Acordo cego!
Como cegas são todas aquelas pessoas que intermitentemente passam ao meu lado,
olhando pro chão, falando ao celular.
Passo a manhã preocupado com o salário que deveria ter caído,
com a carga do vale transporte para poder voltar para casa
e não sobra tempo para me concentrar, nem mesmo nas tarefas mais banais
que deveria concluir no trabalho.
A tal da cegueira não me deixou perceber
que carregavam minha colega de departamento para o hospital,
com claros sinais de estresse,
fruto de poucas horas dormidas, para fechar o balanço do mês.
Entro na internet e caem os poucos sinais de ânimo,
como estão caindo ultimamente as bolsas de valores de todo o mundo.
O índice de pessoas felizes diminuiu cada vez mais.
Assim, vou almoçar o mesmo arroz com feijão e bife.
Um dos raros momentos de prazer diante de uma jornada praticamente sem sentido,
como esta insuportável cegueira.
Volto para a labuta tentando encontrar uma maneira de transformar a nóia em motivação,
inspirado nos muitos livros de auto-ajuda que tenho lido.
Mas é tudo em vão.
Até que levanto para pegar a folha impressa e recebo um sorriso da moça do Jurídico.
Um calor especial, um sentimento renovado…
tudo por causa de um ingênuo sorriso.
Mas, a sensação me contamina e não consigo esconder minha alegria.
Cumprimento o pessoal que está tomando café, sorrio para meus colegas de departamento
e vejo que a cegueira foi curando, a partir daquele momento.
É… se todos soubessem o poder de cura de um sorriso,
não estariam buscando orientações no GPS, conselhos via SMS.
Aí nem mesmos os ensaios, nem mesmo as avaliações mais complexas
que a vida constantemente nos obriga passar
e por fim o tédio,
seriam fortes o bastante para suportar esse antídoto
contra a mais humana e moderna cegueira:
a Indiferença.