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Viajo porque necessito, volto porque quero viajar de novo | Rodrigo Delfim

Viajo porque necessito

No texto anterior, falei sobre a importância de conhecermos nossa própria cidade, procurando ir além dos “pontos oficiais”, para descobrir o mundo que começa virando a esquina da rua onde moramos. Trata-se de uma experiência riquíssima que não pode ser desperdiçada.

Agora, gostaria de dissertar sobre outra forma de vivenciarmos a beleza de sair da zona de conforto doméstica e local, para conhecermos o novo: viajar. Aproveitando a ocasião: o que é viajar para você? Momento de descontração? Hora de fazer compras? Oportunidade de ficar cara a cara com si próprio? Tempo de trocar experiências, ensinando e, sobretudo, aprendendo? Penso que viajar pode ter tudo isso junto e misturado, e é isso o que mais me atrai nesse tipo de experiência. E em vez de simplesmente parafrasear o nome do filme brasileiro “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo”, explicarei o porquê do título deste texto.

dsc01914 (1)Toda viagem, por menor e mais banal que possa parecer, carrega o potencial de ser tanto diversão como aprendizado. Desde uma simples ida ao litoral ou ao interior no fim de semana, como um intercâmbio de meses ou anos em outro país. Claro que depende muito da abertura de cada um para fazer diferente e ter possíveis novas experiências, como conhecer pessoas novas, ir a lugares nos quais nunca esteve, fazer algo diferente, etc.

Uma situação engraçada, o ato de conhecer alguém especial, um momento de “deserto” (no qual ficamos sozinhos e temos como pensar melhor neste ou naquele assunto, projeto, pendência, proposta): tudo isso é possível em uma viagem. E por conta dessa imensa gama de possibilidades existentes, vejo a viagem como algo necessário, com potencial para nos renovar e nos tornar pessoas cada vez melhores à medida que ficamos abertos ao que podemos aprender e viver nesses momentos fora de nosso ambiente habitual. Sempre que posso, viajo. E sempre que puder, viajarei.

viagem_f56ed48c-9e1f-4ed6-84c5-359603ee1734_427_274Durante essas viagens, eu pude viver situações nas quais todos os elementos descritos no parágrafo  anterior vieram juntos, abrindo uma verdadeira “caixa de pandora” na minha mente e no meu coração. A abertura dessa caixa, por maior estranhamento que possa causar, foi e continua sendo extremamente importante para mim, já que me colocou diante de mim mesmo, com meus sentimentos, frustrações, expectativas, sonhos, medos… Para não me alongar muito e poder explicar melhor esta “caixa de pandora”, voltarei a falar dela em breve.

Para finalizar, deixo bem claro que nada tenho contra aqueles que enxergam uma viagem apenas como uma hora para fazer compras e/ou ficar longe do trabalho, sem dar maior importância para outros fatores. Mas penso que certamente estes acabam não aproveitando uma série de outros benefícios e oportunidades que o ato de viajar pode propiciar.

rodrigoRodrigo Borges Delfim, formado em jornalismo pela PUC-SP em 2009, trabalha atualmente na área de Novas Mídias do portal UOL. Interessado em Mobilidade Humana, Políticas Públicas e Religião, desde outubro de 2012 mantém o blog MigraMundo para debater e abordar migrações em geral. É também participante da Legião de Maria, movimento leigo da Igreja Católica, desde 1999.

Crianças deveriam criar programas de computador ? | Mariana Assis

programas de computador

Quando eu tinha 12 anos, meus pais decidiram me inscrever em um curso de criação de programas, em uma linguagem de programação bastante utilizada na época. Eu achei o curso um pouco chato porque era feito para adultos e os professores usavam exemplos que ainda não faziam parte da minha realidade. Logo depois que concluí o curso, tentei criar um descanso de tela com várias janelinhas que fariam um movimento em perspectiva, como se elas estivessem vindo em nossa direção. Elas também iriam variar nas cores e nas posições de inicio da trajetória.

