Faz quase cinco anos que deixei o Brasil para me aventurar, com minha família, em outro continente, outra cultura. Nesses anos como estrangeiro, a mais incrível revelação que a vida me presenteou foi o entendimento de que deixar tudo é, primeiramente, aprender a deixar-se. É estar disposto a negociar a própria existência e a bagagem acumulada pelas experiências anteriores para crescer, dilatando o próprio coração.
Quando esse desafio de “perder-se” faz parte de um percurso gradual de abertura e descobertas, parece que sentimos menos o peso daquilo que se deixa. Não é ausência de sofrimento, porém. Mas com serenidade e discernimento a gente aprende a fazer do tempo um valioso companheiro no processo de ressignificação de quem somos em um ambiente novo.
Alguns dias atrás, conversando com uma amiga sobre a dificuldade dos jovens (europeus) de tomar decisões em um contexto repleto de alternativas, percebi que a ânsia pelas respostas acaba concentrada nas faculdades intelectuais. Durante aquele bate-papo, revisitei espontaneamente a minha história e me dei conta de muito pouco daquilo que forjou minha identidade até aqui foi fundado em sínteses intelectuais. Foram as experiências, os encontros e as relações que me fizeram descobrir o propósito da minha vida, que se traduz naquilo que eu sou.
“Nossa cultura ocidental se configurou de modo em que muita gente se interessa e se preocupa mais com o ser do que o acontecer”. Essa frase do teólogo espanhol José M Castillo me fez pensar justamente na metodologia que me foi apresentada pela Fé cristã e que me impulsionou a sair de mim e ir ao encontro do outro. Dessa forma, edifiquei minha juventude no partilhar, no encontrar diferentes pessoas, de diversas culturas e com distintos ideais. E no acontecer desses encontros, fui forjando quem eu sou, amadurecendo valores fundamentais.
Por meio das relações, encontrei a direção, o calçado apropriado para percorrer os longos caminhos, cheios de desafios, decisões, frustrações, alegrias, surpresas que dão sentido à minha vida.