Imagine fazer parte de uma rede social na qual você compartilha fotos e vídeos para construir relacionamentos com seus amigos? Nada de novo, diria um usuário da internet. Mas e se os conteúdos compartilhados ficassem disponíveis por 10 segundos, no máximo, desaparecendo logo em seguida, sem poderem ser acessados novamente? No inicio, pode até não fazer muito sentido, mas é justamente a “quebra de paradigmas” que os criadores do aplicativo Snapchat propõem aos seus usuários.
Não à perfeição, sim à espontaneidade
Um dos objetivos do Snapchat, de acordo com o blog do aplicativo, é disponibilizar um espaço onde o usuário pode ser honesto e espontâneo. Assim, ele se liberta do mundo perfeito criado nas redes sociais tradicionais. Os usuários têm dito que, no Snapchat, você não precisa se preocupar em tirar a foto perfeita para mandar aos amigos, pois ela não ficará por muito tempo disponível.
Pode-se talvez considerar o aplicativo/rede social uma espécie de “antídoto” para o mundo em que vivemos hoje, no qual há uma enorme ânsia de capturar e compartilhar quase todos os sentimentos, momentos e celebrações, que depois serão comentados, armazenados e ficarão disponíveis não se sabe até quando. Os perfis nas redes sociais, como o facebook, são praticamente museus de nós mesmos. Ali estão nossos interesses, o arquivo de amigos, os momentos mais especiais, as conquistas.
Contudo, olhando por outra perspectiva, a liquidez das informações promovida pelo Snapchat, não pode ser mais uma forma de nos distanciarmos do mundo real, aumentando a nossa dependência em ter de constantemente acessar o aplicativo em busca das atualizações?
A amizade deveria ser sempre espontânea
Quando nos relacionamos com amigos, a honestidade e a espontaneidade deveriam ser a base dessas relações. O que significa, então, ter mais de mil amigos nas redes sociais, sem poder ser honesto e espontâneo por lá?
Parece que, desta forma, construímos um mundo ilusório, feito de sonhos, onde, principalmente, alimentamos a ideia de estarmos rodeados por uma multidão de pessoas. Mas, como todo sonho, quando acordamos e voltamos ao mundo real, longe da perfeição daquela ilusão criada em nossa mente, nos damos conta de que, na maioria das vezes, estamos sós, não temos amigos verdadeiros.
Para Bauman, famoso filósofo contemporâneo, enquanto a vida “off-line” é movida pelos laços humanos, as redes sociais se baseiam em duas atividades: o conectar e o desconectar. É muito fácil se desfazer de um amigo que não lhe é agradável; controlar com quem, o quê e quando você vai falar. Fora das redes sociais os relacionamentos são muito mais complexos, prazerosos, satisfatórios e, ao mesmo tempo, restritivos. A partir do momento que se assume um compromisso com alguém, você, automaticamente, abre mão da liberdade individual. Ganha-se muito, mas também é necessário abdicar de algumas coisas.
Equilíbrio
As relações construídas em redes sociais podem ser vistas tanto como uma benção como maldição. Por um lado, elas nos permitem nos sentirmos mais próximos de pessoas que amamos, quando não podemos estar fisicamente juntos. Por outro, se não forem utilizadas na medida certa, nos tornam solitários, distantes da realidade.
Enfim, como em todas as dimensões da nossa vida, o desafio maior é encontrar um equilíbrio. Estarmos conectados quando nos convém, mas aproveitarmos cada segundo das relações off-line; cada momento em que temos a chance e a sorte de viver ao lado das pessoas que nos ajudam a ser quem realmente somos.
Para concluir, uma interessante reflexão do filósofo polonês, Zygmunt Bauman, sobre a condição do indivíduo e a influência das redes sociais.
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Mariana Redondo de Assis – Formada em Sistemas de Informação pela Universidade São Judas Tadeu em 2005, concluiu em 2010 a pós graduação em Engenheira de Software pela Universidade de São Paulo (USP). Atua no mercado de TI há 11 anos, passando pelas áreas de suporte, desenvolvimento, projetos e pré-vendas. Atualmente é consultora de sistemas de gerenciamento de conteúdo na Thomson Reuters, responsável pelas plataformas de conteúdo para toda América Latina.
Saleti
Gostei muito do texto e fiquei muito impressionada com o video…. realmente fantastico.
Marcello Benites
Oi, Mariana!
Vc está dando uma chave de leitura bem legal para os seus textos (“Estarmos conectados quando nos convém, mas aproveitarmos cada segundo das relações off-line”, q eu percebi já em post anterior). Uma rede social cujos posts se esvaem como numa conversa presencial… Bem, será uma opção. Vejo que, comercialmente, os criadores de redes sociais na internet vão oferecendo diferenciais. Não sei se alguém previu o ocaso do Orkut assim que o facebook – e também o twitter – apareceu (exatamente nessa fase em q o snapchat está: eu soube da existência dessa rede por teu intermédio). A busca por uma rede com esse perfil pode atrair pessoas que estão preocupadas com um fenômeno apontado por Bauman, na referida entrevista, na qual ele citou outro autor que havia registrado o início da pós-modernidade num determinado dia da semana, durante um talk show. Nesse programa, uma mulher comum revelou a milhões de telespectadores algo muito marcante sobre sua vida sexual. Baumam observou que nas épocas da tradição e na modernidade a maior parte das pessoas escondiam esses fatos íntimos. Na pós-modernidade, porém, ele observa, “o que antes se dizia nos confessionários, hoje se anuncia na mídia” (as aspas não são literais, mas foi o que disse o sociólogo). A entrevista, aliás, é maravilhosa: a questão de conectar/desconectar relações é um dos pontos altos!E vc nos proporcionou mais uma excelente reflexão, Mari! Abraços!
Mariana
Marcello, muito legal o que você comenta sobre a questão da privacidade e da pós-modernidade. Há estudos que comprovam que as pessoas não tem se preocupado muito com a privacidade nas redes, fato preocupante pois acredito que muitas não tem a consciência do que pode ser feito com a quantidade de informações intimas e pessoais que elas tem publicado abertamente.
Marcello Benites
Sim, Mariana! Outro dia li um artigo de Córa Ronai, que tem uma coluna de crônicas e outra sobre tecnologia no jornal O Globo, que disse que hoje os pais devem ter uma conversa com os filhos, semelhantes àquela na qual eles explicam “como nascem os nenéns”, alertando que com uma postagem q fazemos hoje podemos estar fechando portas para nós mesmos no futuro. A princípio pensei na parte profissional. E os amigos futuros que talvez percamos por determinadas interpretações dos nossos posts?
Marcello Benites
Ah! Sugiro um mecanismo que permita que as respostas aos teus posts no escrevo logo existo apareçam também no grupo do face… Será que é possível?