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A Cidade dos Óculos Mágicos | Primeira parte

Óculos Mágicos

Diziam os avós de cem anos atrás, que na última cidade no sul do continente americano, depois da conhecida Terra do Fogo, existia um grande portal que levava à Cidade dos Óculos Mágicos, um lugar conhecido justamente pelos acessórios oculares irreverentes dos seus habitantes.

O que se sabia dessa lenda é que ali, desde pequeno, de acordo com o tamanho dos pés, cada bebê recebia um determinado óculos com lentes especiais, que determinariam as dimensões do seu mundo. Esses tais óculos eram trocados acompanhando o crescimento da criança, para adaptarem-se também ao tamanho da cabeça de seu usuário.

Um dia, não se sabe como e nem mesmo o porquê, todos os óculos mágicos da cidade desapareceram. As pessoas acordaram e quando procuraram o acessório, não o encontraram mais.

A princípio a harmonia vigente na cidade não foi afetada. Os habitantes da Cidade dos Óculos Mágicos continuaram com seus hábitos, mas a confusão começou no momento em que elas começaram a se relacionar, pois os óculos não só personificavam as mais distintas visões do mundo, mas também tinha um equalizador de visões, que permitia uma convivência saudável entre as pessoas.

Sem os óculos aumentaram-se exponencialmente os conflitos… Cada um aprendera a ver o mundo do modo no qual seus óculos o apresentava. Sem eles não era possível vislumbrar a realidade de maneira clara, única.

A harmonia da Cidade dos Óculos Mágicos estava afetada, todos esperavam um salvador, uma solução, para que o convívio entre as pessoas pudesse voltar à harmonia de então. Um grande mistério se instaurava.

O pássaro azul

pássaro azul

Era uma vez um lindo pássaro azul, que vivia em uma árvore situada nas mais altas montanhas andinas. Havia crescido rodeado de outras aves como ele, comido os mesmos vermes, vivido a mesma infância.

Porém, um dia, chegou a hora dele aprender a voar… já havia superado muitos dos seus medos, mas aquele era certamente o maior deles.

Não se conformava por ser um pássaro e mesmo assim ter calafrios quando houvia seus amigos falarem da alegria de finalmente poderem aprender o maior dos ofícios das aves. Sentia-se desengonçado, suas penas ainda estavam se desenvolvendo e ele acreditava ter as asas ainda fracas e disformes para levantar um vôo seguro.

Assim, na manhã em que sua mãe o acordou para tentar a primeira decolagem em direção ao ninho situado sobre as árvores, fez de tudo para não se levantar. O medo consumia o passarinho e ele acreditava que talvez não tivesse nascido para voar.

Levantou e como havia esperado, passou o dia tentando, mas em nenhuma das vezes que bateu suas fracas asas, conseguiu voar. Sentia-se envergonhado, sobretudo pelos seus pais. Como era possível existir um pássaro que não sabia voar?

Contudo, no final do dia, foi lavar-se no lago e começou a cantar… seu canto triste ecoava por todo lado. Porém a harmonia das notas atraía os outros animais da região. A sua canção emocionada, emocionava.

Descobria ali que seu canto era talvez o mais bonito entre os pássaros e entendia, naquele momento, que sua incapacidade de voar o havia permitido desenvolver outras qualidades. Só precisava aceitar-se, sem escrúpulos.

O pássaro azul ainda sofria pelo fato de não conseguir voar, mesmo com muito esforço, mas era justamente nesses momentos, que ele presenteava a natureza com o seu mais belo cantar.

Partilha dolorosa

Partilha dolorosa

Enquanto todos faziam festa, brincavam, dançavam, eu permanecia em silêncio.

Procurava sim estar com eles, sorrir, mas a dor me impossibilitava dar passos maiores do que poderia.Um vazio imenso, fruto das incertezas, me impulsionava para “porquês” potencialmente irrespondíveis, e assim, sustentar aquela situação parecia loucura.

Passei anos entendendo e “estagiando” entre dificuldades, tropeços e quedas. Tantas vezes havia suportado situações em que estava literalmente sozinho e também outras vivi junto com quem me abria os braços, mas no final sempre conseguia, com muito esforço, caminhar no escuro e avistar o que se detém no final de cada “túnel”.

Porém agora, questionamentos e fraquezas não me permitem dar nenhum desses passos, tomar sequer uma decisão radical. Não consigo!

Imerso nessa dor, encontro resposta somente quando estou em simbiose com as pessoas, em um mútuo viver reciprocamente, pensando nos outros, em vez de me fechar em problemas pessoais.

