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Ciclovias

Depois das faixas de ônibus, agora criminalizam as ciclovias

 Ciclovias

Faz alguns meses que vivo com minha esposa no exterior, onde as ciclovias são comuns. Logo que cheguei aqui, com grande alegria, recebemos um carro (velho, mas nosso) dos nossos familiares, o que facilitou muito os deslocamentos de longa distância.

Em São Paulo, por 28 anos, nunca tive a exigência e nem a necessidade – além, é claro, do dinheiro –  de ter um automóvel. Morando no Centro, trabalhando e estudando próximo de casa, possuir um carro seria um ônus maior que o bônus. Porém, só agora que posso usufruir dos benefícios de ter um carro, é que me dou conta da comodidade desse meio de transporte e tenho consciência da importância de dirigir em estradas seguras, sem buracos e bem sinalizadas.

A opção pela bicicleta e o bem das ciclovias

cicloviasMesmo motorizado, não abro mão da minha bicicleta. Poder pedalar pela cidade para ir ao trabalho, passear, estudar é um privilégio que não deixo de desfrutar. Ainda mais em uma cidade em que o ciclista é respeitado, valorizado e as ciclovias estão por toda parte.

Nos últimos dias, tenho lido muito a respeito da polêmica sobre a construção de ciclovias em São Paulo. Com enorme alegria tenho percebido que, finalmente, a administração pública percebeu que uma metrópole que se preze, precisa investir em outras modalidades de transporte, além do automóvel privado. É assim que acontece na maioria das capitais desenvolvidas que conheci.

Não importam os interesses – eleitoreiros ou não – que podem estar por traz de uma medida como essa. É fundamental ter a capacidade de colher o que é bom para a cidade e para a maioria dos cidadãos.

O descontentamento da classe média

Com certa tristeza, tenho visto uma parcela da tal “classe média” incomodada com o aumento do número de ciclovias em São Paulo, da mesma forma que manifestaram uma forte rejeição com as faixas de ônibus.

Sinceramente, queria convidar essas pessoas a deixarem o carro na garagem, ao menos uma vez por semana, e, pelas ciclovias, experimentarem o que significa a mobilidade urbana por meio da bicicleta. Digo isso com propriedade pois, por mais de 10 anos, pedalei pelas ruas de São Paulo, todos os dias, procurando me desvencilhar de carros e seus motoristas agressivos e desrespeitosos. Mesmo assim, encontrei o equilíbrio entre a minha segurança e o desejo de continuar pedalando e pude me deslumbrar todos os dias com as perspectivas que as pedaladas proporcionam.

Muitos dos meus amigos sempre valorizaram minha coragem e diziam querer fazer o mesmo, mas que temiam pela própria vida. As novas ciclovias provavelmente permitirão que alguns deles possam ter a opção de pedalar.

Ciclovias são uma segurança para quem tem o direito de se locomover por meio da bicicleta, da mesma forma que ruas bem asfaltadas e melhor sinalizadas são um direito de quem opta pelo automóvel.

Enfim. Querido motorista de carro, não seja ignorante e egoísta. A rua não é sua! Pense no bem que o aumento no número de ciclistas acarretará para a cidade, para o meio ambiente, para a vida dessas pessoas e, também, para você mesmo (afinal de contas podem ser menos carros nas ruas).

Como já disse outras vezes, nenhuma medida política deve ser analisada a curto prazo. Planta-se agora, para colher no futuro. Eu, sinceramente, adoraria que meus filhos pudessem ir para escola de bicicleta.

Morar juntos

Porque morar juntos só depois do casamento

Morar juntos

Morar juntos nos faz entender o verdadeiro significado do que é sermos profundamente diferentes. Homem, mulher, europeia, sul-americano, suíça, brasileiro. Eu e minha esposa somos diferentes em inúmeros aspectos e morar juntos, estando casados, ajuda muito a nos aceitarmos com serenidade.

Morar juntos: uma escolha moral ou estratégica?

Não vou ser hipócrita e dizer que decidi morar com a Flavia, somente após o casamento “formal”, por simples escolha pessoal. Vindos de famílias católicas, se tivéssemos optado pela convivência pré-matrimonial, acabaríamos gerando uma série de conflitos com os nossos pais.

Contudo, nesse período inicial de vida de casado temos descoberto que mesmo uma decisão baseada inicialmente em aspectos morais pode, muitas vezes, trazer benefícios “estratégicos”.