Mesmo que hoje em dia seja comum ouvirmos notícias de crianças prodigio que fizeram aplicativos para iPhone, no meu caso não foi bem assim. Eu acabei desistindo depois de uma semana. Contudo, cada vez mais, projetos em todo mundo querem propor a programação, como um instrumento fundamental para o aprendizado de crianças.

Primeiras experiências concretas

232-retratoEm 2012 a Estônia anunciou que começaria a incluir a programação nos cursos de ensino fundamental do país. Isso quer dizer que crianças, a partir de 7 anos, começariam a aprender a criar programas para computadores. Algum tempo depois, em uma pesquisa feita no Reino Unido, 93% das pessoas concordaram que as escolas do país deveriam seguir o exemplo da Estônia e incluir um curso de programação no currículo do ensino fundamental.

Estas notícias são apenas dois exemplos entre muitas iniciativas que trazem indícios que o ensino da programação para crianças parece ser uma tendência que veio para ficar. Talvez a maioria das pessoas diria, sem pestanejar, que aprender a programar com 7 anos seria ótimo para o desenvolvimento e para o futuro das crianças. Será mesmo?

Para Jon Mattingly, criador de um aplicativo para iPad que ensina crianças a criar programas de computador brincando, sim. Segundo Mattingly, ensinar programação para crianças a partir dos 6 anos é uma ótima forma de plantar sementes para o futuro.

Aprendizado que não pressione as crianças

imagem-de-uma-crianca-na-frente-de-um-pcAcredito que dar oportunidade às crianças de aprenderem, desde cedo, a pensar de forma lógica, a partir da linguagem de programação, pode ser uma grande ajuda quando elas crescerem e forem se aprofundar no conhecimento da profissão. E mesmo se eles não quiserem virar programadores, entender como os programas funcionam pode ser útil em outras áreas.

Porém, hoje a vida das crianças esta, cada vez mais, repleta de compromissos: aulas de idiomas, dança, esporte, e agora, informática. Todos estes cursos são muito úteis e podem ajudá-las no próprio desenvolvimento. Contudo, deve-se ter cautela para que não se cometa exageros. Crianças com muitas responsabilidades podem acabar ficando sem tempo para brincar e se divertir tornando-se adultos muito cedo.

Além disso, acho importante que os professores estejam preparados para ensinar as crianças a descobrir um equilíbrio entre o tempo usado no computador e fora dele, ajudando-as a se desenvolver também de forma relacional. Quem sabe, por exemplo, promovendo a colaboração entre elas na hora de criar um programa e ensinando-as a desligar o computador para aproveitar outros .

Não quero dizer que ensinar a criança a programar pode ser algo ruim que atrapalhe sua infância. Contudo é preciso ter cuidado para não pressioná-la a obter resultados ou levá-la a pensar que este é o único caminho de sucesso que ela poderá percorrer. De acordo com Mitch Resnick, pesquisador do MIT, o ensino de programação não é necessariamente um fim, mas um meio para que as crianças possam aprender e se interessar por outras coisas.  Por exemplo, quando aprendemos a ler e escrever nem todos nos tornamos grandes escritores. Mas, a capacidade de ler, interpretar e criar textos permite que nos desenvolvamos em qualquer disciplina.

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Relacionar-se de maneira sadia com a tecnologia

Como acenei nos últimos posts, é fundamental usarmos a tecnologia como meio e não como fim, procurando sempre um equilíbrio na relação entre o universo virtual e a vida off-line. Uma vantagem de ensinar as crianças desde cedo sobre os benefícios da programação, é também possibilitar uma relação sadia com o mundo virtual e o real.

Depois, eu também me pergunto: será que o curso de programação que fiz aos 12 anos, me influenciou a trabalhar na área de tecnologia? Sinceramente, não saberia dizer ao certo, mas, posso afirmar que, ao tentar criar aquele descanso de tela, me vi pesquisando informações sobre perspectiva, física, design. Enfim, a tentativa de começar a criar algo com aquela tecnologia me fez aprender outras coisas, além de uma simples linguagem de programação.

