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A Cidade dos Óculos Mágicos – Parte III

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Para tentar solucionar o problema duas estudantes, que se conheceram no intenso “primeiro dia de aula” do entediante curso de preparação para a injusta prova que seleciona os “mais capacitados intelectualmente” para entrar nas universidades da cidade, se encontraram para discutir estratégias.

A tão sonhada vaga para o “Mundo do conhecimento” não influenciava mundo as evidentes diferenças entre as duas moçoilas. Uma queria física a outra biblioteconomia, mostrando claramente os diferentes óculos que ambas usaram durante todas as suas particulares vidas.

Enquanto uma pensa em números e “estruturas”, fazendo valer a exatidão em que os conceitos, as formas e as equações procuram relacionar cada coisa existente no mundo, a outra, viaja no conhecimento do “mundo homem” (ou seria homem mundo?) tentando, através de palavras, da língua, desvendar todo o mistério que existe em cada história, em cada alma.

As duas passaram dias buscando o mesmo objetivo, a mesma vaga, mas agora, sem a posse dos apaziguadores Óculos Mágicos, o convívio harmonioso era um grande desafio. Porém, as garotas foram percebendo que a conquista daquele objetivo necessitava muito das riquezas que as diferenças proporcionavam e assim foram, ao poucos, uma entrando no mundo da outra.

Dessa forma, elas aprenderam a viver sem os tais Óculos Mágicos e, através da relação, do relacionamento construído juntas, construíram uma membrana em seus olhos, uma lente de contato natural, que permitia fazer daquela simples amizade, algo imortal.

Parte I: http://vartzlife.wordpress.com/2007/08/16/a-cidade-dos-oculos-magicos-parte-i/

ParteII: http://vartzlife.wordpress.com/2007/09/14/a-cidade-dos-oculos-magicos-parte-ii/

O velhinho barbudo e o Natal

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Encontrei o velho gordinho enquanto caminhava cabisbaixo pelas ruas da grande metrópole onde vivo. O silêncio atípico da cidade angustiava até os vira-latas, que uivavam naquela noite chuvosa.

Aquele senhor, todo sorridente, olhava para mim com um “quê” de curioso, talvez se perguntando sobre por que cargas d’água eu estava, naquela hora e naquele dia, andando sozinho pelas ruas.

Porém, mal sabia ele que eu não tenho ninguém. Há anos, desde que meus pais se foram, comemoro o que chamo de “o dia da família” sozinho. Recebo sempre muitos presentes dos colegas de trabalho, da vizinha de apartamento, mas é habitualmente estranho, porque me sinto vazio.

Contudo, mesmo sem saber, o velhinho se aproximou e me convidou para dar uma volta com ele. Aquela barba branca, a roupa vermelha, o barrigão, me faziam lembrar alguém conhecido que não soube identificar. Caminhamos juntos por muito tempo, em direção a uma estrela que ele não cansava de apontar e admirar.

Chegando ao lugar onde a nossa guia apontava, vimos uma mãe segurando um bebê neonato. Aquele sorriso, o lugar simples, que lembrava um estábulo, me fizera lembrar das tantas crianças que nascem no Brasil, à mercê da sociedade. Que se tornam bandidos por não terem braços que as acolham, não reconhecerem e sentirem o que é o Amor.

Porém, aquela criança, parecia diferente das que já tinha visto, tinha algo de especial nela, pois senti uma alegria deliciosa enquanto olhava para ela, quase inexplicável e não conseguia me deter em pensamentos ruins. Via espelhada nela uma família modelo, a resposta para todos os meus questionamentos a respeito do que seria uma Verdadeira Família.

Assim, mesmo sozinho fisicamente, sentindo-me talvez fracassado, infeliz, via, naquele momento, um bom motivo pra sorrir, outros tantos para cantar, dançar, festejar, pois via que podia recomeçar.

O velhinho passou o braço pelo meu ombro esquerdo, me senti reconfortado e percebi que o nascimento daquele menino e o amor daquela família me mostraram o que significa festejar aquele dia, o valor de estarmos juntos, para comemorar o que chamamos de Natal.

A menina e o velho romance

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A menina que roubava livros era muito amiga de outra, que havia encontrado um velho romance, sujo e desgastado. O livro falava de um menino que tinha um amigo invisível e era conhecido por estar sempre sorrindo.

Durante o romance, a menina ia se deliciando com as descobertas que o protagonista ia fazendo, as viagens, os sonhos realizados, relacionamentos edificados. Parecia realmente uma vida interessante.

Até que, depois de passar horas e horas lendo, foi se dando conta de que o livro nunca chegava no final. Leu que o menino havia deixado sua casa por quase dois anos, que era o único homem em uma família de seis mulheres e não gostava de cantar por um motivo que ele não sabia definir, mas que era basicamente por acanhamento pessoal.

Contudo, o livro ia sendo devorado verozmente pela garota, ela não conseguia não ler, deixá-lo de lado sequer um minuto, mas era em vão… o livro nunca chegava ao fim. A menina foi aos poucos se irritando, não entendia o porquê de tudo isso, do livro não dar respostas imediatas para o “andar da carruagem” que a história se propunha revelar.

O livro velho aos poucos foi deixando de ser interessante e estar com ele em mãos passou a ser mais um motivo de irritação do que alegria, muito pela impaciência da menina. Porém, ela não desistia, a impaciência era também teimosia, ela tinha que saber o final do livro e decidiu aos poucos se acalmar e continuar lendo, mesmo sem saber se o livro tinha ou não fim.