A segurança afetiva e a confiança recíproca

Em um mundo em que as relações estão cada vez mais fragmentadas (líquidas, como diria Zygmunt Bauman) é muito difícil conquistar uma segurança interior quando se vive uma relação amorosa. A queda de tabus comportamentais e a “Ditadura do Carpe Diem” parece nos obrigar a experimentar um pouco de tudo e de todos para que, no final, nossa escolha definitiva seja baseada em uma vasta gama de experimentações.

Morar juntosOlhando a experiência de amigos que decidiram viver dessa forma (e não os julgo por isso), eu percebo neles, não raramente, uma dificuldade quase “crônica” de se sentirem seguros em uma relação estável e, principalmente, de confiarem profundamente no seu/sua parceiro/parceira. A vida baseada em confusas experiências amorosas parece promover uma dúvida constante e uma esperança bizarra de poder encontrar sempre alguém melhor. Isso faz com que uma pessoa acabe não se entregando completamente em uma relação que, dessa forma, permanece em um estado de superficialidade perigoso, causando descontentamento, aumentando a insegurança e diminuindo a capacidade de confiar.

Já a vida à dois, vivida de maneira exclusiva e estável, talvez tenha menos “extremos sentimentais”, mas promove uma serenidade interior fantástica. A estabilidade da vida de casal ajuda a descobrir nossa capacidade de amar, perdoar, recomeçar e entender, profundamente, o potencial infinito que existe no Amor. Claro que, também neste caso, é necessário entender que a Dor é uma característica importante, que precisa ser acolhida como uma possibilidade de crescimento da vida à dois, e não um impedimento.

Porque morar juntos só depois de casar?

É difícil explicar racionalmente o que levou concretamente eu e a minha esposa a esperar o casamento para viver sob o mesmo teto. Na verdade, o que quero enfatizar aqui são as descobertas estratégicas relacionadas à essa decisão.

Morar juntosIndependentemente do valor que alguém dá para o casamento, é perceptível que a sua “oficialização” (civil ou/e religiosa) dá uma maior seriedade à união. Acredito que isso se deva, sobretudo, ao fato de que a formalização do casamento engloba uma dimensão comunitária (amigos, familiares ou a sociedade), deixando de ser uma escolha puramente pessoal.

Morar juntos, sem um compromisso formal de “exclusividade” dificulta a construção de uma base segura de confiança, respeito e, sobretudo, fidelidade. Claro que existem pessoas que, mesmo não oficializando a união, vivem como se fossem “casadas”. E outras que não conviveram antes do casamento e que, quando se casaram, acabaram se separando. Nem tudo é branco ou preto.

Porém, no nosso caso, o período pré casamento foi importante para desenvolvermos aspectos mais interiores da nossa relação, como a confiança ligada não a união física, mas a escolha interior profunda de viver com o outro, “na alegria e na tristeza” e para sempre. Estando agora casados, entendemos que aquelas escolhas nos ajudam, agora, a descobrir que o Amor “pra toda vida” é muito mais ligado ao cultivo da confiança recíproca, do que da atração física. Sem a segurança interior e a confiança no amor incondicional pelo outro e do amor do outro por nós é impossível viver estavelmente com outra pessoa. Uma hora ou outra, as diferenças vêm à tona. Nesse momento, uma boa estratégia pesa muito.

Ensino técnico

Ensino técnico: porque é importante valorizá-lo?

Ensino técnico

Todas as vezes que encontro um amigo de outra nacionalidade aqui em Genebra e começamos a conversar sobre a situação socioeconômica e sociopolítica do Brasil, vejo seus olhos arregalarem. Talvez eu tenha, infelizmente, nutrido um certo pessimismo em relação a situação atual do meu país, mesmo se jamais perdi as esperanças de dias melhores.

Muito do meu descontentamento não é por conta da corrupção, da burocracia, da falta de infraestrutura, nada disso. Minha maior preocupação em relação ao Brasil se resume em um aspecto fundamental: a falta de investimento massivo e estratégico em Educação.

Conversando com um amigo francês, que vive há um ano em Seul, capital da Coréia do Sul, fiquei impressionado em ver o quanto a Educação tem um impacto positivo dentro de uma sociedade. Por exemplo: uma sociedade mais educada não só permite avanços socioeconômicos relevantes, mas difunde valores comuns, como o respeito, diminuindo as tensões sociais e os índices de violência. Foram esses alguns dos frutos colhidos pela sociedade coreana.

Qual modelo educação queremos?

Estamos às vésperas de mais uma eleição. Nesse momento, em especial, é fundamental nos questionarmos quais projetos queremos traçar para o futuro do Brasil. A Educação deveria ser uma das principais pautas.