Dar a possibilidade para as crianças aprenderem a programar pode ser bom para o seu desenvolvimento e aprendizado, contudo, temos que tomar cuidado para não criar expectativas ou forçá-las a se tornarem prodígios precoces. Cada um tem o seu talento e a programação deveria servir como algo que potencializa essa descoberta, permitindo que as crianças explorem novos universos.

marianaMariana Redondo de Assis – Formada em Sistemas de Informação pela Universidade São Judas Tadeu em 2005, concluiu em 2010 a pós graduação em Engenheira de Software pela Universidade de São Paulo (USP). Atua no mercado de TI há 11 anos, passando pelas áreas de suporte, desenvolvimento, projetos e pré-vendas. Atualmente é consultora de sistemas de gerenciamento de conteúdo na Thomson Reuters, responsável pelas plataformas de conteúdo para toda América Latina.

Acessibilidade e inclusão social: preocupação real ou moda? | Karina Gonçalves

inclusão social

Rampas, calçadas rebaixadas, vagas reservadas, piso tátil, sinalizações em Braile, interpretes de Libras na televisão, nas igrejas, nas escolas, ônibus e carros adaptados… Alguns indicativos de que algo tem mudado em nossa sociedade, hoje, muito mais voltada para as questões da acessibilidade e da inclusão social. No entanto, será um movimento, ainda que articulado politicamente, de moda ou trata-se de uma real busca pelos direitos de pessoas que, até outro dia, eram quase ignoradas?

A percepção de que as pessoas com deficiência poderiam construir uma história diferente daquela da segregação em entidades especializadas ou mantidas unicamente reclusas no seio familiar, começa a ser expressa nas leis e decretos a partir dos anos 80. O ano de 1981 é declarado pela ONU “Ano Internacional da Pessoa Deficiente”, marco que tornou possível, tanto uma maior consciência da pessoa com deficiência de si mesma, como estímulo para que ela passasse a se organizar politicamente e, assim, ser notada.

acessibilidade3Hoje no Brasil existem 45,6 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência (IBGE, 2010), sendo que muitas delas passaram da condição da exclusão e isolamento total, a aquela de circular pelas ruas, frequentarem escolas regulares, batalhar por um trabalho. Além de frequentarem bares, restaurantes, museus, parques e prédios públicos como todas as outras pessoas da população.

Estamos vivendo um processo histórico, gradual e progressivo, o qual não deve, e nem pode, limitar-se às estruturas físicas que permitem o acesso, ainda que imprescindíveis. Existe a importância fundamental da dimensão humana relacional, o modo como cada um olha e se relaciona com a pessoa com deficiência, e o espaço politico onde as ações podem ser executadas com alcance amplo.

Esta dimensão humana relacional deve ser base para qualquer transformação duradoura e sólida. Trata-se de libertar-nos das amarras da rejeição e do egoísmo e construir uma mentalidade mais aberta e tolerante, mais compreensiva e fraterna. Significa ser capaz de gerar condições sociais e humanas para que todas as pessoas, independente de suas limitações e dificuldades, possam se desenvolver e encontrar seu espaço, sendo valorizadas e respeitadas exatamente como são.

cadeiranteEm relação aos aspectos políticos, existe a possibilidade da constituição dos Conselhos Municipais da Pessoa com Deficiência (exemplo aqui), espaços próprios de participação, proposições, sensibilização e deliberação de questões pertinentes a essa temática, com representantes da sociedade civil e do governo. Esses espaços podem ser determinantes para que os direitos das pessoas com deficiência sejam eficazmente garantidos e suas necessidades ouvidas e respondidas.  Faz parte de uma atitude de comprometimento verdadeiro com a população a consolidação de espaços como este, para que as ações, muitas vezes emergenciais e que somente acalmam os ânimos dos que estão levantando a voz, transformem-se em políticas de fato, com planejamento a curto, médio e longo prazo.

