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O crime europeu contra a humanidade

Tenho assistido com impaciência e tristeza a omissão escandalosa das instituições internacionais em relação ao fluxo crescente de imigrantes que procuram desesperadamente abrigo no Velho Continente. O número total de mortos é ignorado pois, infelizmente, algumas vidas valem menos que outras.

Contudo, o que tenho lido nos jornais pelo mundo afora é o que chamo de eloquência sofista. Os discursos são bonitos, as fotos são polêmicas, mas a verdade nunca é relevada. Vale o jogo dialético de quem argumenta melhor pela defesa dos próprios interesses.

Na minha percepção, o que estamos vendo nesse momento histórico é consequência da exploração, da hipocrisia e da falta de humanidade das grandes potências do Norte. Condena-se, por exemplo, o Estado Islâmico, mas não há um debate claro e transparente sobre a venda de armas ou a compra de petróleo que sustentam as ações do grupo extremista. Outro exemplo invisível nas páginas dos jornais é a constante manipulação de empresas e governos do Ocidente que, para usufruir dos recursos naturais alheios, fomentam diariamente conflitos internos nos países africanos, expulsando milhares de cidadãos de suas casas.

Tenho a consciência de que o que eu estou dizendo não é nada de novo. Não tenho essa pretensão. Entretanto, acredito que é hora de não só lamentar o drama humano, mas nos forcarmos em debater as verdadeiras causas desse crime europeu contra a humanidade.

o crime europeu contra a humanidadeHoje, eu li a curiosa declaração de uma intelectual brasileira dizendo que o drama da Europa é um drama mundial e que o Brasil deveria ajudar. Ok. Pensando nos seres humanos, no problema imediato das vidas que estão em perigo, eu concordo que os outros países do mundo também são convidados a manifestar a sua solidariedade. Por outro lado, sou veemente contra qualquer tentativa de mundialização de uma responsabilidade que deve ser assumida pelas Grandes Potências. Elas se esbaldam no lucro da exploração, mas não têm peito para enfrentar as consequências dela.

Todos aprendemos nos bancos da escola, existe uma lei natural onde « para toda interação, na forma de força, que um corpo A aplica sobre um corpo B, dele A irá receber uma força de mesma direção, intensidade e sentido oposto. »

Enfim, insisto que o debate não pode estar somente voltado para a acolhida ou o fechamento das fronteiras para quem precisa, mas deve buscar seriamente um consenso e um comprometimento político na busca pelo o equilíbrio real (e legal) entre interesses econômicos e direitos humanos, intervenção ou respeito à soberania nacional, sem jamais esquecer que o ser humano, no Norte ou no Sul, tem um valor incomensurável.

refugiados

Refugiados e a questão da acolhida

Pela primeira vez no século XXI, o número de pessoas forçadas a deixarem suas terras para sobreviver se igualou ao período pós Segunda Guerra Mundial. O Pew Research Center apresentou um dado extremamente assustador: atualmente, um em cada 122 cidadãos do mundo foi expulso de sua terra. Ontem, dia 20 de junho, foi o Dia Mundial dos Refugiados. Mas o que isso significa para a maioria das pessoas do planeta?

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Imigrantes econômicos e refugiados


refugiadosEu sempre fiquei incomodado com o uso do conhecimento como instrumento de poder e opressão. Infelizmente, é esse o mundo em que a população mundial vive. Não importa a teoria, se você consegue provar com instrumentos lógicos que o seu argumento faz mais sentido, a Verdade lhe pertence. Contudo, muitas vezes as soluções passam por comportamentos humanos particulares e, de certa forma, impossíveis de quantificar. A manipulação dos conceitos relacionados aos imigrantes econômicos e refugiados, seguida da falta de uma solução “racional” eficaz se encaixa perfeitamente como exemplo.

Na prática, imigrantes econômicos e refugiados viajam frequentemente da mesma forma. Porém, enquanto os primeiros optam por deixar seu país para melhorar as perspectivas econômicas de si e suas famílias, os refugiados têm de se deslocar para salvar suas vidas ou preservar sua liberdade. Os imigrantes econômicos, se não estão legalizados, não têm o direito a permanecer em outro país, podendo muitas vezes serem extraditados (expulsos). Já os refugiados estão sob proteção de leis e convenções internacionais, além de contarem com o apoio da ACNUR (Agência da ONU para refugiados) com comida, abrigo e segurança. Dessa forma, dá para entender porque é a mídia europeia, quando relata os naufrágios no Mediterrâneo, quase sempre toma o cuidado de não usar o termo “refugiado”, pois isso garantiria a esses migrantes tanto o direito de acolhida como de ajuda humanitária.