Ensino técnicoÉ um fato. Nos últimos 20 anos, houve um sucateamento absurdo do ensino no país. Quando fiz o “primário” (Ensino Fundamental) em escola pública, ela ainda tinha padrões mínimos de qualidade, que agora não existem mais (ou existem, minimamente, graças ao heroísmo de alguns educadores).

Estando aqui na Europa, sobretudo em um Estado de bem estar social como a Suíça, percebo a força e a importância do ensino de base e do ensino técnico no país. Aqui, a Educação é pública, exigente, completa e, acima de tudo, dá aos jovens diferentes possibilidades, sem condicionar seu futuro à necessidade de um diploma universitário.

Recentemente, eu li um artigo comparando o desemprego dos jovens europeus, com os modelos de ensino adotados pelos seus países. Países em que o emprego é mais vinculado ao diploma universitário, como Espanha e Portugal, têm maiores índices de desemprego que a Alemanha e a Áustria, dois países que – como a Suíça – promovem o ensino técnico. Claro que conjuntura é muito mais complexa, porém, o artigo mostra com clareza que, em qualquer economia, é perigoso vincular o futuro empregatício dos jovens (e, consequentemente, o seu bem estar socioeconômico) ao diploma universitário.

Ensino técnico + Ensino universitário

Existem profissões mais voltadas ao desenvolvimento teórico e a inovação, baseada no pensamento. Contudo, existem outros ofícios baseados na prática, na experiência, na técnica.

Ensino técnicoPor exemplo: Minha mãe é professora no ensino público. Fez magistério e só teve um diploma universitário no final da sua carreira (porque o governo obrigou). A competência e a dedicação dela é inquestionável, mesmo quase septuagenária. Sempre fico admirado com a sua capacidade de inovar, de criar formas novas de passar, na prática, o conhecimento e, acima de tudo, motivar seus alunos à aprenderem.

Ela é pedagoga? Não. É professora. Pedagogos são mais teóricos. Eles saem das universidades com o objetivo de repensar modelos de ensino e auxiliar os professores na melhoria dos resultados, tendo uma visão geral do universo educacional. Contudo, eles são “ignorantes” no que diz respeito ao ensino didático.

Não estou dizendo que o professor só necessita de um aprendizado técnico e o pedagogo, exclusivamente teórico. O professor precisa sim conhecer um pouco das escolas de pensamento e o pedagogo deve estagiar em escolas, para conhecer de perto a complexa realidade do ensino. Mas, é a mesma relação entre o médico e o enfermeiro. Enquanto o primeiro tem uma extensa formação voltada para o conhecimento teórico, especializado, o segundo é mais técnico e necessita desenvolver outras capacidades humanas, devido o contato mais constante com os pacientes. As duas formações são complementares.

Não tenho nenhum temor de afirmar que a universidade não deve ser o único espaço de aprendizado para um futuro profissional. Cansei de ver colegas do curso de jornalismo que queriam escrever artigos, fazer vídeos, fotos e passar quatro anos sentados ouvindo as críticas centrípetas da Escola de Frankfurt era maçante para a maioria deles. Acho que o jornalismo é mais um exemplo de profissão que poderia basear-se na prática. Talvez uma “pós graduação” seria o mais sensato, pois é um ofício que exige a reflexão teórica sobre as suas dinâmicas. Mas não de quatro anos.

A importância estratégica de valorizar o ensino técnico é um passo importante para o Brasil atual. Investir na qualidade do ensino de base e do ensino técnico pode nos abrir possibilidades de um verdadeiro futuro promissor. Bem qualificados, na prática, os jovens podem se tornar uma mão de obra mais relevante, melhorando a sua qualidade de vida e, também, os resultados econômicos do país.

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Eduardo Campos e o ardor futebolístico das eleições

Eduardo Campos

Não conhecia Eduardo Campos. Nem o ser humano, muito menos o político. Sei que as opiniões são divergentes a respeito do legado que ele deixou como homem público, claro, porque como ser humano certamente os frutos são mais evidentes.

Acompanhando tudo à distância, devo dizer que não me entusiasma a emotividade criada após a triste tragédia que tirou da disputa, o terceiro candidato nas pesquisas de intenção de voto. Os motivos, acredito, são simples.

A primeira decepção foi em relação a banalização da vida perdida. Redes sociais serviram de palco para manifestações tolas, algumas vezes desumanas, em que a política, novamente, passou a ser discutida com ardor futebolístico, enquanto uma família perdia seu pai, seu marido. Antes de tudo, o ser humano. Por favor!