Enquanto esses espaços oficialmente não existem, momentos de embates e discussões, embora com razões e causas legítimas, não encontram ressonância e efeito concreto. Nesta perspectiva, muitos foram os avanços, mas os desafios ainda são inúmeros, existe um longo caminho a ser percorrido.

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Para ler outros textos sobre o tema clique aqui.

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Karina Gonçalves da Silva Sobral – Formada em Terapia Ocupacional pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) em 2007, motivada por questões existenciais e busca de respostas em como lidar com o sofrimento do outro, dos tantos outros que já tinha encontrado nas recentes mas, intensas, práticas como terapeuta ocupacional, concluiu em 2011 a “laurea magistrale” em ciências políticas no Instituto Universitário Sophia, na Itália.  Possui experiências, principalmente, no Serviço Público, na área de saúde mental,  e, atualmente, é terapeuta ocupacional com atuação na educação especial.

As horas: reflexões sobre a relevância do tempo no cotidiano das nossas vidas | Ana Elisa Bersani

As horas

No último domingo, os relógios norte-americanos perderam uma hora, ou melhor, os moradores desse país (minha mais nova morada, os Estados-Unidos) ganharam uma hora com o fim do horário de verão. Eu demorei alguns dias para acertar os meus ponteiros e, quando o fiz, me dei conta de que desde que cheguei por aqui, há um mês, tive de ajustar as horas pela terceira vez por razões diferentes. Primeiro, a mudança de fuso horário, depois, o início do verão brasileiro (o que também me fez acertar as horas para poder continuar conectada aos amigos e a família que ficaram) e, agora, quando o outono vai aos poucos perdendo as suas cores, o regresso ao horário-sem-verão.

Essa multiplicidade de horas e ajustes me fez pensar sobre o tempo: aquela invenção humana, categoria mutável, transitória e, portanto, inexoravelmente variável. O tempo nos envolve e também é um espaço que habitamos. Mas são tão diversas as formas de concebê-lo e de se apropriar dele, tão diferentes as maneiras de encarar e de lidar com os seus determinantes.

Vez ou outra me vem á memória um excerto de um clássico da antropologia, escrito por Evans-Pritchard, em que, ao descrever os modos de vida de um povo do deserto sudanês, fala sobre a ideia de tempo entre eles, invejando-a:

Embora eu tenha falado em tempo e unidades de tempo, os Nuer não possuem uma expressão equivalente ao “tempo” de nossa língua e, portanto, não podem, como nós podemos, falar do tempo como se fosse algo de concreto, que passa, pode ser perdido, pode ser economizado, e assim por diante. Não creio que eles jamais tenham a mesma sensação de lutar contra o tempo ou de terem de coordenar as atividades com uma passagem abstrata do tempo, porque seus pontos de referência são principalmente as próprias atividades, que, em geral, têm o mesmo caráter de lazer. Os acontecimentos seguem uma ordem lógica, mas não controlados por um sistema abstrato, não havendo pontos de referência autônomos aos quais as atividades devem se conformar com precisão. Os Nuer têm sorte. (Evans-Pritchard, E. Os Nuer. São Paulo: Perspectiva, 1978. p. 116)

Eu e o tempo

Eu sou um ser vagaroso, do reino dos lentos, e com problemas sérios de “timing”. Ando sempre atrasada e levo uma vida bastante distante da ideia de tempo linear, programático, esquadrinhado e eficiente. Toda essa coisa de hora pra acordar, hora pra comer, pra chegar e sair, tudo isso me cansa um bocado. No Brasil ou nos Estados Unidos, sempre foi assim. Mas, digamos que aqui os atrasos parecem menos tolerados e os esquemas menos flexíveis. Talvez por isso os meus desconfortos diante do passar das horas estejam ainda mais evidentes e incômodos.

