É comum encontrarmos muitos idosos em nosso cotidiano. Um dos principais fatores é o aumento da expectativa de vida do brasileiro e a crescente preocupação com hábitos mais saudáveis e cuidados preventivos desde a juventude. Nunca o envelhecer esteve tão presente na nossa sociedade. Alguns vivem a velhice com mais qualidade de vida, outros menos. Alguns com uma vontade inesgotável de continuar a viver e outros assistindo a vida da sacada. Muitos modos de encarar a tal dita terceira idade.
O saudosismo e os sofrimentos do envelhecer
Não raro nos deparamos com falas saudosas referentes a um passado glorioso cheio de vitalidade e possibilidades. Por instantes é possível perceber certo brilho no olhar de alguns idosos ao resgatarem lembranças amadas. No entanto, o olhar de tristeza que se segue pelo retorno ao presente, ao que é a realidade atual, é torturante.
Tristeza e dor pelas pessoas queridas que se foram, pelos filhos que seguiram seus rumos, pelo sentir-se inútil, incapaz e dependente. A solidão que emerge de falas como essas me inquietam. Mais do que solidão externa, é a aridez interior que impressiona, um vazio existencial ainda não preenchido.
Tais sentimentos são compreensíveis em uma fase da vida em que realmente o corpo não responde mais como outrora e a mente, em algumas situações, parece estar além da corporeidade. Deseja-se fazer tantas coisas, mas não há força e nem a disposição necessárias. Tudo parece mais difícil. Às vezes a vontade também se esvai e sobra espaço apenas para as lamentações. Pergunto-me como serei quando for velhinha, que sentimentos carregarei ?
O irradiar de uma luz resplandecente
Por outro lado, ao celebrar os 80 anos da avó do meu esposo, que passou a ser também minha, percebi que existe uma força interior capaz de irradiar luz, independente da idade e das dificuldades que a vida apresenta. É luz que acolhe e aquece, que aconselha e encoraja, que sorri e faz rir, que aconchega e nos faz ser gratos por tamanho amor, que ama simplesmente porque ama.
Para a ocasião, os filhos preparam uma grande festa. Celebrar a vida é sempre uma dádiva. A vida de nossas mães então é de uma preciosidade inenarrável. Trabalhamos muito para deixar tudo lindo e digno da festejada. Mas quem realmente fez a festa acontecer e abrilhantar foi ela mesma, D. Suzana, com alegria e vivacidade, força e luz, emocionou a todos.
O salão estava repleto por familiares, netos e bisneto, amigos e, sobretudo, por suas irmãs do coração, as senhoras do grupo da terceira idade. Grupo que despertou nela e em tantas outras pessoas um novo sentido para a vida. Novos encontros e vínculos foram construídos, amizades estabelecidas, alegria restaurada e os olhos que derramaram tantas lágrimas de dor e amarguras pelas dificuldades da vida, hoje se transformaram em lágrimas de emoção, gratidão, alegria e felicidade. Nunca vi uma senhora com tantas amigas! O caminho se faz ao caminhar e como é bom caminhar ao lado de AMIGOS que nos fazem resgatar o sentimento de pertença!
Maturidade. Talvez seja isso. Encontrar a felicidade profunda que faz acolher cada momento da própria história passada, mas que acredita que as melhores lembranças são as de poucos minutos atrás, que já vão dando espaço para as do próximo instante, que é o agora. O presente se renova a cada instante, e é preciso ter olhos para ver, coração para sentir e mente sadia para captar a beleza do “eis que faço novas todas as coisas”.
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Karina Gonçalves da Silva Sobral – Formada em Terapia Ocupacional pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) em 2007, motivada por questões existenciais e busca de respostas em como lidar com o sofrimento do outro, dos tantos outros que já tinha encontrado nas recentes mas, intensas, práticas como terapeuta ocupacional, concluiu em 2011 a “laurea magistrale” em ciências políticas no Instituto Universitário Sophia, na Itália. Possui experiências, principalmente, no Serviço Público, na área de saúde mental, e, atualmente, é terapeuta ocupacional com atuação na educação especial.