Outro aspecto que me entristeceu foram as acusações grosseiras, conspiratórias, sobre as explicações ligadas ao acidente aéreo envolvendo Eduardo Campos. Não que ele não possa ter sido planejado, mas cabe à polícia apurar e não aos blogueiros especularem, criando situações que nada acrescentam ao cenário eleitoral que se aproxima.

Eduardo CamposPor fim, a ilusão dos eleitores. Por melhor que tenha sido como político, por mais competente, Eduardo Campos não era o salvador da pátria. Como foram Lula, Dilma e tantos outros, ele era, sobretudo, uma promessa. Campos representava uma força política que diminuía a ingrata polarização PT-PSDB. Uma terceira possibilidade. Ponto.

Contudo, creio que as mudanças significativas que almejamos não está na escolha de fulano ou ciclano, mas na sua capacidade de dialogar, de enfrentar questões difíceis, governando para todos e não só para um determinado grupo de interesse. Dito isso, sim, talvez, entre os candidatos, podemos observar um mais capaz, outro menos, mas, depois, o foco deve estar nos projetos apresentados e nas estratégias traçada para colocá-los em prática.

O que refletir no pós Eduardo Campos

Infelizmente, pela segunda vez seguida, não vou poder participar diretamente da escolha dos próximos governantes do meu país e estado. Porém, tenho procurado participar indiretamente, lendo, propondo debates e refletindo sobre o que eu quero para o Brasil. Como podemos caminhar, juntos, em direção ao bem comum.

Eduardo CamposExistem muitos caminhos. Modelos ideológicos de Direita, de Esquerda e, claro, de Centro. Existem pessoas moralmente engajadas, outras preocupadas na manutenção do próprio poder. Para votar bem é fundamental informar-se (de preferência variar as fontes de informação, mas preocupando-se com a credibilidade das mesmas).

Eu, particularmente, tenho vivido um período de descontentamento, não só em relação aos projetos políticos (ou a ausência deles), mas com a sociedade brasileira como um todo. Sinto que continuamos vivendo os períodos eleitorais com o tal ardor futebolístico, em que a emoção vale mais que a razão, as ideias, e o outro, a oposição, não tem nada a acrescentar ao “meu” ponto de vista. Assim, caminhamos, dialeticamente, mais preocupados em sermos a antítese do “legado do outro”, que em chegarmos a uma síntese comum.

Sem ouvir as opiniões contrárias, sem procurar colher o “bom” de cada argumento, sem saber negociar (que é, muitas vezes, ceder), não será possível construir um país que, também politicamente, espelhe a nossa fantástica diversidade cultural. É nessa dinâmica, difícil e desafiadora, onde precisamos depositar nossas energias e não simplesmente usando argumentos destrutivos.

Quando aceitarmos esse desafio, aí sim poderemos sentar juntos, situação e oposição, jovens, adultos e idosos, homens e mulheres, para iniciar as reformas necessárias, que irão determinar o futuro do nosso Brasil.

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Eleições

Voto obrigatório: serve um instrumento se não se sabe usá-lo?

Voto obrigatório

Nunca achei que a obrigatoriedade do voto pudesse, de alguma maneira, dar legitimidade a uma democracia. Ter em mãos um importante instrumento da vida democrática, mas não saber usá-lo para o próprio bem (e para o bem comum), é como tomar remédio “tarja preta” sem prescrição médica. Nos dois casos os danos podem ser irreversíveis.

No advento de mais uma eleição e na evidente necessidade de uma reforma política, tenho pensado no valor que o voto obrigatório tem para a democracia brasileira. Na nação em que eu, agora, vivo, o Estado não obriga seus cidadãos a votarem. O problema da abstenção existe, mas isso não afeta o bem estar geral e nem diminui a qualidade da democracia do país.

Quando passou a ser obrigado votar?

Voto obrigatórioSegundo o excelente estudo feito pela Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina, Luzia Helena Herrmann de Oliveira, “O voto obrigatório foi implantado no Brasil com o Código Eleitoral de 1932 e transformado em norma constitucional a partir de 1934. Regulamentado em um período de transformações institucionais que objetivavam dar credibilidade ao processo eleitoral, ele foi justificado como uma necessidade para garantir a presença dos eleitores nas eleições.

