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O testemunho de um papa progressista

bento

Bento XVI renunciou!

Obviamente isso não é um furo jornalístico, pois a atitude de Joseph Ratzinger estampou centenas de capas de jornais e revistas de todo o mundo.

A repercussão que essa surpreendente decisão gerou na comunidade internacional evidencia o quanto o Papa é uma figura importante no cenário mundial. Nem mesmo a eleição de Obama, considerado o homem mais poderoso do mundo, teve tanto destaque como a renúncia de Bento XVI.

Hoje, passado o susto coletivo, começam as inúmeras especulações do mundo leigo, equilibrada pelas declarações de representantes religiosos, que polarizam as duas perspectivas em torno do acontecimento.

Para o mundo religioso, veio em evidência o positivo. A humildade de Bento XVI foi vista como um ato revolucionário importante, fundamental, em uma Igreja, em certo aspecto, ainda pré-conciliar, e que ainda precisa de uma profunda humanização.

Não sou fã das posições de Arnaldo Jabor mas, na coluna da CBN, ele foi extremamente brilhante ao evidenciar essa importante humanização emersa com a renúncia do Papa. A fraqueza de um senhor, idoso, cansado, deve sim ser considerada, “pelo bem da igreja”.

O “passo” dado por Ratzinger abre precedentes importantes e é autoexplicativa. Dentro do mundo religioso existem seres humanos e não deuses, que devem ser respeitados em seus limites, psicológicos e físicos. Além disso, essa é uma bonita lição para bispos e cardeais que talvez confundam a graça do serviço que são chamados a prestar, com uma (impossível) divinização da pessoa religiosa.

Por outro lado, enquanto o nome de um “novo sucessor de Pedro” começa a ser especulado entre fiéis e curiosos, em palpites dignos de uma conversa de boteco, o universo leigo confabula os porquês da renúncia.

Fala-se abertamente dos jogos de poder dentro do Vaticano. Esta instituição milenar, desculpem os puristas, também é formada por homens, pecadores , como aqueles que fazem parte de governos, empresas, Ongs.

Por isso, se já nas muitas paróquias, congregações, movimentos existem jogos de poder, imagina no Vaticano? Sim, somos homens, pecadores, todos. A diferença, demonstrada historicamente, é que a Igreja, instituição, superou o tempo, as mudanças, intrigas e jogos de poder porque inspirada em algo que vai além dos limites e vaidades dos seres humanos.

O mundo leigo (e também muitos fiéis) exigem mudanças, revoluções, transformações, que respondam com urgências as demandas atuais da sociedade. Porém a Igreja não caminha dessa forma. Ela é conservadora, no sentido bom da palavra, pois busca preservar as doutrinas e ensinamentos fundados na sua origem. Cabe ao Magistério entender os sinais dos tempos e, aos poucos, se desenvolver, mas sem perder sua identidade.

Para mim o positivo é perceber o quanto o Papa é iluminado por algo “maior”. A renúncia de Bento XVI foi uma das reformas mais importantes de seu pontificado e mostra o quanto a Igreja precisa se purificar e superar a “hipocrisia religiosa” para reavivar uma mensagem, universal, que seja resposta para toda a humanidade. 

Consciência do preconceito com o negro

Faltam alguns minutos para o tal Dia da Consciência Negra acabar, mas não sei se ficou claro que, como o nome diz, é o dia da CONSCIÊNCIA e não o dia dos negros…

Essa diferença, aparentemente banal, diz muito do motivo e da BOA razão da data, que não se limita ao fato de termos mais um feriado nesse país.

A burguesia brasileira, essencialmente branca (pouco cabocla, mameluca ou mulata) é visivelmente ignorante a respeito de muito daquilo que está a mais de dois palmos dos seus olhos e por isso é necessário anualmente clamar uma renovada consciência.

Neste dia, como acontece na polêmica das cotas universitárias, o discurso não se limita simplesmente ao fato racial, pois todos sabemos que outras raças, como a dos imigrantes, por exemplo, também foram e ainda são exploradas e prejudicadas (bolivianos, peruanos..). Também as mulheres não têm os mesmo direitos que os homens e, aqui em São Paulo, os nordestinos são constantemente humilhados.

