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Amor binacional: Experiências cotidianas de um casal binacional

O grito

O grito

Há algumas semanas atrás perdi a cabeça e gritei (gritar mesmo!) com a minha filha de dois anos. Acho que posso dizer que fui uma criança, um jovem e sou um adulto muito amado. Claro que sofri algumas vezes com a violência de uma educação disciplinadora, mas isso não justifica a minha atitude com a pequena Tainá, ainda aprendendo a lidar com os próprios sentimentos e frustrações.

Comportar-me daquela maneira mexeu comigo por dentro. Foi mais uma descarada revelação da paternidade sobre mim e os meus limites.

É muito prazeroso e confortável perceber que tudo está sob controle. Ao menos para mim. Talvez por isso a consciência de ter perdido as estribeiras tenha me abalado tanto. O meu grito de descontrole me fez entender o real valor de uma vida equilibrada, ainda mais quando os filhos são pequenos e necessitam de energia extra dos pais para superar os desafios da primeira infância.

Aquele grito ecoou de volta para mim. Revelou-me um pouco mais quem sou e me ajudou a rever algumas das minhas escolhas fundamentais.

Equilíbrio

Cresci acreditando que as relações são essencialmente  complementares. O que nos falta buscamos no outro e assim conquistamos o almejado equilíbrio que é fonte de serenidade e segurança.

Foi a partenidade que me fez perder essa concepção perigosa de procurar a paz interior na relação com o outro. Filhos precisam de pais completos, não perfeitos, mas prontos para acolhê-los sem esperar nada em troca. 

Assim é necessário construir um equilíbrio sem muletas externas, mas no exercício cotidiano de acolhida paciente de si mesmo e de quem vive conosco. E haja energia!!

Estamos na último trimeste da chegada da nossa segunda filha. O barrigão da minha esposa é já uma evidência concreta de que logo a nossa primogênita não terá mais atenção exclusiva.

Essa passagem importante e traumática tem exigido muito de nós. É a perda do equilibrio conquistado no último ano. A grande descoberta para mim foi perceber que para reavê- lo tenho que refazer a minha escolha de amar sem pretender. Acolher respeitando o tempo do outro.

Amor que basta

Amar-te, as vezes basta
a dor afasta
coração pleno.

Abraçar-te, é sempre festa
linda seresta
ardor ameno.

Haja diplomacia com o tempo!
para que me preserve os momentos,
pois não quero perder nada.

Amar-te, as vezes basta
entusiasma
amor sereno.

5 anos unidos!

É tão fácil começar um projeto. O entusiasmo inicial, o turbilhão de sentimentos, as esperanças e a pouca vivência ajudam muito a romantizar tudo, até mesmo as incompreensões e os medos. Com o casamento não é diferente. A gente tem a fase da Lua de mel, onde tudo é redimensionado pelo otimismo, pela paixão. Só que depois os desafios ficam mais complexos e somos constantemente chamados a “renovar” o nosso primeiro “Sim”.

Alguns anos atrás escrevi: “ Os “votos” de uma união são fundamentais para traçar um objetivo a ser alcançado juntos. Mas o casamento não é um projeto futuro e sim uma realidade que se vive dia após dia. Não basta casar-se “só uma vez”! É fundamental “re-casar-se” todo dia. O ponto de chegada também não se estabelece unicamente por desejos humanos, mesmo os mais bonitos. Sem um “Algo” que transcenda, é difícil acreditar na possibilidade de superar todos os obstáculos, principalmente aqueles ligados aos nossos limites humanos. Quem tem a coragem de “abandonar-se” em uma Fé (que não necessariamente precisa ser uma religião), pode descobrir um grande aliado na aventura em família.”

Hoje completamos 5 anos de casados! 5 anos! Pouco? Muito? O suficiente para dizer que a nossa família e os desafios para nos mantermos sempre unidos mudaram bastante desde então. Agora somos pais! E como sempre dizemos, as mudanças que o casamento traz não são nada se comparadas as da maternidade/paternidade. Agora sim que a nossa união é realmente colocada à prova. Só que o tempo, nesse caso, tem sido um maravilhoso aliado pois as experiências vividas juntos antes, contribuíram para a sintonia que temos hoje, mesmo dentro da montanha-russas de emoções que é ter uma filha.

5 anos e uma gratidão imensa pela vida que Deus nos deu. Pela Flavia e quem ela é. A mulher mais fantástica que já conheci na minha vida, a melhor companheira que Deus poderia me dar, minha melhor amiga.

Gratidão também pela presença e suporte de familiares e amigos. Pessoas que tem estado sempre ao nosso lado. Nas alegria e tristezas. Sucessos e fracassos. Como dissemos no dia do nosso casamento: Não existe família sem comunidade.

Pai, especial

Poder participar da geração de um novo ser foi, sem sombra de dúvidas, um dos presentes mais lindos que a vida me deu. Ser pai é, a priori, viver eternamente grato por ver frutificado o seu amor mais puro e verdadeiro.

Mas e depois? O que sobra? Fraldas sujas? Banhos? Gorfadas, babadas, xixizadas e cocozadas? Mesmo que esses sejam elementos cotidianos da paternidade real, ser pai vai muito além. Viver a paternidade é mais um convite que a vida nos faz para sermos homens melhores.

A primeira descoberta que fiz nas primeiras semanas de vida da Tainá foi que a minha grande ocupação seria tomar conta da principal cuidadora da minha filha: a mãe dela. Claro que logo que a Tainá nasceu procurei me fazer útil da melhor forma possível, com a troca de fraldas e tudo mais, mas ela precisava sobretudo da mãe, fonte de calor e de alimento. Enquanto isso a Flavia ainda estava bem fragilizada. Fisicamente cansada pela intensidade do parto, lidando com o desconforto das feridas e sobretudo a descarga hormonal que causava exaustão. Ali se apresentou a minha primeira chance de ser pai.

Aquele insight me fez descobrir que, se minha esposa está bem, feliz, descansada, a família inteira fica em paz. Dessa forma, desde o início tenho procurado exercitar a paciência, duplicar o cuidado e a atenção para que a Flavia esteja bem.

Outra importante descoberta é fruto de uma minha reflexão recente sobre a construção de vínculos com os filhos. Enquanto as mães ganham uma « ajudinha » da natureza com a gestação, a amamentação, os pais são jogados à deriva, sozinhos, nesse oceano agitado da paternidade.

Mas será mesmo que não recebemos nenhum sinal interior? Para falar a verdade, acredito que não. Talvez isso explique o porquê de vermos muito mais pais que mães abandonando seus próprios filhos. Por outro lado, vínculos que ficam para vida e sobrevivem ao tempo, como amizades de infância, casamentos, entre outros, precisam conter um elemento fundamental, que também existe na paternidade (e em outras fases da maternidade): a escolha.

Ser pai é viver diariamente a escolha de querer, do fundo do coração, construir e fortalecer os vínculos com os filhos. Não existe romantismo ou impulso interior. É escolha pura, que me faz sentir, de certa forma, especial. Troco fraldas, dou banho, faço dormir, me sentindo profundamente feliz. Não faço porque é minha obrigação, mas porque são as únicas oportunidades que tenho para, diariamente, fortalecer a relação com a minha filha.

Investir em vínculos tem tornado a minha paternidade ainda mais completa. Sinto que posso amar mais, curtir ainda mais minha família e renunciar outras coisas sem arrependimentos. Quando entro em casa deixo todo o resto do lado de fora, para poder dar o meu melhor para minha família.

Porém, pai só é pai se tem filha (o). E a minha filha é um ser maravilhoso que vou contar um pouco mais no próximo texto.

 

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