Corro uma maratona todas as manhãs desesperada para chegar a tempo de pegar o ônibus que deveria passar às 9:20, mas, esporadicamente, passa mais cedo que o horário combinado, pois não tem a mínima intenção de contemplar os que chegam no ponto no último segundo. Já me cansei de recolher roupas encolhidas na máquina de secar, por não ter calculado bem o tempo de secagem. Estou quase me acostumando ao frio glacial do meu quarto quando chego de volta a casa no fim do dia e descubro ter me esquecido de programar o aquecedor para algumas horas antes da minha chegada. Também já virou rotina escutar aquele cordial “Next, please!” quanto me demoro apenas alguns segundos a mais na fila da cafeteria da universidade procurando os trocados na carteira.

A obsessão esquemática me levou à triste dependência de calendários, agendas, listas de atividades a serem cumpridas e lembretes por toda parte. Cada uma das mais simples ações do meu dia deve ser planejada e executada precisamente em sincronia com os outros programas, as tabelas dos ônibus, os horários do banco, o fechamento das lojas, bibliotecas e assim por diante. Quase sempre, ao fazermos isso, criamos expectativas irrealizáveis que vão inevitavelmente gerar frustrações ao fim do dia. Somos todos impelidos a nos ajustar a um esquema temporal fixo e ‘supra-subjetivo’ que transforma toda e qualquer espera ou viagem perdida num desperdício de tempo insuportável.

Não ter medo de perder tempo

present-moment-road-signVivemos com medo de perder tempo ou de ser julgados pelos nossos atrasos, mas o tempo é uma categoria arbitrária. Esse nosso jeito de encará-lo tem se alimentado da objetividade dos espíritos modernos no lidar com os homens e as coisas através de uma dureza implacável. Os segundos, minutos, horas e, depois, dias, meses e anos correm sem pausa, indiferentes à vida e à morte, às alegrias ou tristezas. Não há espaço pros impulsos irracionais, pras surpresas ou tropeços. As horas parecem querer determinar o ritmo da vida, mas sabemos que são insuficientes para abarcar a experiência.

Esse texto não quer ser justificativa para minha tendência à indisciplina. Para além da minha falta de habilidade para a pontualidade, calculabilidade e exatidão, o problema colocado me parece de ordem maior. Se ao olharmos para o relógio a única coisa que ele nos disser for o quanto devemos correr para não nos atrasar para o próximo compromisso, a nossa relação com o tempo estará inevitavelmente tomada pelo sentimento de culpa diante daquilo que não fizemos ou, ainda, submetida à angústia associada ao que devemos realizar no futuro.

Parece-me que se pudéssemos resistir a essa lógica e ver além das horas que oprimem, elas nos falariam mais da brevidade e raridade dos encontros, da beleza do instante presente que não se repete, das possibilidades abertas pelas fissuras do imprevisível ou, ainda, da potência revolucionária contida na ideia de recomeço. Estaríamos, assim, mais comprometidos com o presente. E o nosso tempo se tornaria um espaço mais habitável.

ana elisaAna Elisa Bersani – Formada em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), em 2010, é mestranda em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Com especial interesse nas áreas de Antropologia do Desenvolvimento e da Ajuda Humanitária, desenvolve pesquisa com ênfase em contextos de crise e pós-desastre. Tendo realizado pesquisa de campo no Haiti, integra, atualmente, o conjunto de Visiting Students do MIT Anthropology (Massachusetts Institute of Technology) em Boston, Estados Unidos.

Para construir relacionamentos, não bastam só dez segundos | Mariana Assis

Para construir relacionamentos

Imagine fazer parte de uma rede social na qual você compartilha fotos e vídeos para construir relacionamentos com seus amigos? Nada de novo, diria um usuário da internet. Mas e se os conteúdos compartilhados ficassem disponíveis por 10 segundos, no máximo, desaparecendo logo em seguida, sem poderem ser acessados novamente? No inicio, pode até não fazer muito sentido, mas é justamente a “quebra de paradigmas” que os criadores do aplicativo Snapchat propõem aos seus usuários.

