Nas últimas semanas, tenho acompanhado aqui da Europa a mobilização de alguns países “do Norte” com o objetivo de impedir a expansão do grupo terrorista autoproclamado Estado Islâmico. Diferentemente de outras ocasiões, desta vez existe a mundialização dos jihadistas recrutados, além de uma presença territorial centralizada. Ambos os aspectos aumentam a complexidade do fenômeno, exigindo diferentes reflexões e medidas concretas para impedir que o grupo continue crescendo.
Um aspecto em particular do Estado Islâmico me chamou a atenção: a sua ideologia fundamentalista, levada ao extremo da violência, que instrumentaliza o Islã para justificar a limpeza étnica daqueles considerados infiéis. Deixando de questionar a consistência dessa ideologia, fica muito difícil desvendar as motivações que justificam as ações do grupo terrorista.
Em vez disso, mais uma vez, o “Norte” proclamou a Guerra contra o Terror. Coibir a violência com mais violência – a história recente tem nos mostrado – não elimina de forma alguma o terrorismo. Por outro lado, é possível combater um mal como esse, sem fazer uso, ao menos inicial, da violência?
O Estado Islâmico e a violência como consequência
De forma alguma eu defenderia o terrorismo. Da mesma forma que condeno a política exploratória dos Estados “do Norte”. Contudo, acreditando no bem intrínseco a todo ser humano, considero a violência muito mais consequência do que causa.
Gabriel Galice, presidente do Instituto Internacional de pesquisas para a paz, afirmou em entrevista que, nas últimas décadas, os governos ocidentais muitas vezes fizeram escolhas e adotaram medidas que favoreceram o terrorismo. “Todos conhecemos a história de Bin Laden que foi formado e treinado pelos próprios americanos”.
Além de medidas estratégicas erradas em determinados conflitos do passado, por décadas, cidadãos de origem árabe (e também africana) têm sido vítimas da exploração sistemática, de ditadores ou colonizadores, que ignoram a miséria do povo. Enquanto é sufocada, a exploração permanece silenciosa mas, a partir do momento em que existe a possibilidade de expressão, ela pode ser muitas vezes violenta. “Pode”, porque, ao meu ver, a violência é sempre uma escolha. Gandhi e Mandela são dois exemplos de transformadores da sociedade que se organizaram pacificamente para exigir direitos e a dignidade roubada.
Questão de valores
As condições socioeconômicas nunca podem ser ignoradas quando analisamos a violência organizada. Não se deve seguir leitura momentânea do problema, mas uma reflexão histórica, que aponta uma série de aspectos que ajudam no entendimento e, possivelmente, na escolha de um caminho virtuoso que aponte para a possível solução de um conflito como esse.
A desumanização sistemática, a privação da cidadania, tanto nos aspectos materiais, como no desenvolvimento humano, pode causar uma série de traumas que dão suporte à propaganda fundamentalista. É importante sublinhar: quando se caminha nos extremos do que deveria ser uma dignidade humana admissível e sobram poucos laços pelo qual vale a pena cultivar uma “Vontade de Sentido” para a própria vida, optar pelo caminho de uma revolução pacífica exige uma grandeza que nem todos conseguem exprimir.
Pessoalmente, gostaria muito de encontrar uma leitura paralela entre a origem do Estado Islâmico e do narcotráfico no Brasil. Acredito que encontraríamos muitos paralelismos, principalmente ligados ao contexto socioeconômico escarço, a exclusão social e a falta de valores centrais, aspectos que impulsionam à adesão ao radicalismo violento e, muitas vezes, irracional.
Também ligado aos valores, está a instrumentalização religiosa, que emerge como fator comum de adesão planetária de jihadistas. Apelando para uma conversão ao “Islã” e a consequente adesão à “Guerra Santa”, jovens americanos, europeus e até chineses têm sido recrutados com a promessa de uma recompensa divina generosa. Não existem valores humanos fortes o bastante que deem sentido à vida dos jovens Ocidentais? Parece que não.
Finalmente, nos encontramos, de novo, em uma nova guerra. Uma resposta violenta, a um movimento violento, consequência de um modelo político de exploração, também esse, violento. Uma ideologia irracional, combatida por outra, igualmente irracional.
Contudo, ainda existe a possibilidade de repensar os direitos das minorias desfavorecidas, procurando construir, com elas, um futuro onde os tais “Direitos Humanos” sejam respeitados e cultivados. Essa é uma lição para a coalização anti-Jihad e também para as lideranças políticas brasileiras.