Nessas horas o meu amor parece finalmente verdadeiro, pois não é simplesmente assistencialismo, ação de quem “está bem” por alguém que sofre, mas um enxergar o quanto precisamos amar, pois na dor, sobretudo nas “grandes”, precisamos de baluartes que nos sustentem.

Assim, meu sorriso, meus pequenos atos, meu abraço, conquista um valor heróico, pois é coroado por essa dor, que quero dividí-la, para que eu não só consiga suportar, mas que eu permita, à cada um que me ama, ao meu lado estar.

Amor

Amor

Depois de acordar do mais confuso e triste pesadelo, ligo o rádio procurando uma verdadeira canção de amor. Procuro em todas as estações, em espanhol, inglês, italiano, português, mas nada do Amor que me disseram existir.

Corro pra TV, é hora da novela das oito, e certamente encontrarei um casal que protagonize o que procuro, mesmo que sejam crianças, de algum modo tenho que encontrar esse tal Verdadeiro Amor. As cenas passam e são jogos de interesse, traição, chantagem… nada de amor… do que me disseram ser, ao menos.

Tento assistir um dos filmes hollywoodianos que alugamos, mas novamente o enredo, os relacionamentos, são tão descartáveis quanto os copos de água, à um real, que compro no Ibirapuera.

Aquela busca, quase desacreditada, começava a me fazer mal. Olhava em torno… casais, famílias, amigos e não conseguia conceber verossimilhança entre a teoria e a prática à respeito desse Amor.

Corro então para encontrar meu Amigo, estive com Ele uma horinha, jantei na sua Casa e saí de lá me sentindo novo.

As suas palavras me ajudaram a entender que as músicas, poesias, crônicas, filmes, são todas formas de materializar um desejo pouco buscado, quase sempre sonhado.

Assim, reconquistando a esperança, entendi que Amor, esse tal Amor Verdadeiro, é extremamente dinâmico e tantas vezes doloroso, mas é na dor que ele se torna verdadeiro, pois é escolhê-Lo e não escolher-se, o segredo. É viver por Ele, pois no Amor, o que vale é amar.

Conto do confeiteiro

confeiteiro

Era uma vez um Senhor dono da maior confeitaria do mundo.

Seus bolos eram conhecidos em todas as partes da cidadezinha onde habitava. Todos faziam questão de comprá-los, às vezes sem nem mesmo se preocuparem com uma ocasião específica, o que valia era saboreá-los.

Há tempos, muitos cidadãos procuravam descobrir o segredo do Confeiteiro. Uns acreditavam que era a cobertura de chantili, outros a massa saborosa, mas ninguém entendia o que fazia seus bolos serem tão especiais.

Passaram-se muitos anos e o Confeiteiro adoeceu. Assim Ele precisava que alguém continuasse a produzir seus saborosos bolos. Pensando em que poderia substitui-lo naquela função, lembrou-se de seu neto Cristiano, cria do seu filho carpinteiro, um garoto sensível e de bom coração.

Quando sentiu que estava chegando a sua hora de partir, chamou Cristiano e contou a seguinte história:

Existia um Deus que se fez homem e que nos comparou ao fermento, ou melhor, disse que somos fermento e, por isso, envolvidos na massa é que somos quem Ele nos fez!

Quando comemos um bolo gostoso – como aqueles que eu faço – elogiamos sua beleza, perguntamos quem o fez, nos deliciamos com tudo e vamos ao encontro de quem a fez para parabenizar!
Entretanto, nunca se viu alguém perguntar sobre qual fermento foi usado! Pois é! Fermento, ninguém vê! Portanto, se continuarmos querendo que nos vejam, é possível que ainda não tenhamos compreendido quem somos!
É hora de rever a história e entender o que esse Deus nos quis dizer. Caso contrário, vamos ficar querendo ser enfeite do bolo, quando, na verdade, Ele nos quer realizando o que é essencial – a parte do fermento – e nada mais.

Depois de contar essa história o Confeiteiro se despediu do menino e se foi.

Cristiano ficou alguns minutos procurando entender aquela história, tentando encontrar correspondência com os bolos, mas entendeu que aquilo era na verdade um segredo muito maior. Aquelas palavras o fizeram entender o porquê da felicidade e da plenitude do seu avô. Ele era o fermento do bolo e com seu sorriso, seu amor, gentileza, atraia as pessoas, que usavam como desculpa a necessidade de comprar seus bolos, para estar alguns momentos com Ele, conversando, tomando um chá.

Desde de então Cristiano entendeu que mais que conquistar as pessoas com seus talentos, é mais fácil, imerso na massa e através do amor às pessoas, ser fermento.

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