Bebida Púrpura

Aquela publicidade me causara certa impressão pois, como qualquer Jovem.com, sedento de mudanças, me senti de certa forma provocado a experimentar tal bebida. Naquele mesmo dia, depois da cansativa e entendiante jornada de trabalho, corri para o mercado para comprar a Bebida Púrpura. Acreditei que encontraria uma fila “vaticânica”, mas me assustei em ver que o mercado estava vazio.

Dirigi-me ao setor de bebidas e encontrei rapidamente aquilo que desejara durante todo o dia. A vontade era tão grande de beber que quase abri a garrafa sem pagar. Saindo do mercado, destampei rapidamente a garrafa, daquela que seria para mim a resposta a todos os meus anseios e bebi tudo num só gole. Afastando-a da boca, senti rapidamente algo estranho.

Admito que em algum lugar, talvez em um dos livros do Gaarder, havia ouvido falar da presença desta Bebida Púrpura, porém os sintomas que eu experimentava no momento eram opostos à aqueles conhecidos até então.

Senti as mais diversas dores que acredito existirem no mundo, em cada parte do meu corpo… fome nos pés, cansaço nos fios de cabelo e tantas outras que invadiram cada singular célula do meu corpo e por alguns segundos pareciam querer me assassinar. Claro que tudo durou pouco, mas quase não consegui me manter em pé depois do que acontecera. Posterior àqueles momentos de inconsciência, quis relacionar as conseqüências de ter experimentado a Bebida Púrpura, com a publicidade que eu vira apresentada no outdoor. Não cheguei a nenhuma conclusão.

Caminhando de retorno a minha casa vi um mendigo jogado no chão, cercado de pessoas que no ponto, esperavam o ônibus que tardava a chegar. Claramente não era a primeira vez que eu presenciava tal espetáculo, mas naquele momento algo me dizia de não permanecer passivo àquela situação.
Assim decidi ir ao encontro daquele pobre e o ajudei a levantar, coisa de demasiada insignificância, mas que até o momento passava coadjuvante ao transcorrer cotidiano da minha semana. Também perguntei o nome dele e descobrindo que ele não comia a quase três dias, resolvi dar o croissant que tinha guardado para o dia posterior. Continuei o caminho de retorno e entrando no meu condomínio fui acolhido por uma careta do porteiro, que parecia expulsar-me do meu próprio condomínio. Retribuí surpreendentemente com um sorriso, verdadeiro, e isso provocou certo espanto do mesmo.
Chegando em casa uma grande confusão… enquanto meus pais brigavam por causa da triste situação econômica que estamos atravessando, minhas irmãs esbofeteavam-se paralelamente, pelo controle da televisão. Inconscientemente passei diante de todos e fui para o meu quarto, deixei a mochila e entrei na cozinha pra ver se tinha algo pra comer… Ao entrar percebi uma enorme pilha de louças sujas e quase que instantaneamente arregacei as mangas e comecei a fazer algo que nunca havia feito na minha vida: Lavar os pratos. Terminando, tomei um banho e estando cansado fui para cama dormir.
Deitei, fechei os olhos e senti uma felicidade misteriosa. Nunca havia me sentido com tal plenitude… e porque?? No mesmo instante me lembrei daquilo que o slogan publicitário havia proposto, sorri comigo mesmo, virei me bruços e dormi, esperando que a Bebida Púrpura superasse a Coca-Cola em vendas.