O conceito de refugiado

refugiadosO conceito de refugiado, mesmo se mais antigo, tornou-se lei internacional – como os europeus costumam dizer – no final da Segunda Guerra Mundial, em julho de 1951, com a Convenção Relacionada ao Status do Refugiado. Pensada e promovida no contexto europeu, a Convenção tinha como base proteger a população do continente de uma possível perseguição pelo próprio governo do país, por razões de raça, religião, nacionalidade, participação de um grupo particular ou de opinião política. O terror da perseguição nazista é uma justificativa suficientemente para a necessidade da Convenção.

Entretanto, com o passar do tempo o termo tem sido remodelado, com o acréscimo de novas dinâmicas, novos contextos, mas a lógica parece continuar a mesma: leis feitas por intelectuais europeus, para defender os modelos, princípios e o bem-estar europeu, que todos chamamos internacionais.

Claro que é importante valorizar a base do direito internacional desenvolvida no Velho Continente, mas como enfrentar uma questão global com o uso de instrumentos tão limitados culturalmente, com atores políticos tão tendenciosos e interesses particulares maiores do que os comunitários?

Questão da acolhida

Quando os inúmeros navios de europeus desembarcaram na América do Sul durante as Guerras Mundiais, cheios de cidadãos fugindo de um conflito armado, a grande maioria foi acolhida, mesmo sem uma proteção legal. Estima-se que entre julho de 1947 e dezembro de 1951 a América do Sul recebeu 96.118 refugiados e através da mediação da Organização Internacional para os Refugiados, o Brasil recebeu nesse período 28.848 pessoas[1]. Aqueles refugiados se tornaram cidadãos, foram integrados à sociedade, conseguiram trabalho mesmo em países que talvez não tinham condições econômicas para acolher essa quantidade de pessoas.

Historicamente, tanto o continente africano, quanto a América Latina enfrentam a questão dos refugiados sem excluir uma da dimensão humana que, muitas vezes, pode ser a mais eficiente: a acolhida. Sem a disposição coletiva de acolher quem precisa e, sobretudo, sem assumir pessoal e coletivamente a responsabilidade diante desse drama global, partilhando experiências, recursos e boas práticas, estaremos contribuindo para um dos fenômenos sociais com consequências futuras ainda mais dramáticas.

[1] Statistisches Jahrbuch für die Bundesrepublik Deutschland 1960, p. 75.
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The Mediterranean Sea: the biggest cemetery for refugees

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In the last days, Europe witnessed one of the worst hecatombs in the Mediterranean Sea. Thousands of refugees were swallowed by the waters of what is becoming the biggest cemetery for refugees nowadays. In front of this terrible situation, I’m trying to understand why international organizations, leaded by the world’s economic powers, insist in choosing omission.

Human rights is an important concept, but sometimes it seems to me that it was created only to manage the struggle for power between the richest countries. After the World Wars many rules and laws were created to strongly protect people from the Global North, but when some kind of violence happens below the Equator, these rules are applied differently.

The main question in the Mediterranean tragedy is simple: who will be held accountable for these lost lives? As my wife – an expert in International Relations – recalled, the current situation in Libya is directly related to the irresponsible interferences by “the Democracy’s Brigades”. After having bombed that dictatorial country, the “saviours” left and abandoned the people in the chaos. The massive sea crossing phenomenon is one of the consequences of this process.

mediterraneanCertainly, it is too simple blaming the richest countries. They do not have fault in each war in poor countries. But they have to admit a huge historical responsibility related to Africa and Middle East. Recently, I had the opportunity to visit Ivory Coast and I saw how France is still taking profit from that country’s resources. The colonisation is not finished. The European enrichment continues to be a result, at least partly, of the exploitation of African people.

Even though politicians try to justify the absence of real actions, which could have saved many lives, this time there is a widespread feeling of guilt in the European society. Nowadays refugees are more visible everywhere in the Global North. In addition, everybody knows that arriving in Europe does not mean having a good life anymore. For them, however, it is another chance to survive. Nevertheless, xenophobic parties are constantly growing in Europe. What does it mean to me? Even if the European citizens agree to save the life of refugees, they do not want to share their wellness with them.

Finally, both European leaders and people have to understand that the refugee is a consequence, not the cause, of a more complex problem. Trying to survive, people from Africa, Asia or Latin America will continue to arrive, because their lands have never really been theirs.

Revised by Flavia Ganarin
persecuted christians

Easter in memory of persecuted Christians

persecuted christians

I grew up learning different ways how to fortify my faith. Especially on Good Friday, when Christians are invited to kiss the cross of Jesus, I used to experience the beauty behind the sacrifice of the Son of God. However, this year, I was thinking about the increasing number of persecuted Christians in the Middle East who will not be allowed to do any kind of worship.