No período em que o voto foi determinado obrigatório, explica Luzia de Oliveira, o eleitorado “restringia-se a cerca de 10% da população adulta, o que significava um número muito reduzido (Soares, 1973). Contudo, com as transformações da sociedade brasileira e a concessão dos direitos políticos aos maiores de 16 anos e aos analfabetos, esse percentual cresceu expressivamente”. Nas eleições de 1998, por exemplo, tivemos a participação de 67% da população brasileira (TSE, 1998a; IBGE, 1998a).

Não basta poder votar

Hoje, como pudemos observar, o percentual de eleitores cresceu bastante. Dessa forma, acredito que se deva privilegiar não mais a quantidade de eleitores, mas a qualidade da participação. Não sou um especialista em política eleitoral e não quero fazer um tratado sobre o assunto, mas tendo a pensar que o voto, sem uma educação política, é um instrumento ineficaz, com valor exclusivamente simbólico.304561_333063526785406_586973567_n

Votar é a ponta do iceberg da participação política e não deve se limitar a escolha de representantes, mas englobar outros aspectos políticos, como a aprovação/rejeição direta de leis, por exemplo. Creio que o cidadão eleitor, ao enxergar a ressonância direta de suas escolhas nas decisões políticas, irá viver a democracia com mais constância. Cabe também ao governo estimular a participação política, criando mecanismos de informação e formação para que seus cidadãos, desde muito cedo, descubram as possibilidades de protagonismo, no interior do espaço político onde vivem.

A defesa do voto obrigatório

Muitos daqueles que defendem o voto obrigatório afirmam que não existe qualquer comprovação do argumento de que o voto obrigatório prejudica a qualidade da democracia. É verdade. Não é o voto em si que prejudica a nossa democracia, mas a ilusão de que a possibilidade de votar qualifica positivamente um ambiente democrático.

No Brasil, na prática, o eleitor pode justificar seu voto em qualquer seção eleitoral do país e se não fizer, recebe uma multa irrisória de R$ 3,50. Além disso, o eleitor pode escolher anular seu voto nas modernas urnas de nosso sistema.

“Nas últimas três eleições presidenciais, tivemos o comparecimento de quase 75% dos eleitores, uma marca invejável para qualquer democracia do planeta. A obrigatoriedade do voto também faz da eleição um momento especial de informação do eleitorado. De dois em dois anos, somos levados a nos atualizar acerca dos assuntos que dizem respeito a nossa vida coletiva e decidir por pessoas, ideias e projetos, em detrimento de outras pessoas, ideias e projetos. Em países onde o voto não é obrigatório, como nos Estados Unidos, esse processo é mais diluído, e boa parte dos cidadãos passa incólume pelo processo eleitoral. Não no Brasil. Nossas eleições são um evento cívico vivido por quase todos nós” explicam os João Feres Júnior, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Fábio Kerche, pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa.

Contudo, da mesma forma que o comparecimento quantitativo não enriquece o contexto participativo em uma democracia, viver o período das eleições com a mesma emotividade que existe no contexto futebolístico, por exemplo, é extremamente pouco produtivo. Quanto mais nos aproximamos das eleições, mais vejo, sobretudo nas redes sociais, a reprodução indiscriminada de acusações e críticas pouco construtivas direcionadas a um ou outro candidato.

Com a obrigatoriedade do voto, o sistema eleitoral brasileiro promove uma justificativa falaciosa do que deveria ser a participação política. É fundamental informar-se e educar-se para entender que a democracia é um sistema vivo, dinâmico, de negociação de interesses, na diversidade e, principalmente, no respeito ao outro. Poder influenciar diretamente, não somente votando os representantes políticos, mas interferindo nas decisões ligadas ao município aonde se vive, é um instrumento que, acredito, valeria à pena ser experimentado.

Luzia Oliveira afirma que, “na Venezuela, análises realizadas anteriormente à reforma de 1993, indicavam a possibilidade de uma significativa queda na participação política, o que foi confirmado pelos fatos. Na Holanda, Irwin (1974) também observou mudanças nas atitudes dos eleitores após a implantação do voto facultativo em 1971”.

Mais participação é certamente garantia de uma democracia legítima e rica, mas não acredito que a mesma, delimitada há alguns cliques na urna eletrônica, pode ser considerada real e construtivas.

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[i] OLIVEIRA, Luzia Helena Herrmann de. Voto obrigatório e eqüidade um estudo de caso. São Paulo Perspec. [online]. 1999, vol.13, n.4 [cited  2014-08-11], pp. 144-152 . Available from: . ISSN 0102-8839.  http://dx.doi.org/10.1590/S0102-88391999000400016.

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