Vagarosamente as coisas começavam a serem reveladas…. ela ia descobrindo cada vez mais coisas sobre o protagonista… seu gosto pelas pessoas, sua irritação com o comodismo, seu amor por Deus e outras coisas que fizeram a menina voltar a gostar de ler o livro.

O livro velho continua ainda sem fim, a menina não terminou nem mesmo o primeiro capítulo, mas aos poucos vai vendo que a história se torna interessante à medida em que ela simplesmente lê, sem esperar o final do tão querido romance.

Seu jão

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Estava eu caminhando entra as ensurdecedoras boates que rodam a cidade dos arranha-céus, procurando encontrar vestígios do amigo que havia conhecido na noite anterior, quando me dei conta que seria uma empresa impossível.

Aquela noite sentado com ela, ao lado do edifício onde ela estava pousando… de conversa boa, surpresas, me apareceu o tal do seu Jão, “trêbado” de cachaça, ligeiramente bem vestido.

Pediu dinheiro, mas dissemos logo que não tínhamos. Começou a contar muitas coisas e eu, interessado nele, não por curiosidade, mas por pensar que tantas pessoas poderiam tê-lo encontrado, mas nem se deram ao luxo de olhá-lo nos olhos, puxei conversa.

Contou-nos de sua família, perguntou se ela era a minha esposa e relatou “causos” de sua vida, procurando sempre deixar claro que ele era um homem de valores, que poderia até nos matar, mas que seus princípios não permitiriam.

Seu jão sentou-se conosco, elogiava sempre ela e as vezes era difícil conter o cuspe incontrolável que só a embriaguez permite.

Ficamos lá, horas conversando com o Seu Jão, sem sequer repudiá-lo, sem sentir qualquer espécie de medo, pois o nosso Deus sempre deu preferência para os marginalizados, os excluídos, os que sofrem e estávamos lá, escutando, conversando.

Lembrar-me do seu Jão me deu uma alegria salvadora. As coisas ultimamente perderam um pouco sentido, até mesmo os relacionamentos, pois parece que a nuvem escura que cobre a minha cidade, penetra também nas almas das pessoas que encontro.

Contudo, o amor, AMOR, expresso no mais delicado desejo de viver por cada um, sem resquícios dos relacionamentos anteriores, me impulsiona a não perder tempo com as dificuldades, os meus limites e o meu medo de falir.

Somos homens novos ?

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Sabe quando a gente não encontra solução racional para problemáticas cotidianas?
Quando a gente ouve comentários que assustam por tamanha incoerência daquilo que se ouve com o que se faz?
Às vezes é um esforço desumano acreditar que as coisas têm soluções, pois cada vez mais me dou conta que, não adianta termos grandes médicos, pensadores, esportistas, ou mesmo jornalistas, se não somos Homens Novos.
O que tenho visto, especialmente entre meus colegas de faculdade ou trabalho, é uma grande tendência em analisar o mundo com perspectivas explicitamente individuais, pois, afinal de contas, “se eu não pensar em mim, quem vai pensar??” (frase sonora mais ouvida das últimas semanas) Esse episódio me fez lembra um vídeo que assisti quando era pequeno, em um encontrinho do Movimento que participo desde que nasci.

Falava de um grande fotógrafo que tinha o sonho de fotografar o céu e o inferno.

Escolhendo começar pelo que pareceria pior, o fotógrafo foi ao inferno e viu que lá não era um lugar aterrorizante como diziam, pelo contrário, tinha uma grande mesa com um banquete apetitoso. Esperando por detrás de um arbusto, viu chegando as pessoas para comer. Se assustou pelo fato de todos estarem magros, de cara brava e cansada. Não conseguia conceber tudo isso diante do banquete que se prostrava diante deles.

Contudo, as pessoas carregavam garfos gigantescos e quando começavam a comer, não conseguiam por a comida na boca, pois as dimensões do garfo (e o fato de poderem pegá-los somente na ponta) não possibilitava alcançar a boca. Ficaram horas brigando com eles mesmos e depois entre eles por não conseguirem comer.

O fotógrafo ficou assustado, saiu correndo e pegando o carro foi viajar em direção ao céu.

Chegando no céu a mesma visão… o mesmo banquete… porém, as pessoas chegavam felizes, todas bem saudáveis e ele não entendia o porquê, pois não via nenhuma diferença, até mesmo na dimensão dos garfos.

Porém, quando começaram a comer via que eles não procuravam alimentar-se sozinhos, pois assim não conseguiriam como acontecia no inferno. Em vez disso, pegavam a comida e alimentavam a pessoa ao lado, cada um pedia ao outro aquilo que desejava e lhe era dado pela pessoa ao lado.

Assim, o jornalista havia entendido que a diferença entre o céu e o inferno é justamente essa capacidade que se desenvolve de AMAR e também deixar-se ser amado (que também é amor).

Aquele vídeo deixou marcas dentro de mim e me fez entender que nenhum discurso deve passar por cima do meu esforço de viver pelas pessoas, de pensar naquilo que os outros também desejam, ir além da minha realidade e do meu próprio umbigo… Não que consiga sempre… mas é um esforço cotidiano que, ao meu ver, pode realmente mudar um pouco do mundo caótico em que vivemos.

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