Não… o dia 20 de novembro não “festeja” o simples fato de alguém ser negro (ou não), mas o significado e as consequências históricas no Brasil de uma grande exploração de seres humanos. O dia das mulheres remete à luta das mulheres, mas relembra principalmente as 130 tecelãs que morreram carbonizadas em uma fábrica em Nova Iorque, por exigirem melhores condições de trabalho.

A dignidade da mulher, como a do negro, foi (e ainda é) historicamente negada e o preconceito ainda é vivíssimo na sociedade. Basta ver quantos negros se formam nas melhores universidades do país, basta contar quantos negros e mulheres são presidentes de grandes empresas ou ocupam importantes cargos políticos.

Conscientizar as pessoas ajuda a romper essas barreiras do preconceito. Hoje a dignidade da mulher parece mais reconhecida na sociedade, mas a dos negros ainda tem um longo caminho na nossa sociedade.

O preconceito no Brasil é travestido de um sarcasmo e de brincadeirinhas inconscientes, mas ele existe! Mas para enxerga-lo é fundamental que as pessoas tenham, antes de mais nada, consciência.

Guerra silenciada

Voltar para São Paulo é me deparar com uma realidade difícil de adjetivar, uma guerra silenciada.

Adjetivar a violência urbana então… nem me fale!

Acompanhando cotidianamente a cobertura da mídia de massa nas últimas semanas fica evidente a deplorável exclusão (proposital?) dos pressupostos necessários para que uma notícia seja de “comunicação social” e não simplesmente um produto comercial.

A grande imprensa tem insistido em informar a população sem explicar, sem nem mesmo situar o leitor, telespectador. Enquanto isso a violência sistemática continua. Uma guerra entre criminosos da periferia e a policia militar faz todo dia vítimas e nós ainda estamos discutindo o final de Avenida Brasil.

O problema não é curtir uma novelinha pra relaxar, em meio ao cotidiano também violento do trabalhador paulistano. O que amedronta é a falta de força de um povo sofrido, aparentemente incapaz de exigir uma informação clara, verdadeira, transformadora.

Entender a questão da criminalidade exige muito mais que bons livros, boas análises… é preciso conhecer histórias, pessoas, para se dar conta da complexidade em um contexto onde a violência de ambos os lados do conflito parece ser a única evidência clara de que é necessária uma ação pacificadora urgente.

Porém a PAZ exige a consciência do outro e nesta cidade que transforma pessoas em números, divide Centro e Periferia, é difícil o cidadão comum se lembrar de discutir sobre o assunto, buscar soluções, reflexões… A informação deveria impulsionar tudo isso, mas infelizmente não faz, porque pouco se interessa no ser humano, porque nestas condições eles vendem pouco.

Sobre filmes e publicações polêmicas

Da mesma forma que a cultura ocidental desrespeita a suas gerações precedentes, trata como lixo os idosos, os inválidos, também age com enorme descaso com os símbolos e valores religiosos, que paradoxalmente estão nas bases dessa cultura.

Não é por acaso que o mundo árabe e a cultura oriental age com uma resistência violenta contra o Ocidente. O mundo oriental ainda preserva suas raízes e tem  para com elas um enorme respeito, difícil de entender para quem não se exercita constantemente a ir de encontro com o “diferente”, mas continua produzindo e reproduzindo, de maneira ignorante, preconceitos.

Nutro uma crescente vergonha pela classe de jornalistas (ou uma parte dela) que menospreza as questões religiosas, os valores éticos, e coloca a LIBERDADE como princípio regulador de qualquer escolha editorial.

Liberdade sem respeito do outro é declaração de guerra, instrumento de divisão. A Revolução Francesa é um exemplo tão simbólico, mas constantemente banalizado, “superficializado”.

Jornalistas, cineastas, artistas não estão em um patamar superior da sociedade. Eles têm responsabilidades como todo ser humano nesta terra e suas ações têm consequências (positivas ou negativas) sérias.

