidez e enorme quantidade, não é comunicar. “Na ponta das redes, há homens, sociedades, culturas, línguas, civilizações. Não computadores…” afirma Wolton.

Além da ideologia técnica

Traçar um caminho que vai na contramão da ideologia técnica é perceber, como premissa, que a sociedade da informação, em que estamos inseridos, não é sinônimo de sociedade da comunicação.

“O progresso técnico permite produzir e distribuir uma grande quantidade de informações. No entanto, isso é comunicação?”, questiona Wolton.

Ao contrário do que se possa crer, o aumento da informação, chegando às dimensões “de massa” não reduz a enorme diferença entre as opiniões. Quanto mais informações, mais opiniões, imaginários e rumores em relações a elas. Em outras palavras, a informação não é instrumento de encontro, mas de ampliação das diferenças, que, em um certo momento, precisam ser negociadas pela comunicação verdadeira.

A evolução da relação entre informação e comunicação

Ideologia técnicaSegundo Wolton, podemos distinguir três etapas nas relações entre informação e comunicação:

  • A primeira é aquela em que surge a “informação nova”, ligada ao acontecimento e à democracia, devendo ser pública, pois diz respeito a todo mundo. Era a informação normativa, porque instrumento de partilha “democrática”, mesmo que, no mundo aristotélico, limita aos membros da elite;
  • Na segunda etapa, há a revolução das novas tecnologias, em que o fluxo da informação invade tudo, misturando o sentido normativo e o funcional;
  • A terceira etapa, aquela que nos encontramos, é a do surgimento das condições necessárias para resgatar e preservar a dimensão normativa da comunicação. Deixam-se a técnica e a economia para reencontrar os valores, a sociedade e, também, os conflitos. Deixa-se a fascinação suscitada pelo volume, pela velocidade e pela transmissão das informações, para encontrar a questão do sentido.

Enfrentar a ideologia da técnica é uma missão das sociedades contemporâneas, imersas em suas crises de identidade e que devem encontrar, fundamentalmente, nos valores comuns, a possibilidade de estabelecer uma comunicação verdadeira, que seja partilha das diferenças essenciais, a partir de um respeito recíproco, e instrumento capaz de negociar interesses e visões de mundo particulares.

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