In the last six weeks I was in the United Kingdom to improve my English skills. I attended an intensive English course with people from several countries and cultures. The enriching period in the UK was my first opportunity to live with Muslims every day. The huge gap between our creeds and behaviours remembered me to never take religious issues for granted. Nevertheless, in spite of the difficulty to understand who thinks (and believes) differently, I saw again that it does not stop anyone from living with a respectful behaviour.

persecuted christiansFlying back home, I read the cover article of Newsweek’s magazine, which talks about the persecution of Christians in the Middle East. Even though it is always difficult to believe in the truth behind American reportages, this article contains some interesting elements.

Firstly, the decreasing number of Christian communities described in Syria, Iraq, Egypt and the Holy Land showed that Christians are struggling to save their faith due to the persecution. Some of them fled to safe countries but many ended up losing their lives in the middle of wars and fights for power between fundamentalist groups and governments. “Some of the oldest Christian communities in the world are disappearing in the very lands where their faith was born and first took root”, says the Center for American progress, interviewed by the author of the article.

Furthermore, the variety of interviews with local people highlights the absence of a “good side” in the conflict. In Syria, Christian communities are being hurt both by the jihadists and the army of Bashar Assad. In addition, the article doesn’t hide the fault of Western countries of this increasing phenomenon. In Iraq, for example, “the latest round of Christian persecution started with the U.S.-led invasion in the 2003 and the sectarian violence that followed”.

Even though I have never summarised Easter in simply exchanging chocolate eggs or eating something special with my relatives, this year I lived this momentous day of Christianity differently. I tried to celebrate the sacrifice of Jesus in memory of my persecuted brothers and sisters in the Middle East. I wish a better future for these communities in order to renew the victory of Love against death.

(Revised by Flavia Ganarin)
Charlie

Porque só o grito de Charlie foi ouvido?

Charlie

Um dos maiores aprendizados que o estudo do jornalismo me deu foi a consciência de que, em vez de simplesmente reproduzir sem acrescentar algo novo, é melhor esperar, refletir, para “ler os fatos” de forma mais consciente, na busca por conclusões novas.

Nas últimas duas semanas, vivi a normalidade das minhas férias no Brasil com o “Je suis Charlie” na cabeça. Diante de um acontecimento triste, que chocou o Ocidente, o que eu, cidadão brasileiro, imigrante na Suíça, poderia dizer? Essa não foi a primeira ocasião em que um cartunista do Ocidente ofendeu os fundamentalistas islâmicos, da mesma forma que não foi o primeiro atentado em resposta à “blasfêmia Ocidental”. Mas, dessa vez, o ataque terrorista promoveu uma reação forte e imediata. Porque? Porque só o grito de Charlie foi ouvido?

A Europa de Charlie não é vitima

Aqui na Suíça, como em outros países europeus, a intolerância religiosa é legislada. Enquanto os cristãos têm seus direitos de culto assegurados, a comunidade muçulmana, por exemplo, é proibida por lei de construir seus minaretes, a torre de uma mesquita onde são anunciadas as cinco chamadas diárias à oração.

CharlieObservando esse fato, é possível perceber que o princípio ocidental da liberdade não é um valor culturalmente universal. O limite da Lei prevê que valores diferentes daqueles praticados no Ocidente (mesmo os que não violam os direitos humanos), nem sempre sejam permitidos, de modo particular aqueles relacionados aos seguidores do Islã. Não é por acaso que muitos jovens, cansados de serem socialmente discriminados, acabem se associando aos grupos terroristas, como o Estado Islâmico.

Comentando o “caso Charlie” com um amigo, fiquei impressionado com a sua afirmação, clara e sincera, de que a cultura do Ocidente é realmente superior e, por isso: ou o Oriente se adapta, ou não é possível dialogar. Talvez essa afirmação sirva como resposta aos meus questionamentos iniciais sobre a reação do Ocidente em relação ao “caso Charlie” e, ao mesmo tempo, o silêncio após o atentado terrorista, quase contemporâneo, na Nigéria, que tirou a vida de 2000 pessoas. Para o Ocidente, algumas vidas valem menos.

Conclusões pessoais

A escalada da violência na Europa é também um alerta para os brasileiros que, de alguma forma (social ou econômica), se considera superior aos seus iguais. O  terrorismo é, muitas vezes, fruto de uma “cultura da intolerância”.

Liberdade, igualdade e, não esqueçamos do último, fraternidade. Ninguém nega a defesa dos dois primeiros pilares da Revolução Francesa, mas poucos sabem que é justamente a fraternidade o ponto de equilíbrio para que os valores “revolucionários” sejam universais. Sem a aceitação e o respeito incondicional do “outro”, essencialmente diferente, acabamos enfraquecemos as verdades e os valores que predicamos.

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