«Será que as pessoas se dão conta do que é concretamente deixar tudo? Conseguem entender o que é passar o Natal fora do próprio país, longe da família? Sinceramente, acredito que as pessoas muitas vezes enxergam as situações com um romantismo cego e inconscientes de que realmente tudo tem um custo…»
Aquele comentário resumia bem o que Paulo sentia nos últimos dias que antecediam o Natal. Há alguns meses na Europa, o jovem havia deixado o seu país para começar uma nova vida no Velho Continente e, especialmente no período do Advento, sentia falta de suas raízes.
Paulo lembrava-se perfeitamente da alegria vivida na semana que antecedia o Natal. O ritmo no trabalho diminuía, há mais de um mês gozava das merecidas férias de estudo e não pensava em outra coisa senão preparar-se bem para aquele momento tão particular do ano.
Natal para Paulo sempre foi a festa da família, da sua em particular. A vida na grande metrópole tantas vezes não permitia que ele estivesse sempre com suas irmãs, seus pais, mas naquela ocasião era diferente: estavam sempre juntos, cantando, rindo e comendo muito.
No dia 24 acordava com o bater de panelas e o perfume do pernil que já assava no forno. No café da manhã um pedaço de «chocotone» aquecido no microondas e uma Sminorf Ice, seguida de uma bronca da mãe que dizia que aquilo não era hora de beber esse tipo de coisa.
Durante todo o dia não comia muito para «fazer espaço» para tão esperada ceia. Ajudava a preparar doces, comprar as bebidas, mas acima de tudo procurava estar junto de suas irmãs, seus pais. Uma grande festa.
Já no entardecer começava a «arrumação». Todos bonitos, nada de luxo, pois raramente podiam usar vestidos novos, mas isso não impedia de que cada um da família pudesse apresentar-se BEM para a grande festa de chegada do Menino.
Lá pelas 20h toda a família caminhava juntos até a igreja. Sem dúvidas o motivo central daquele dia, daquela semana, talvez de todo o ano. Festejar juntos Aquele que deu forças, proveu todas as necessidades, deu saúde, alegria, a cada um é algo que queima o coração de Paulo, sempre que procura contar como é passar o Natal com a sua família. E por isso era evidente o estupor de Clara ao ouvir aquela narração tão «apaixonada».
Clara também festejava sempre o Natal a sua família. Mas em vez das quentes terras Sul-americanas, Natal para ela significava: neve, frio e a mesma sensação de acolhida que só a vida em família permite.
Pensava que talvez, em seu continente, muitas pessoas estariam vivendo aquela festa sozinhas, conseqüência do bem-estar financeiro que muitas vezes corrompe o verdadeiro sentido do Natal. Mas em sua casa não. Que alegria era ver aquela imensa árvore de Natal, comer tantas coisas boas, ir à missa juntos e sentir aquele forte calor e alegria que a vida na sua família permitia!
Natal era sempre uma oportunidade de reencontro, ainda mais agora que ela estuda longe, vê esporadicamente seus familiares, mas esse, em particular, tinha um sabor especial. Durante todo o ano sua família viveu um duro momento de incompreensão, dor, dificuldades. Todos tiveram que suportar aquele momento vazio de sentido, cada um com as próprias forças e também com a falta delas, mas era forte a sensação de que tudo foi purificação.
Aquela festa, em particular, era um momento de agradecimento por tudo aquilo que toda a família conseguiu superar, por todo o crescimento espiritual e humano e pelo aprofundamento do nos relacionamentos que permite que também o amor fosse mais sincero, mas verdadeiro entre todos.
As duas histórias, de Paulo e Clara, se encontravam no Natal. Diferentes no desenrolar dos acontecimentos, mas parecidíssimas em essência.
Tudo isso porque, antes de tudo, aquilo que os fazia plenamente feliz era que em nenhum momento do ano haviam esquecido o festejado da noite. Não era uma festa em si, mas o ápice de uma “gestação” vivida com alegria e as dores, cada dia. Talvez por isso aquela festa tinha tanto sentido e não era uma simples troca de presentes ou uma ceia repleta de comida gostosa.
Natal, especialmente aquele ano era Encontro e Reencontro. Encontrar-se cada um consigo mesmo, com os outros e com o Deus-Menino que é quem permite que o Natal seja a possibilidade de viver as coisas simples com uma disposição renovada.