Talvez a pior consequência da ofensa causada pelo descaso pelas tradições e valores religiosos, principalmente em relação ao Islamismo, é justamente permitir que líderes políticos do Oriente (tantas vezes sustentados pelos governos do Ocidente), por fazerem mau uso dos princípios e valores orientais, mas que têm sido constantemente questionados pelo próprio povo, abafem o desenvolvimento da consciência local, reacendendo o ódio ao Ocidente.

(Reflexão a respeito da polemica causada pelo filme Innocence of Muslims, que satiriza o profeta Maomé e a capa da revista Placar de outubro, que faz uso desrespeitoso da crucificação de Cristo*)

 

Entenda um pouco do porquê Innocence of Muslims é considerado ofensivo (terra.com.br): http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI6156055-EI17615,00-Entenda+por+que+o+filme+sobre+Maome+e+considerado+ofensivo.html

* A editorial do jornal porém afirma que não fez referência a Jesus Cristo e sim a crucificação como modo de punir da Antiguidade.

Comunicação: Troca cultural?

Responder a pergunta que intitula o livro de Luís Sá Martino é mergulhar na sua tese sobre o momento em que a comunicação de massa se encontra atualmente.

Para Martino, a partir da década de 90, a geração de universitários “tem dificuldade de sair da crítica ao senso comum”. Dessa forma o autor sugere um estudo da comunicação que aprenda “a encontrar referências na filosofia, sociologia, antropologia” entre outras disciplinas.

Tentando superar essas dificuldades geracionais e iniciar um estudo transdisciplinar, comecei recentemente a trilhar um percurso de estudos que busca resgatar a dimensão relacional (normativa, segundo Dominique Wolton) da comunicação, para superar o drama do “transmissionismo” que ignora o sentido ontológico de “troca” que define a “communicatio”.

A obra de Luís Sá Martino se situa dentro de duas escolas importantes do estudo da comunicação: A Escola de Frankfurt e a escola de Estudos Culturais.

Dedicando-se primeiramente aos Estudos Culturais Martino apresenta as principais características da escola e a importância que a mesma dá em identificar a comunicação de massa como prática cultural, envolvendo-se porém diretamente com as relações de poder.A escola de Estudos Culturais – que não é formalmente uma escola, mas uma corrente de estudos – tem pressupostos relacionais, buscando sobretudo revolucionar o método de investigação científica, adaptando-o a diferentes contextos e assim, abrindo-se aos diferentes receptores.

Em seguida Martino se ocupa da Escola de Frankfurt evidenciando as consequências da imagem como mercadoria e o cotidiano “espetacularizado” pela comunicação de massa. Walter Beijamin, Debord, Morin, ilustram os questionamentos do autor em relação aos aspectos levantados e dão uma visão geral do problema, propositalmente não aprofundado na obra.

O último capítulo se ocupa da crise da liberdade, onde a comunicação, dentro do cenário de manipulação, serve hegemonicamente para impor uma escolha. Ela – a comunicação – transforma-se em instrumento de dominação, não de troca, que repercute também na concepção do que é real.

Um livro interessante que introduz o leitor as problemáticas correntes da comunicação, mas que, ao meu ver, se limita a perspectiva frankfurtiana, historicamente condicionada a uma visão majoritariamente critica e pouco produtiva.

Contudo, a obra consegue evidenciar a necessidade (urgente) de construir um novo modelo de comunicação, que leve em consideração o processo comunicacional como troca, que recupere o importante papel do receptor, na sua complexidade tridimensional[1].


[1] O conceito de ser humano tridimensional emergiu da tese no Instituto Universitário Sophia que buscava entender os aspectos  fundamentais do ser humano, que o identifique universalmente e singularmente. Baseado na antropologia filosófica chegou-se  concepção de homem que se relaciona consigo mesmo (intelecto), com o outro (essencialmente diferente) e com o mundo (que permite as questões fundamentais sobre a sua existência – Deus, a morte).

 

 

 

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