Não à perfeição, sim à espontaneidade

Snapchat-flashy-featuresUm dos objetivos do Snapchat, de acordo com o blog do aplicativo, é disponibilizar um espaço onde o usuário pode ser honesto e espontâneo. Assim, ele se liberta do mundo perfeito criado nas redes sociais tradicionais. Os usuários têm dito que, no Snapchat, você não precisa se preocupar em tirar a foto perfeita para mandar aos amigos, pois ela não ficará por muito tempo disponível.

Pode-se talvez considerar o aplicativo/rede social uma espécie de “antídoto” para o mundo em que vivemos hoje, no qual há uma enorme ânsia de capturar e compartilhar quase todos os sentimentos, momentos e celebrações, que depois serão comentados, armazenados e ficarão disponíveis não se sabe até quando. Os perfis nas redes sociais, como o facebook, são praticamente museus de nós mesmos. Ali estão nossos interesses, o arquivo de amigos, os momentos mais especiais, as conquistas.
Contudo, olhando por outra perspectiva, a liquidez das informações promovida pelo Snapchat, não pode ser mais uma forma de nos distanciarmos do mundo real, aumentando a nossa dependência em ter de constantemente acessar o aplicativo em busca das atualizações?

A amizade deveria ser sempre espontânea

Quando nos relacionamos com amigos, a honestidade e a espontaneidade deveriam ser a base dessas relações. O que significa, então, ter mais de mil amigos nas redes sociais, sem poder ser honesto e espontâneo por lá?

Parece que, desta forma, construímos um mundo ilusório, feito de sonhos, onde, principalmente, alimentamos a ideia de estarmos rodeados por uma multidão de pessoas. Mas, como todo sonho, quando acordamos e voltamos ao mundo real, longe da perfeição daquela ilusão criada em nossa mente, nos damos conta de que, na maioria das vezes, estamos sós, não temos amigos verdadeiros.

Para Bauman, famoso filósofo contemporâneo, enquanto a vida “off-line” é movida pelos laços humanos, as redes sociais se baseiam em duas atividades: o conectar e o desconectar. É muito fácil se desfazer de um amigo que não lhe é agradável; controlar com quem, o quê e quando você vai falar. Fora das redes sociais os relacionamentos são muito mais complexos, prazerosos, satisfatórios e, ao mesmo tempo, restritivos. A partir do momento que se assume um compromisso com alguém, você, automaticamente, abre mão da liberdade individual. Ganha-se muito, mas também é necessário abdicar de algumas coisas.

Equilíbrio

As relações construídas em redes sociais podem ser vistas tanto como uma benção como maldição. Por um lado, elas nos permitem nos sentirmos mais próximos de pessoas que amamos, quando não podemos estar fisicamente juntos. Por outro, se não forem utilizadas na medida certa, nos tornam solitários, distantes da realidade.

Enfim, como em todas as dimensões da nossa vida, o desafio maior é encontrar um equilíbrio. Estarmos conectados quando nos convém, mas aproveitarmos cada segundo das relações off-line; cada momento em que temos a chance e a sorte de viver ao lado das pessoas que nos ajudam a ser quem realmente somos.

Para concluir, uma interessante reflexão do filósofo polonês,  Zygmunt Bauman, sobre a condição do indivíduo e a influência das redes sociais.

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marianaMariana Redondo de Assis – Formada em Sistemas de Informação pela Universidade São Judas Tadeu em 2005, concluiu em 2010 a pós graduação em Engenheira de Software pela Universidade de São Paulo (USP). Atua no mercado de TI há 11 anos, passando pelas áreas de suporte, desenvolvimento, projetos e pré-vendas. Atualmente é consultora de sistemas de gerenciamento de conteúdo na Thomson Reuters, responsável pelas plataformas de conteúdo para toda América Latina.

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